Estes macacos selvagens estão se proliferando, mas carregam um vírus mortal para humanos

Descendentes de espécimes foragidos de um parque temático nos Estados Unidos, a população de macacos-rhesus poderá dobrar de tamanho em breve, o que pode trazer problemas.

Por Annie Roth
Publicado 14 de nov. de 2018, 12:30 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Gestores da vida selvagem na Flórida dizem que querem remover os macacos errantes, como este no ...
Gestores da vida selvagem na Flórida dizem que querem remover os macacos errantes, como este no Rio Silver, do Parque Estadual Silver Spring, devido a um novo estudo que afirma que alguns dos animais são portadores de um vírus que pode ser perigoso para os seres humanos.
Foto de John Raoux, Ap

No coração da Flórida, nos EUA, encontra-se o Parque Estadual Silver Spring, uma grande área de florestas e pântanos cortada por um rio alimentado por uma nascente. Uma das primeiras atrações turísticas do estado, o parque já foi conhecido por suas paisagens cênicas e espécies nativas. Mas, nos últimos 80 anos, o maior atrativo do parque tem sido os macacos.

É isso mesmo, o Parque Estadual Silver Spring é lar de pelo menos 300 macacos-rhesus (Macaca mulatta), uma espécie nativa do sul e sudeste asiático. Os animais procriam rapidamente, e um novo estudo estima que a população dos primatas deva dobrar até 2022, a não ser que agências estaduais tomem providências para controlá-la.

estudo, publicado em 26 de outubro no periódico Wildlife Management, afirma que tal aumento poderá colocar a saúde do parque e de seus visitantes em sério risco. Entre outros problemas, o macaco é portador de uma forma rara e mortal do vírus da herpes, chamado herpes B. É extremamente raro que o vírus da herpes B passe de um macaco para uma pessoa, mas quando isso acontece, pode causar inflamações no cérebro e na medula espinhal, levando a danos cerebrais e morte.

O problema da Flórida com primatas começou em 1938, quando um operador de barcos turísticos conhecido como “Coronel Tooey” soltou seis macacos-rhesus em uma pequena ilha dentro do que é hoje o parque estadual. Ele adquiriu os macacos com um revendedor de primatas de Nova York, e tinha a intenção de criar uma atração na ilha com tema baseado no Tarzan, mas seus planos caíram por água abaixo rapidamente.

Tooey não sabia que os macacos-rhesus eram grandes nadadores. Após algumas horas de sua chegada na ilha, os primatas de rosto rosado começaram a escapar para as florestas. Seis outros macacos foram trazidos para substituí-los, mas eles também fugiram. Nos anos 1980, centenas deles haviam se espalhado pelos mais de dois mil hectares do parque.

Entre 1984 e 2012, agentes responsáveis pela vida silvestre da Flórida autorizaram a remoção de mais de mil macacos, visando desacelerar o crescimento populacional e evitar conflitos com humanos. Os agentes também esterilizaram 20 fêmeas no mesmo período, o que não gerou muitos resultados na desaceleração da propagação dos macacos pelo parque.

Atualmente, a população cresce por volta de 11% anualmente, diz Jane Anderson, ecologista de vida selvagem e professora auxiliar de pesquisa na Universidade A&M do Texas, em Kingsville, que liderou a equipe do estudo. A população poderia ser reduzida a um terço de seu tamanho atual se metade das fêmeas fossem esterilizadas anualmente.

Para concluir sua erradicação, a opção mais viável seria remover metade dos adultos e os espécimes próximos da idade adulta a cada dois anos por pelo menos 16 anos, acrescenta Anderson. Mas muitos moradores não apoiam a mudança.

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    Tanto a esterilização quanto a remoção acabaram bruscamente por volta de 2012, quando o público descobriu que os macacos estavam sendo removidos do parque. Até aquela data, pessoas com licenças do estado já haviam entregado mais de mil macacos nas mãos de pesquisadores biomédicos, para o repúdio de grupos pelos direitos animais. Apenas uma pessoa capturou e vendeu 700 animais.

    Negócio de macaco

    Macacos-rhesus são primatas especialmente problemáticos, diz a antropóloga Erin Riley, que estuda a interação entre humanos e animais na Universidade Estadual de San Diego. “Eles não têm medo de humanos como os outros animais, e podem ser bem desagradáveis”, ela diz.

    Diversos casos de macacos agressivos resultaram em dois fechamentos parciais do parque desde 2016, incluindo um no último verão, implementado após um macaco avançar contra uma família ao longo de uma das calçadas do parque.

    Bandos de macacos de Silver Springs também causaram alvoroço fora do parque. Recentemente, um grupo grande de macacos-rhesus assaltaram um comedor para cervos atrás de uma casa em Ocala e, sim, há fotografias. Embora a pequena cidade fique próxima do parque, machos errantes aventuram-se muitas vezes nos arredores das cidades e já chegaram a se afastar 160 quilômetros de suas colônias, indo parar nos arredores de cidades como Sarasota e Tallahassee. A colônia dentro do Parque Estadual Silver Springs já se espalhou pelo Rio Ocklawaha e pode facilmente estabelecer novas colônias em outras partes do estado, alertam especialistas.

    Esses macacos são em sua maioria herbívoros, mas também comem insetos, pequenos invertebrados e ovos de aves. Ter uma dieta tão diversa significa que eles podem sobreviver em praticamente qualquer lugar, diz Riley. Fora de seu território nativo, eles já estabeleceram populações em regiões incluindo as Florida Keys e Porto Rico.

    Em 2013, Riley recebeu subsídios da National Geographic Society para investigar como os macacos-rhesus se adaptaram à vida na Flórida. Ela descobriu que, além de se alimentarem de freixos e outras vegetações nativas, os macacos eram ocasionalmente alimentados por pessoas. Ela descobriu que aproximadamente um décimo dos barcos que atravessam o parque pelo Rio Silver oferecem ilegalmente alimento aos macacos. Riley diz que este tipo de comportamento habitua os macacos aos humanos, o que é uma fórmula para problemas.

    Os macacos “não são tão agressivos, a não ser que realmente se aproximem e tentem alimentá-los”, diz Debbie Walters, guia em um dos barcos locais turísticos, o Captain Tom's Custom Charters.

    Entre 1977 e 1984, quando a população consistia de aproximadamente 400 animais, a Comissão de Conservação de Peixes e Vida Selvagem da Flórida recebeu 23 denúncias de danos corporais causados por primatas. Desde então, a agência parou de contar.

    Invasores portadores de doenças

    Ser atacado por um macaco do tamanho de um poodle já é assustador o suficiente, mas, neste caso, pode ser mortal.

    No início deste ano, cientistas do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos descobriram que até 30% desses macacos são portadores do vírus herpes B, um vírus raro e altamente virulento que pode ser fatal para o ser humano. Apenas 50 casos de herpes B em humanos foram documentados, embora nenhum deles tenha sido proveniente de primatas selvagens. Em 1997, uma assistente de pesquisa de 22 anos morreu após os fluidos corpóreos de um desses macacos ter entrado em contato com seu olho, fazendo-a contrair a doença.

    A febre amarela não é culpa dos macacos
    A doença é transmitida pela picada de alguns mosquitos. Assim como os seres humanos, os macacos adoecem quando contaminados. Proteja-se e proteja-os.

    Em seres humanos, a herpes B, parente próxima da variedade humana mais conhecida, o vírus simples da herpes, pode causar inflamação no cérebro e na medula espinhal, resultando em lesões cerebrais graves ou morte.

    As chances de contrair herpes de um macaco-rhesus selvagem “são muito, muito baixas, mas as consequências são muito, muito graves, como se fosse uma loteria”, diz Steve Johnson, professor adjunto em ecologia da vida selvagem na Universidade da Flórida. Macacos podem transmitir o vírus através da urina, saliva e fezes, sendo os animais conhecidos por atirarem seus excrementos nas pessoas.

    No entanto, muitos moradores locais apreciam os animais e querem que eles fiquem.

    “Esses macacos estão aqui há 80 anos, e eles não escolheram vir para cá, então não acho que seja justo nos livrarmos deles porque não gostamos mais deles”, diz Walters. “Muitos outros animais transmitem doenças, e nós não os matamos”.

    Walters diz que ela apoiaria esforços de esterilização ou relocação dos macacos, mas que combateria um plano de controle que utilizasse medidas letais ou que vendesse os macacos para uso em pesquisas biomédicas.

    Embora o impacto ambiental desta pequena população seja pouco claro, estudos de outros lugares sugerem um motivo de preocupação. Uma pesquisa em Porto Rico e em partes das Florida Keys, por exemplo, mostra que os macacos podem ter efeitos nocivos ao meio ambiente, como a destruição de árvores de mangue, poluição das águas e a matança de aves nativas.

    Qual é o plano?

    Johnson, que ajudou a conduzir a recente avaliação da população de primatas em Silver Spring, diz que “eles são fofinhos e peludos, e que invocam diversas emoções, mas que não são uma espécie nativa da Flórida, assim como os porcos selvagens e as pítons birmanesas”. Embora o estado incentive os caçadores a caçarem os dois últimos animais, o que causa estragos na vida selvagem nativa, os macacos não podem ser feridos.

    Em janeiro deste ano, a Comissão de Conservação de Peixes e Vida Selvagem da Flórida solicitou que o Departamento de Proteção Ambiental da Flórida, que recentemente assumiu a gestão do parque, colocasse em vigor um plano para o controle da população.

    “Sem uma ação de controle, a presença e expansão contínua de macacos-rhesus não nativos na Flórida poderá resultar em riscos graves de saúde e segurança, incluindo lesões corporais e a transmissão de doenças”, disse Thomas Eason, diretor assistente executivo da comissão, em uma declaração no início deste ano.

    Mas ninguém decidiu o que fazer. Esses tipos de escolhas “devem ser baseadas em diversas coisas diferentes, incluindo opinião pública, dinheiro e o clima político”, disse Anderson.

    “Sinceramente, fico feliz pela decisão não ser minha”.

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