Elementos necessários para a existência de vida são encontrados em pequena lua de Saturno

Dados de uma espaçonave desativada sugerem que esse mundo pode ser o melhor lugar, fora a Terra, para a vida tal como a conhecemos.

Por Nadia Drake
Publicado 2 de jul. de 2018, 16:48 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
A sonda Cassini da Nasa capturou esta imagem de gêiseres expelindo material gelado da lua de ...
A sonda Cassini da Nasa capturou esta imagem de gêiseres expelindo material gelado da lua de Saturno, Encélado.
Foto de NASA, JPL Cal-tech, Space Science Institute

Em Encélado, a pequena lua de Saturno, fontes perpétuas de água marinha alienígena lançam todo tipo de coisa curiosa no espaço: água, sal, sílica e até compostos simples contendo carbono voam em direção ao vazio – muitos dos quais são ingredientes para a vida como a conhecemos.

Agora, cientistas que trabalham com dados de uma espaçonave desativada descobriram algo potencialmente ainda mais intrigante: compostos orgânicos pesados ​​contendo centenas de átomos dispostos em anéis e cadeias. Estas são as moléculas orgânicas mais complexas descobertas até agora em Encélado e – desculpe aí, Europa –podem fazer dessa lua o lugar mais promissor em nosso sistema solar para procurarmos por vida, além da Terra.

“O que sabemos hoje está nos dizendo que Encélado é um excelente alvo para se procurar vida, e pode haver micróbios vivendo naquele oceano hoje”, diz Jonathan Lunine, da Universidade de Cornell.

Descobertas pela sonda Cassini, que explorava Saturno no final de 2005, os jatos gelados que irromperam de Encélado foram uma surpresa para a maioria dos cientistas. Explodindo através de fissuras na região polar sul, os jatos contêm água marinha de um oceano global preso sob a camada gelada da lua. Ao longo dos anos, os cientistas puderam estudar esses jatos e calcular a salinidade e a acidez do oceano, identificando compostos orgânicos ejetados – como o metano – e determinando que as fontes hidrotermais no fundo do mar estão fornecendo calor e energia.

Mas essas moléculas complexas recém-detectadas aceleram a narrativa e levantam questões sobre sua origem: se são resultado de um trabalho químico sem vida ou um sinal apontando para a vida alienígena.

“Não temos a resposta para essa pergunta de cem milhões de dólares, mas certamente mostra que algo está acontecendo lá, que existe química orgânica complexa e que podemos investigá-la do espaço”, diz Frank Postberg, da Universidade de Heidelberg, principal autor do estudo descrevendo os resultados na revista Nature.

“A lua fornece livremente seu estoque orgânico em altas concentrações para a espaçonave Cassini. Isso é apenas uma descoberta incrível”.

Detector de poeira

Embora a Cassini tenha concluído sua exploração do sistema de Saturno mergulhando propositalmente no planeta anelado, em setembro passado, o enorme acervo de dados da espaçonave está repleto de tesouros à espera por serem explorados.

Isso inclui informações que Cassini reuniu enquanto voava perto do anel E do planeta. Fina e diáfana, esta fita é formada por poeira e gelo ejetados por Encélado. Enquanto a Cassini contornava a borda do anel E, algumas de suas partículas colidiam com um instrumento a bordo projetado especificamente para estudar poeira cósmica e devolver informações sobre seus ingredientes.

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    Postberg e seus colegas decidiram examinar os dados coletados durante os voos em torno dos anéis E, realizados entre 2004 e 2008, quando o instrumento estava menos contaminado por poeira interplanetária de outras partes do sistema solar. Ao longo de mais de 15 intervalos individuais, a espaçonave coletou e estudou cerca de dez mil partículas de poeira. E, em cerca de 1% delas, Postberg e seus colegas identificaram as assinaturas de compostos orgânicos complexos.

    “Foi como achar uma agulha no palheiro”, ele diz.

    Agarrando-se a grãos de gelo de água ejetados por Encélado, essas moléculas pesadas contendo carbono foram lançadas no espaço, esperando que a Cassini aparecesse e as coletasse no momento do impacto. Além disso, os compostos maiores provavelmente são fragmentos de moléculas-mãe ainda maiores que podem pesar milhares de unidades de massa atômica, diz Postberg.

    Filme flutuante

    É a primeira vez que tais compostos orgânicos pesados ​​são identificados em Encélado. Anteriormente, a Cassini detectou moléculas mais leves e gasosas, como metano e etano, que contêm um ou dois átomos de carbono e um punhado de hidrogênios; essas moléculas pesam em torno de 15 unidades de massa atômica.

    Mas as novas moléculas detectadas chegam a pesar 200 unidades de massa atômica e compreendem entre 7 e 15 átomos de carbono e punhados de hidrogênios, bem como nitrogênio e oxigênio.

    “Embora já tenhamos encontrado grandes moléculas fora da Terra antes, esta é a primeira vez que elas são detectadas emergindo de um oceano de água líquida”, diz Morgan Cable, do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, que procura por vida em lugares improváveis ​​na Terra. (Recentemente, cientistas também encontraram compostos orgânicos complexos no frio e seco planeta de Marte.)

    “Muitas moléculas orgânicas e grandes não permanecem estáveis ​​em água líquida por longos períodos de tempo, então uma das próximas perguntas a se fazer é: de onde vêm essas moléculas orgânicas?”.

    Postberg e seus colegas acham que é provável que substâncias orgânicas pesadas recém-formadas subam ao topo do oceano oceânico da lua e acabem flutuando em uma camada próxima a áreas onde a água entra em erupção devido a fissuras no polo sul. Lá, elas aderem a grãos de gelo que são carregados até o espaço em bolhas, subindo do fundo do mar até a superfície.

    “Nossos oceanos têm uma película fina de moléculas orgânicas flutuando no alto – pense em uma ‘mancha de óleo’, só que composta de vida e seus subprodutos –, que cobre o oceano de forma significativa”, diz Cable. “Agora parece que Encélado também tem isso. Mas será que também tem vida?”.

    À espera

    Embora tentadora, essa sopa de riquezas contendo carbono ainda não é uma indicação da existência de vida. Na ausência de metabolismos extraterrestres, muitos processos podem ter criado tais estruturas.

    “Será que eles estão sendo feitos a partir de um processamento abiótico no fundo do oceano, onde a rocha e a água se encontram, ou seriam resíduos de micróbios? Essa é a questão, com um Q maiúsculo”, diz Lunine.

    Fundamentalmente, a sopa molecular diz aos cientistas que o ambiente abaixo da camada gelada de Encélado é capaz de químicas extremamente complexas. Se essas reações são completamente independentes da vida e alimentadas simplesmente pela química e pela geologia; se são parte de uma mistura pré-biótica da qual a vida poderia emergir; se atualmente estão criando micróbios alienígenas; ou talvez se são resíduos de formas de vida extraterrestres que já vivem no mar de Encélado – ainda não sabemos.

    “Devemos tentar retornar a Encélado assim que possível”, diz Lunine. “Ela está a nossa espera. Não vai a parte alguma, e pense em todo aquele cocô microbiano que pode ser lançado no espaço e analisado hoje”.

    Fraturas na camada gelada serpenteiam ao longo da região polar sul de Encélado nesta imagem da Cassini.
    Foto de NASA, JPL Cal-tech, Space Science Institute

    Os instrumentos necessários para responder a essas perguntas já existem – basta uma viagem de volta. Uma dessas missões, projetada por Lunine e seus colegas e chamada de Enceladus Life Finder (Buscando vida em Encélado) poderia ter ocorrido em um futuro próximo. Mas a Nasa se recusou a financiar o projeto.

    Muito em breve, no entanto, uma frota de espaçonaves será enviada para explorar outro mundo gelado e oceânico: Europa, que orbita Júpiter. Os cientistas ainda não sabem que tipos de química ocorrem naquele mar alienígena, ou se os ingredientes necessários para a vida como a conhecemos são igualmente abundantes.

    Por enquanto, Encélado terá que esperar. E também os cientistas, que continuarão esperando que, talvez, algum dia em breve, não precisem extrair esses dados de arquivo para responder a uma das perguntas mais prementes da humanidade. Em vez disso, talvez convençam esse promissor alvo astrobiológico a revelar seus segredos em tempo real.

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