Por que a picada da ‘vespa assassina’ arde tanto?
As vespas-mandarinas, avistados nos Estados Unidos recentemente, possuem veneno relativamente tóxico que pode causar dor intensa, mas raramente ser letal.
As vespas-mandarinas (Vespa mandarinia) defendem sua colônia agressivamente, embora tenham tendência a ignorar pessoas quando estão em busca de alimentos.
O que uma pessoa sente ao ser picada pela “vespa assassina”, da espécie Vespa mandarinia? Dor. Muita dor.
A sensação é como ser “apunhalado com uma agulha incandescente”, diz Shunichi Makino, que estuda vespas e abelhas no Instituto de Pesquisa em Silvicultura e Produtos Florestais do Japão. Como se isso não bastasse, a aflição permanece.
“De modo geral, o local picado fica gravemente inchado e a dor continua por alguns dias”, explicou Makino por e-mail. E “embora esses sintomas também possam ocorrer ao ser picado por outras espécies de vespa, relatos indicam que a intensidade é muito mais violenta na espécie Vespa mandarinia”.
Soichi Yamane foi picado durante o trabalho. Ele era pesquisador de vespas — agora aposentado — e confirma a descrição de Makino: “A dor durou dois dias e eu nem conseguia dormir direito devido à dor intensa.”
Histórias de picadas agonizantes são um dos motivos pelos quais a recente descoberta das vespas-mandarinas no estado de Washington gerou tanta comoção. Os insetos atualmente estão entre os assuntos mais comentados nas redes sociais como “vespas assassinas.”
Embora esses insetos tenham o potencial de se propagarem, até o momento não foram encontrados em mais nenhum local dos Estados Unidos. E os cientistas e outros especialistas estão se trabalhando intensamente para tentar localizar e eliminar possíveis populações escondidas na área de atenção no noroeste de Washington.
A fascinação por esses insetos e pelo perigo que representam levanta a dúvida: o que é tão especial, se é que há algo especial, em relação à picada da vespa-mandarina? E qual o grau de toxicidade de seu veneno?
Por trás da dor
A toxicidade do veneno da vespa-mandarina, e de muitos de seus parentes próximos, é considerável. É superior à toxicidade da maioria dos outros insetos que picam, conta Justin Schmidt, que estuda as vespas.
Entomologista no Instituto Biológico da Universidade do Sudoeste do Arizona, Schmidt é especialista em venenos. Ele desenvolveu uma famosa escala de dor de ferroadas, conhecida como a Escala de dor Schmidt.
Em um artigo de 1986 do qual Schmidt, Yamane e outros foram coautores, os pesquisadores obtiveram veneno de diversas espécies de vespa-mandarina e injetaram em camundongos de laboratório, um experimento padrão na época para testar a toxicologia de uma substância.
Asian giant hornets have long stingers capable of piercing the protective gear normally worn by beekeepers.
Pesquisadores determinam a toxicidade utilizando uma medida chamada LD50. Também chamada de dose letal mediana, representa a quantidade necessária para matar 50% das cobaias testadas, geralmente pequenos animais como camundongos. Nessa pesquisa dos anos 1980, os cientistas constataram que o veneno da vespa-mandarina tinha uma LD50 de 4,1 miligramas por quilograma — um nível semelhante a outras vespas com um grau de parentesco próximo. Quanto menos veneno necessário para se ter uma dose letal, mais perigosa é a substância.
Para fins de comparação, a LD50 das abelhas melíferas é de 2,8 mg/kg. E o veneno de inseto mais tóxico do mundo pertence à formiga-cortadeira, com um valor de LD50 de cerca de 0,1 mg/kg em camundongos.
Embora as abelhas melíferas tenham um veneno mais tóxico que as vespas-mandarinas, as abelhas só conseguem picar uma vez. Vespas-mandarinas conseguem picar repetidamente e são capazes de instilar cerca de dez vezes mais veneno. Os cientistas determinaram que o veneno de uma vespa-mandarina seria capaz de matar cerca de dez camundongos — e que uma pequena colônia poderia matar um animal de cerca de 68 quilos.
Faz sentido que essa espécie carregue tanto veneno, já que é a maior vespa do mundo, com mais de 3,8 centímetros. Mas nem mesmo elas são as mais empenhadas em defender seus ninhos: A Vespa simillima, nativa do Japão pode realmente ser mais perigosa devido a seu comportamento agressivo, embora menor em tamanho, afirma Seiki Yamane, irmão de Soichi e que também estuda vespas no Museu da Universidade de Kagoshima.
‘Coquetel sórdido’
O que faz com que a picada da vespa-mandarina seja tão dolorida? Schmidt diz que o veneno contém acetilcolina e histamina, que causam dor e inchaço, além de substâncias químicas chamadas quininas, que dilatam os vasos sanguíneos. Uma substância denominada mastoparano, não encontrada no veneno de abelha, e a fosfolipase agem em sinergia para destruir as células imunes e estimular uma inflamação disseminada. Em combinação com as quininas, essas substâncias químicas podem decompor as células musculares e sanguíneas, explica Schmidt.
Essa destruição acarreta a liberação de grandes moléculas, como hemoglobinas, que devem ser filtradas pelos rins. Mas diversas substâncias químicas contidas no veneno também são tóxicas para os rins — um dos motivos pelo qual os ataques de vespas-mandarinas podem provocar insuficiência renal — afirma Schmidt. A espécie também possui uma neurotoxina singular que pode bloquear os impulsos nervosos.
“É um coquetel sórdido de substâncias químicas elaborado para que uma pessoa não volte a mexer com elas”, conta Schmidt.
Mantendo-se em segurança
De acordo com Schmidt, para que o veneno atinja níveis potencialmente fatais, uma pessoa teria que ser picada por umas duas centenas de vespas-mandarinas, em comparação com cerca de mil abelhas melíferas.
No Japão, vespas-mandarinas causam entre 30 e 50 mortes por ano, mas a maior parte das fatalidades se deve a reações anafiláticas alérgicas e não à toxicidade aguda, explica Schmidt.
No entanto é importante lembrar que vespas-mandarinas, assim como outras vespas, geralmente não atacam, a menos que se sintam ameaçadas. Principalmente quando os insetos estão em busca de alimentos, é provável que ignorem os humanos; a maioria das mortes causadas por picadas de vespas-mandarinas ocorre porque as pessoas mexem nos ninhos desses insetos de forma ameaçadora.
Schimidt observa que vespas-mandarinas emitem um aviso antes de picarem: elas voam para frente e para trás, estalando a mandíbula. “Isso é intimidador e chama a atenção”, conta Schmidt. “É a única espécie que faz isso.”
O próprio Schmidt nunca foi picado por uma vespa-mandarina, mesmo tendo começado a estudá-las em 1980. Seus colegas japoneses o alertaram a vestir uma blusa grossa por baixo do macacão de apicultura para impedir os longos ferrões desses insetos. Funcionou — embora Schmidt às vezes se arrependa disso.
“Relembrando", diz ele, "eu até que gostaria de ter sido picado porque seria um dado pertinente para a pesquisa."