Conheça a mariposa brasileira que bebe as lágrimas de pássaros adormecidos

Espécie da Amazônia pode ajudar a explicar como o comportamento raro afeta as aves.

Por Sandrine Ceurstemont
Publicado 11 de out. de 2018, 10:47 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Biólogo avistou esta mariposa (Gorgone macarea) no pescoço de um solta-asa-do-norte no Brasil, com sua longa ...
Biólogo avistou esta mariposa (Gorgone macarea) no pescoço de um solta-asa-do-norte no Brasil, com sua longa probóscide pronta para beber as lágrimas do pássaro.
Foto de Leandro Moraes

UMA MARIPOSA FOI flagrada bebendo as lágrimas de um pássaro adormecido na Floresta Amazônica. Essa foi a primeira vez que esse comportamento foi relatado no Brasil e é apenas o terceiro caso conhecido em todo o mundo.

Mariposas e borboletas já foram frequentemente observadas alimentando-se das lágrimas de crocodilos, tartarugas e mamíferos . Acredita-se que seja uma forma de obter sal, um nutriente essencial que não está presente no néctar e pode ser difícil de encontrar em outro lugar.

As lágrimas das aves podem ser alvo pelo mesmo motivo. No entanto, a área onde este caso foi testemunhado é inundada anualmente por um rio próximo e a água absorve muito sal do solo. Como o sal está prontamente disponível, Leandro Moraes, que fez a recente descoberta publicada na semana passada na revista Ecology, ficou intrigado.

“O intrigante aqui é por que essas mariposas complementam sua dieta salina ao beberem lágrimas de aves em tal ambiente”, diz Moraes, biólogo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia em Manaus.

Visão rara

Moraes estava à procura de anfíbios e répteis à noite, quando viu o estranho comportamento. Na floresta, ao lado do rio Solimões, ele viu um Gorgone macareamoth sentado no pescoço de um solta-asa-do-norte. “Encontrar um pássaro adormecido por si só já é incomum”, diz ele.

Esta mariposa (Gorgone macarea) pode beber as lágrimas dos pássaros, como este solta-asa-do-norte, para obter uma dose extra de proteína.
Foto de Leandro Moraes

“A maior surpresa, no entanto, veio quando notei o que estava acontecendo, percebendo que a mariposa estava inserindo sua probóscide no olho do pássaro.”Parte superior do formulário

A probóscide da mariposa, uma parte bucal tubular longa, é usada para sugar líquido como um canudo. Uma mariposa conhecida por se alimentar de lágrimas de Madagáscar a utiliza como um gancho para ajudar a prendê-la durante a alimentação, mas ainda não sabemos se a probóscide da mariposa da Amazônia também tem ganchos, pois ainda não foi investigada. No entanto, é longa o suficiente para permitir que a mariposa permaneça longe do olho do hospedeiro, evitando acordá-lo.

As mariposas normalmente não usam seu “canudo” para se alimentar de animais. Na parte da floresta tropical onde a mariposa recém-nascida foi flagrada, borboletas e mariposas se reúnem perto do solo inundado e sugam o líquido salgado com seus probóscides, um comportamento chamado mud-puddling.

No entanto, quando as águas da inundação se dispersam, o fluido salgado pode ser transferido para outro local, deixando os insetos sem sua fonte de sal. “A escassez de recursos em uma determinada região em um mês específico pode explicar por que as mariposas estão buscando fontes adicionais de nutrientes nas lágrimas das aves”, diz Moraes.

As mariposas também podem estar procurando outro tipo de alimento: proteína. Embora usualmente adquiram a substância do néctar das plantas, as lágrimas - que contêm albumina e globulina, dois tipos de proteína - podem atuar como um suplemento. Um aumento de proteína pode ajudá-los a voar mais e aumenta seu sucesso reprodutivo e expectativa de vida.

“Os fluidos de vertebrados são a principal fonte alternativa de obtenção de proteínas”, diz Moraes. A calyptra, por exemplo, se alimenta do sangue de animais - ou humanos.

Mas e os pássaros?

Independentemente do que as mariposas obtêm ao beberem lágrimas, ainda não se sabe se a alimentação lacrimal afeta os hospedeiros. As mariposas atacam os animais enquanto dormem, e acredita-se que as aves sejam indiferentes à extração da lágrima, uma vez que não mostram sinais de desconforto.

“Pássaros adormecidos geralmente acordam rapidamente e escapam quando percebem um perigo”, diz Moraes.

É possível que o comportamento possa representar riscos para as aves. Suspeita-se que as mariposas que bebem lagrimas transmitem doenças oculares ao gado quando cutucam os olhos.

As mariposas não são os únicos insetos que se alimentam de lágrimas. De acordo com Michael Engel, da Universidade do Kansas, que relatou o primeiro caso de uma abelha sem ferrão que se alimenta de lágrimas no Sri Lanka no ano passado, novos casos de insetos que bebem lágrimas estão aparecendo.

O comportamento, no entanto, raramente foi relatado na selva amazônica, a maior floresta tropical do mundo que abriga uma incrível diversidade de animais, incluindo cerca de 1.300 espécies de aves e cerca de 2,5 milhões de tipos de insetos.

Há alguns anos, uma mariposa foi vista alimentando-se das lágrimas de um martim-pescador dormindo na Amazônia colombiana, o primeiro caso envolvendo pássaros na região. Abelhas solitárias também foram documentadas bebendo as lágrimas das tartarugas do rio na Amazônia equatoriana pela primeira vez em 2012.

Mas a maioria das observações do comportamento ocorreu em partes tropicais da África, Ásia e Madagascar. “A nova descoberta ajuda a expandir uma interessante região biogeográfica onde a alimentação lacrimal deve ser diversificada e ainda pouco conhecida”, diz Engel.

Enquanto Moraes continua seu trabalho de campo na Amazônia, ele seguirá observando cuidadosamente seu entorno. Este relatório é “apenas um único caso envolvendo duas espécies amazônicas, o que me leva a imaginar que existem outras milhares de relações ecológicas desconhecidas”, diz ele.

mais populares

    veja mais

    mais populares

      veja mais
      loading

      Descubra Nat Geo

      • Animais
      • Meio ambiente
      • História
      • Ciência
      • Viagem
      • Fotografia
      • Espaço

      Sobre nós

      Inscrição

      • Assine a newsletter
      • Disney+

      Siga-nos

      Copyright © 1996-2015 National Geographic Society. Copyright © 2015-2024 National Geographic Partners, LLC. Todos os direitos reservados