Como jovens LGBTQ+ estão formando comunidades por meio de trabalhos de conservação

Essas organizações voltadas ao público LGBTQ+ transformam áreas ao ar livre em ambientes mais acolhedores para todos.

Por Miles Griffis
Publicado 25 de jun. de 2021, 06:00 BRT, Atualizado 25 de jun. de 2021, 10:57 BRT
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Membro do Rainbow Crew, do Northwest Youth Corps, trabalha na abertura de uma nova trilha no Parque Nacional do Monte Rainier. Com o surgimento de empresas administradas por homossexuais que oferecem aventuras ao ar livre, os jovens LGBTQ+ encontraram lugares seguros para aprender a explorar a vida na natureza e preservar o meio ambiente.

Courtesy Northwest Youth Corps

Em uma manhã de agosto, membros do Rainbow Conservation Crew acordaram e tomaram café da manhã em um acampamento no Parque Nacional do Monte Rainier antes de percorrer quase cinco quilômetros a pé carregando Mcleods, machados Pulaski e peaveys — ferramentas usadas para abrir trilhas e combater incêndios em áreas florestais — até o local de trabalho, na histórica trilha Wonderland.

Nas últimas semanas, o grupo de adolescentes abriu caminho em trechos da trilha de 150 quilômetros que contorna o Monte Rainier, em Washington— ou Tahoma, como é chamado pelo povo puyallup — que desliza como uma montanha-russa entre campos alpinos, florestas temperadas e rios abastecidos pelo degelo.

Era o terceiro verão que Mel Hanby, líder em treinamento do grupo, trabalhava com o Northwest Youth Corps (NYC) após se unir ao Rainbow Crew, primeiro programa de conservação voltado a jovens LGBTQ+ do país, em 2017. Hanby, um voluntário de longa data, assumiu responsabilidades em áreas mais remotas quando passou a supervisionar os adolescentes, em conjunto com os líderes experientes Ernie Callaghan e Ash Young. Um dos principais projetos da equipe durante o programa de cinco semanas era construir uma ponte de extrema necessidade sobre uma travessia perigosa do Rio Carbon.

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    Membros do Rainbow Crew descansam perto do Parque Histórico Nacional Lewis and Clark. Primeiro programa de conservação voltado à juventude LGBTQ+ dos EUA, a organização está à frente do desenvolvimento de carreira e gestão ambiental para adolescentes homossexuais.

    Foto de Edison Velez III

    “O programa para jovens não é um acampamento de verão”, explica Hanby. “Para muitos de nós é o primeiro emprego remunerado e requer muita responsabilidade.” Ele esclarece que, para que os jovens sejam bem-sucedidos no programa, eles precisam aprender não apenas os aspectos técnicos do trabalho em trilhas, mas também as habilidades básicas sobre a vida na natureza, acampamento e cuidados pessoais.

    Com o aumento no número de empresas administradas por homossexuais que oferecem aventuras ao ar livre, como a Out There Adventures (OTA) e a The Venture Out Project , assim como excursões educacionais em áreas ao ar livre voltadas ao público LGBTQ+, oferecidas por empresas como a NOLS e a Outward Bound, jovens homossexuais aprendem habilidades para a vida ao ar livre e liderança em programas conduzidos por guias LGBTQ+. Nesse espaço em desenvolvimento, a tendência é um novo tipo de experiência, com foco em gestão ambiental e desenvolvimento de carreira. O Rainbow Crew, do Northwest Youth Corps, é um dos expoentes dessa tendência.

    Por que grupos voltados a homossexuais são importantes

    Além de oferecer um ambiente seguro para o grupo aprender habilidades que poderão ser aplicadas posteriormente a suas vidas profissionais, o Rainbow Crew também pode ser o primeiro modelo de comportamento LGBTQ+ para os membros do programa. Hanby, que se identifica como um homem transgênero, conta que a primeira vez em que conheceu um homem adulto transexual foi na sua primeira viagem com o programa.

    “Foi transformador”, ele lembra. “Eu não sabia que existiam homens transexuais adultos. Eu não sabia que poderíamos chegar tão longe na vida. O que eu acho incrível nos grupos com identidade de gênero específica é que muitas pessoas — e quando eu tinha 16 anos, também era uma delas,— têm muito medo de aprender habilidades sobre a vida na natureza, tendo que lidar com homofobia ou transfobia ao mesmo tempo. No Rainbow Crew não precisamos nos preocupar com isso.”

    No fim do primeiro verão em que participou do programa, Hanby passou a cogitar a possibilidade de ter um papel no trabalho de conservação. No verão seguinte, ele entrou no Programa de Liderança Backcountry do Northwest Youth Corps (grupo que não possui identidade específica LGBTQ+), onde os membros vão para áreas bem remotas e trabalham em projetos mais técnicos, enquanto recebem treinamento de liderança. Depois de concluir o programa intensivo, Hanby participou do NYC pelo terceiro ano, em 2019, como um dos líderes do Rainbow Crew, o mesmo grupo que ele havia participado dois anos antes.

    Ter o apoio de uma organização que oferece oportunidades e espaços seguros é essencial para os jovens homossexuais, especialmente em épocas em que o atendimento médico a jovens transgêneros é proibido em vários estados dos Estados Unidos e a legislação impede que esses mesmos jovens pratiquem esportes. “É difícil estar preso em um corpo”, pondera o ex-líder do NYC, Ernie Callaghan, que se identifica como não binário. “Não é fácil movimentar e saber usar seu corpo quando você se sente desconectado dele devido a questões relacionadas ao gênero.”

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        Durante o verão, flores silvestres cobrem o parque nos arredores do Monte Rainier.

        Foto de Christopher Kimmel, Alamy

        Quando Callaghan liderou o Rainbow Crew em 2019, os grupos assumiram várias tarefas, como fazer degraus com ferramentas, arrancar arbustos invasivos com as mãos e movimentar pedras enormes para construir trilhas. Callaghan acredita que, ao realizar essas tarefas, os membros do programa adquirem maior consciência corporal e confiança. “Para conseguir fazer essas tarefas é necessário conhecer a mecânica do corpo humano e o que significa viver nele.”

        Obtendo sucesso

        Ao perceber a falta de oportunidades para adolescentes homossexuais interessados em atividades ao ar livre e conservação, Elyse Rylander, fundadora da OUT There Adventures, e Jay Satz, diretor sênior do Northwest Youth Corps, se uniram para formar o Rainbow Conservation Crew em 2017, com o apoio do Fundo de Exploração North Face e da administração da Floresta Nacional Okanogan-Wenatchee.

        Embora as atividades do Rainbow Crew tenham evoluído nos últimos anos, seus objetivos principais permaneceram os mesmos — levar jovens para espaços seguros ao ar livre, ensinar-lhes habilidades de conservação e oferecer-lhes um salário para isso.

        Nos últimos anos, doações e financiamentos da Fundação National Park ajudaram o programa a crescer; em 2021, a fundação investiu mais de US$ 4,5 milhões em programas de conservação em todo o país. O NYC agora oferece dois grupos diferentes de inclusão LGBTQ+ para jovens de 15 a 19 anos, bem como um programa de oito semanas para jovens adultos LGBTQ+ de 19 a 25 anos. Esses grupos trabalharam no Parque Histórico Nacional Lewis and Clark, no Parque Nacional Olympic e em outros parques nacionais em toda a região do noroeste do Pacífico.

         “Devido à duração das viagens e ao trabalho árduo, o Rainbow Crew realmente ajuda os participantes a entenderem quem eles são ao se identificarem como homossexuais e o que podem fazer em relação à natureza”, comenta Rylander, que fundou a OTA em 2014 com a missão de oferecer aos jovens a oportunidade de explorar sua identidade em um ambiente positivo. Ela acredita que o Rainbow Crew produz um impacto duradouro nos jovens, e isso os ajuda a pensar em futuras carreiras nos campos de conservação e educação sobre a natureza.

        Mas o grupo não está produzindo esse efeito apenas nos membros LGBTQ+ — ele começou a mudar a cultura dos programas de conservação do país inteiro.

        No fim de 2020, o Rainbow Crew do NYC foi premiado como o Projeto do Ano na Conferência Nacional da Rede de Programas, uma das maiores honrarias concedida pela comunidade de programas de conservação. “Muitos programas começaram a perceber que muito mais pessoas transexuais e homossexuais estão participando do que antes, e estão tentando dar espaço para que esses jovens possam ser eles mesmos”, afirma Jay Satz. Satz conta que, nos últimos anos, tem visto a implementação do uso de pronomes inclusivos e uma maior consciência de gênero em muitos programas por todo o país.

        Grupos que se identificam como homossexuais são uma tendência crescente 

        Além do Rainbow Crew, o NYC também apoia o Grupo de Linguagem Americana de Sinais, um dos muitos outros programas que ajudam a remover barreiras para a participação de populações minoritárias.

        Apoio semelhante é observado em outras partes do país. O Leaders of Color Crew do Southwest Conservation Corps, programa para indivíduos negros e indígenas, fez atividades durante o primeiro semestre e o Ancestral Lands Conservation Corps tem uma grande variedade de grupos para adolescentes e jovens adultos indígenas, incluindo um grupo formado apenas por mulheres que trabalha na restauração de habitats no Parque Nacional do Grand Canyon.

        Da mesma forma, o Eastern Sierra Conservation Corps (ESCC), com sede na Califórnia, lançou recentemente o Grupo Técnico WILDlands (Desenvolvimento de Liderança com Imersão na Natureza), um programa para adultos homossexuais de 21 a 30 anos, com duração de quatro meses. Atualmente, o programa LGBTQ+ trabalha em projetos nos Parques Nacionais Sequoia e Kings Canyon. Em conjunto com o WILDlands, o ESCC conduz imersões de oito dias na natureza, em que ensinam sobre trabalho em trilhas para adolescentes do sexo feminino e jovens LGBTQ+.

        Membros do Rainbow Crew constroem um muro de contenção feito de pedras para conferir estabilidade à trilha no Parque Nacional do Monte Rainier.

        Courtesy Northwest Youth Corps

        Embora existam poucos programas de longo prazo para jovens homossexuais como o NYC, a Associação Washington Trails (WTA) organiza viagens com duração de uma semana, como as Férias Voluntárias para Jovens LGBTQ+, uma viagem de seis dias no Parque Nacional do Monte Rainier, com foco no trabalho em trilhas. A organização também oferece viagens de voluntariado para adultos homossexuais, como a viagem de seis dias durante o outono para a Floresta Estadual Yacolt Burns, assim como eventos de um dia com trabalho voluntário em trilhas para jovens e adultos LGBTQ+.

        Outro grupo, o Projeto Venture Out, uma organização sem fins lucrativos de educação sobre a natureza liderada por homossexuais, conduzirá adultos LGBTQ+ em uma viagem para trabalho em trilhas no Parque Nacional de Yellowstone durante seis dias de agosto. Oliver Reitz, um dos líderes da viagem, conta que muitas pessoas LGBTQ+ que costumam passar tempo ao ar livre estão começando a se envolver mais com o trabalho nas trilhas.

        “Criamos uma comunidade”, ele afirma sobre os jovens LGBTQ+ que trabalham nas trilhas. “Acho que muitas pessoas estão percebendo que o cuidado com a comunidade precisa estar além das trilhas e da própria terra.” 

        Para muitas pessoas homossexuais e de outros grupos marginalizados, oportunidades como o Grupo de Conservação Arco-Íris e outros grupos de identidade específica oferecem aos adolescentes e jovens adultos uma oportunidade acessível de aprender habilidades de conservação e de vida na natureza, das quais eles podem ter sido excluídos no passado.

        Will Shafroth, presidente e CEO da Fundação de Parques Nacionais, acredita que mais programas voltados ao público LGBTQ+ e outros grupos de afinidade começarão a se formar nos próximos anos devido à demanda pelos programas e à necessidade de obras de conservação em terras públicas do país.

        “Precisamos formar futuros defensores e apoiadores dessas terras públicas”, declara Shafroth, mencionando a ajuda da fundação para financiar vários programas de conservação voltado ao público LGBTQ+ em todo o país, desde o NYC até o ESCC. “Uma das coisas pelas quais lutamos nas nossas terras públicas, não apenas nos nossos parques nacionais, é garantir que todos se sintam acolhidos nesses locais. Queremos criar experiências seguras para que isso esteja entre as atividades que as pessoas gostam de fazer na vida.”

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