Variante Delta do Sars-CoV-2 obriga estabelecimentos a repensarem formação de filas

Será que novas tecnologias, costumes antigos e adesivos no chão podem tornar uma fila de espera mais simples e segura?

Visitantes esperam na fila para entrar na Catedral de Colônia, na Alemanha, com organização sinalizada por adesivos de distanciamento social colados no chão. A pandemia de covid-19 forçou atrações turísticas e aeroportos a repensar a maneira como as pessoas formam filas.

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Por Rachel Ng
Publicado 5 de ago. de 2021, 12:26 BRT

Um ano e meio após o início da pandemia de covid-19, poucos norte-americanos se preocupam quando estão em uma fila. Em aeroportos, parques temáticos, estabelecimentos às margens de rodovias e fast-foods, ocorreram apenas pequenas mudanças no modo de pensar sobre as filas.

Mas, à medida que a variante Delta se espalha pelo país e pelo mundo, assim como exigências sobre o uso de máscaras são reinstauradas, esse é o momento de aeroportos, restaurantes e outros estabelecimentos reconsiderarem a maneira convencional sobre a eficiência e a segurança das filas? Em uma época em que o comércio e os países tiveram restrições para abrir e fechar devido às medidas de isolamento, empresas, cientistas sociais e viajantes enfrentam novas políticas (e algumas questões antigas) sobre a espera em ambientes com aglomeração.

Nem todas as filas se formam da mesma maneira

Embora os humanos provavelmente tenham formado certos tipos de filas por milênios, foi o historiador escocês Thomas Carlyle o primeiro a mencionar o conceito de “fila” em sua história de 1837 sobre a Revolução Francesa. Ele mencionou clientes enfileirados do lado de fora das padarias quando Paris foi assolada pela fome. “Serão servidos por ordem de chegada”, escreveu ele.

A justiça talvez seja a razão fundamental pela qual as pessoas toleram ficar em filas, explica Donald Norman, especialista em design cognitivo e autor do artigo de pesquisa The Psychology of Waiting Lines (“A psicologia do ato de aguardar em filas”, em tradução livre). “As pessoas ficam muito irritadas quando sentem que não estão sendo tratadas igualmente e quando parece que pessoas passaram na frente delas”, diz Norman.

Dick Larson, professor do Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT, na sigla em inglês) e autoproclamado “Dr. Fila”, concorda. “A principal reclamação dos que estão em uma fila não é o tempo de atraso, é a injustiça, especialmente quando pessoas furam a fila.”

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    Em 15 de abril de 2021, visitantes utilizam o sistema de lugares virtuais na fila do parque temático Universal Studios Hollywood em Los Angeles, Califórnia. Novas tecnologias, como esta máquina para fazer check-in, ajudam companhias aéreas e parques temáticos a promover o distanciamento social e reduzir a aglomeração durante a pandemia do novo coronavírus.

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    O setor de turismo moderno ignorou a democracia das filas com uma abordagem em que as pessoas pagam para ter lugares privilegiados nas filas. Com um pouco (ou muito) investimento adicional, você pode passar à frente com um embarque de primeira classe em um avião, utilizar o TSA PreCheck (programa que permite que passageiros elegíveis utilizem a triagem expressa do aeroporto mediante cadastro na TSA, Administração para a Segurança dos Transportes dos Estados Unidos) ou comprar “ingressos sem fila” para visitar a Torre Eiffel ou museus e capelas no Vaticano. Críticos afirmam que essas práticas criam uma experiência desigual e hierarquizada; os proponentes argumentam que, para alguns turistas, tempo é dinheiro. “Onde houver demanda, haverá oferta”, observa Larson.

    Ainda assim, a percepção de justiça pode ser mais poderosa do que a realidade. Diz-se que o pioneiro de uma fila única e sinuosa foi o estabelecimento de fast-food Wendy’s, com o atendimento aos clientes realizado por ordem de chegada. E estudos mostram que as pessoas preferem uma única fila — em vez de ter que escolher entre diversas filas paralelas e sentir como se tivessem escolhido a mais lenta. 

    Por esse motivo, Larson prevê que os adesivos de distanciamento social fixados no chão adotados devido à pandemia de covid-19 continuarão a ser utilizados mesmo depois do cenário atual. “Eles garantem o senso de justiça social, por ordem de chegada, não apenas para o distanciamento, mas também para manter as pessoas na fila”, afirma.

    A maneira como as pessoas passam o tempo importa

    Os físicos há muito teorizaram que o tempo é uma construção humana. Afinal, uma espera de cinco minutos quando não há nada acontecendo parece infinitamente mais longa do que os mesmos cinco minutos dispendidos se entretendo com um jogo no celular. O tempo ocupado parece mais curto. “Quando as pessoas estão entediadas, elas ficam mal-humoradas e irritadas”, ressalta Norman. Os cardápios distribuídos aos clientes na fila, as revistas no consultório do dentista e as TVs nas áreas de espera dos aeroportos são estratégias para manter os clientes distraídos.

    Os parques de diversões foram os precursores de entretenimento em filas. Na década de 1930, o Knott's Berry Farm em Buena Park, estado da Califórnia, tornou-se um dos primeiros parques temáticos dos Estados Unidos porque milhares de pessoas faziam fila do lado de fora da barraca de frutas e do restaurante para comer o frango frito de Cordelia Knott. O marido de Cordelia, Walter (coproprietário do estabelecimento e produtor de frutas vermelhas) reuniu diversas atrações — como carroças cobertas, macacos vivos na coleira e um toco de sequoia de 800 anos “para entreter os clientes enquanto esperavam seu nome ser chamado por um alto-falante do restaurante”, conta Eric Lynxwiler, historiador da família Knott. Isso transformou o local em uma atração à beira da estrada e, eventualmente, um parque temático equipado com montanhas-russas que desafiam a gravidade.

    Os Knotts podem ter originado a fila de parques temáticos, mas a vizinha Disneylândia na cidade de Anaheim, na Califórnia, refinou a espera. “A Disney inventou todos os tipos de estratégias para tornar as filas toleráveis”, revela Norman. “Eles queriam que as pessoas ficassem no parque o dia inteiro, mas não tinham brinquedos suficientes para mantê-las ocupadas todo esse tempo.”

    Antes de embarcar em uma trilha ou outro passeio, os visitantes da Disney percorrem salas ou corredores onde aprendem sobre o cenário e a história da atração. “A aventura de Indiana Jones: O passeio do Templo do Olho Proibido” na Disneylândia tem uma fila de quase um quilômetro serpenteando por um falso templo “antigo” e mal iluminado, onde os visitantes podem decifrar pinturas crípticas nas paredes ou ouvir arqueólogos realizando escavações. “É uma maneira de tornar a fila de espera parte do entretenimento”, salienta Norman.

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        Em agosto de 2020, turistas utilizando máscaras faciais fizeram fila (com a ajuda de adesivos de distanciamento social colados no chão) para entrar no Museu do Louvre, em Paris.

        Foto de Ng

        Uma outra estratégia que alguns parques temáticos e atrações empregam é divulgar o tempo de espera estimado, que geralmente é mais longo do que o tempo de espera real. “Um dos princípios de todos os setores de serviços é gerenciar as expectativas das pessoas em um nível e oferecer resultados mais elevados do que o esperado”, explica Larson. 

        Ajuda da tecnologia

        As longas filas podem ser frustrantes e desgastantes durante viagens. Na falta de funcionários, algumas empresas e atrações empregam tecnologia para reduzir o tempo de espera. Para evitar aglomerações de visitantes, o Parque Nacional de Yosemite na Califórnia e o Parque Nacional das Montanhas Rochosas no estado do Colorado recentemente implementaram sistemas de reserva on-line com horários definidos para visitação. 

        Os parques temáticos também utilizam tecnologia. O parque temático Universal Orlando tem um aplicativo que monitora o tempo de espera e permite que os clientes reservem lugares na fila; atrações como Dollywood na cidade de Pigeon Forge, no Tennessee e Cedar Point, parque repleto de montanhas-russas no estado de Ohio, utilizam pulseiras escaneáveis que evitam filas.

        As filas das companhias aéreas também estão passando a ser digitais. Os passageiros dos voos da Southwest Airlines agora podem obter seu lugar na fila 24 horas antes do início do voo. O embarque em fila das companhias aéreas permanece, apesar da pandemia de covid-19, mas a tecnologia permite que aqueles que se antecipam (e pessoas que investem um valor adicional ou milhas) consigam embarque prioritário. Em janeiro de 2020, a companhia aérea Delta adicionou um recurso em seu aplicativo que notifica os clientes quando devem embarcar, um processo semelhante aos pagers de restaurantes que avisam os clientes quando suas mesas estão disponíveis.  

        Aeroportos em todo o mundo estão adotando tecnologia para reduzir filas. No Aeroporto Internacional de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, os passageiros da companhia aérea Emirates podem fazer check-in, preencher formulários de imigração e embarcar em aviões por meio de tecnologia biométrica facial e de reconhecimento de íris que verifica a identidade dos passageiros. As companhias aéreas Lufthansa, Air Canada, Nippon Airways, Japan Airlines e TEVA Air oferecem programas semelhantes em determinados aeroportos.

        Devido a um aumento no número de pessoas realizando viagens e à escassez de funcionários, é provável que longas filas permaneçam durante todo o semestre. Entretanto Larson espera que os viajantes encarem as filas como parte de sua experiência de férias. “Espero ver mais turistas tolerantes que considerarão esses atrasos apenas como parte da própria viagem”, conclui ele.

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