Onde, exatamente, começa o espaço sideral? Depende de quem irá responder a pergunta.

Com mais países e empresas privadas chegando até a estratosfera, esquenta o debate sobre como o espaço deve ser delimitado.

Por Nadia Drake
Publicado 1 de jan. de 2019, 10:00 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
A lua parece estar pendurada no limite entre a atmosfera da Terra e a escuridão do ...
A lua parece estar pendurada no limite entre a atmosfera da Terra e a escuridão do espaço em uma foto tirada da Estação Espacial Internacional.
Photography by Reid Wiseman, NASA

PERGUNTE A ALGUÉM ONDE é o espaço e a pessoa provavelmente apontará para o céu. É lá em cima, certo? Simples assim.

Exceto pelo fato de que ninguém realmente sabe onde termina o "espaço aéreo" e onde começa o "espaço sideral". Isso pode parecer irrelevante, mas definir essa fronteira é importante por diversos motivos—incluindo, entre outros, os critérios a serem atendidos para que uma pessoa seja considerada um astronauta.

Atualmente, com a Virgin Galactic prestes a oferecer turismo espacial em forma de voos suborbitais, muitas pessoas se perguntam se esses sortudos turistas do espaço receberão o distintivo de astronauta. A partir de agora, eles receberão sim, de acordo com as práticas dos Estados Unidos.

Isso é um problema? "Não, eu acho ótimo!" diz Mike Massimino, astronauta da NASA que ajudou a consertar o Telescópio Espacial Hubble.

Aqui da Terra, analisamos as diversas formas atuais de definição do espaço, a confusão em torno da demarcação e o que o futuro pode nos reservar.

É realmente necessário saber onde o espaço começa?

Tratados internacionais definem o "espaço" como uma região livre para exploração e uso por todos, mas o mesmo não ocorre com a soberania do espaço aéreo de cada nação. As leis que governam o espaço aéreo e o espaço sideral são diferentes; é perfeitamente possível operar um satélite a cerca de 88 quilômetros da superfície da China se o espaço sideral começar a partir dos 80 quilômetros; mas se o limite for 96 quilômetros, o seu satélite poderá ser visto como uma agressão militar.

"Onde acaba o espaço aéreo de um país e onde começa o espaço sideral?", pergunta Jonathan McDowell, do Centro Harvard-Smithsoniano de Astrofísica. "A partir do momento em que você estabelece de comum acordo a fronteira do espaço, você também estabelece o escopo da legislação".

Entretanto, os Estados Unidos e alguns outros países resistem em delimitar o espaço de modo formal e internacional, alegando não ser necessário e que "nenhum problema legal ou prático surgiu até o momento na ausência dessa definição". Outros alegam que uma fronteira será crucial, considerando o aumento no número de programas espaciais nacionais e de empresas de turismo espacial, o que está intensificando muito o tráfego suborbital.

Então, como o "espaço" é definido atualmente?

Basicamente, a maioria dos especialistas afirma que o espaço começa no ponto onde as forças dinâmicas orbitais se tornam mais importantes do que as forças aerodinâmicas, ou onde a atmosfera apenas não é suficiente para sustentar um veículo em velocidade suborbital.

Historicamente, sempre foi difícil fixar esse ponto em uma determinada altitude. Na década de 1990, o físico húngaro Theodore von Kármán determinou a fronteira a cerca de 50 milhas de altitude, ou aproximadamente 80 quilômetros acima do nível do mar. Hoje, contudo, a linha de Kármán está situada naquilo que a NOAA chama de "fronteira imaginária", a cerca de 62 milhas de altitude, ou quase 100 quilômetros acima do nível do mar.

A Federação Aeronáutica Internacional (FAI), que monitora os padrões e registros astronáuticos e aeronáuticos, também define o início do espaço a cem quilômetros de altitude. Afinal, é um número redondo e simpático.

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    Mas, de acordo com a Administração Federal de Aviação, a Força Aérea dos EUA, a NOAA e a NASA, a fronteira fica a 80 quilômetros de altitude, sendo que a Força Aérea concede um distintivo de astronauta àqueles que ultrapassam essa marca nos céus. Ao mesmo tempo, o Centro de Controle de Missão da NASA situa o limite a 122 quilômetros porque é "nesse ponto que o arrasto atmosférico se torna perceptível", escrevem Bhavya Lal e Emily Nightingale do Instituto de Políticas Científicas e Tecnológicas em uma revisão da literatura de 2014.

    Por que não se chega a um acordo?

    "A verdade é que o assunto é bastante político", diz McDowell.

    Não é fácil distinguir o que "é espaço" do que "não é espaço", em parte porque a atmosfera da Terra não desaparece de uma hora para a outra; em vez disso, ela se torna cada vez mais rarefeita a partir de cerca de 965 quilômetros de altitude. Tecnicamente, a Estação Espacial Internacional—que orbita a uma altitude média de 386 quilômetros—não estaria no espaço se definirmos "espaço" como a ausência de atmosfera.

    Além disso, satélites não conseguem permanecer em órbita de forma estável acima dessa altitude; isso depende do tipo de satélite e de sua trajetória orbital, afirma McDowell.

    Como um apaixonado por listas, McDowell estava trabalhando em registros de foguetes, astronautas e outros objetos espaciais e começou a procurar por uma fronteira internacionalmente aceita que pudesse ajudá-lo a decidir quais registros incluir. Quando ele percebeu que essa fronteira não existia, decidiu descobrir uma e voltou aos cálculos de von Kármán.

    Ele analisou rotas orbitais publicamente disponíveis de 43 mil satélites e classificou essas rotas com base no ponto mais baixo de sua órbita (chamado perigeu) durante o descomissionamento e a reentrada na atmosfera. A partir daí, ele percebeu que os satélites poderiam orbitar o planeta diversas vezes abaixo de uma altitude de 99 quilômetros, porém, aqueles que atingiam menos de 80 quilômetros de altitude normalmente tinham um fim rápido e quente.

    Posteriormente, ele refez os cálculos de von Kármán e descobriu que as contribuições atmosféricas a uma aeronave em órbita se tornam negligenciáveis acima de cerca de 80 quilômetros de altitude.

    "Você não vê satélites atingirem 112 quilômetros e voltarem", afirma ele. "É um limite bem demarcado, um limite com uma boa demarcação, que vai do menor perigeu possível ao ponto do qual não é mais possível voltar".

    Com empresas de turismo espacial cada vez mais perto do limite do espaço, será que as delimitações do espaço serão definidas formalmente em 2019?

    McDowell acredita que isso seja improvável, embora ele tenha certeza que o debate intensificará conforme empresas de turismo espacial começarem a passar mais tempo na região entre cerca de 80 e 320 quilômetros de altitude, onde orbita a estação espacial.

    "Acredito que conforme a atividade espacial caminhe para esse regime, a pressão para definir uma fronteira será maior", afirma ele.

    Na verdade, a FAI afirma que com base em "convincentes" análises que sugerem que o espaço externo começaria a cerca de 80 quilômetros de altitude, ela irá propor uma reunião no próximo ano para avaliar a ideia.

    Turistas espaciais em voos suborbitais poderão ser chamados de "astronautas"?

    A partir de agora, sim, pelo menos se embarcarem de um centro de lançamento dos EUA. A FAA e a Força Aérea dos EUA concordam que voar acima de 80 quilômetros de altitude qualifica uma pessoa para o título. (Veja a localização de portos espaciais ao redor do mundo.)

    O que os astronautas da NASA acham disso?

    Algumas pessoas poderiam argumentar que para ser um astronauta é necessário entrar em órbita. Entretanto, "acho que Alan Shepard e Gus Grissom discordariam”, diz Terry Virts, ex-comandante da Estação Espacial Internacional que passou mais de 213 dias em órbita. "Eles foram os primeiros dois astronautas norte-americanos que não entraram em órbita".

    Virts diz que há uma grande diferença entre fazer um voo suborbital de 5 minutos e realizar uma missão orbital de 6 meses, mas no fim, em ambos os casos, as pessoas ganharam o título de "astronauta".

    "Acho que apertar o cinto e chegar ao espaço já é alguma coisa", afirma Virts. "Quando eu era piloto de F-16, eu não sentia ciúmes do fato de pilotos de Cessna serem chamados de pilotos. Acho que todo mundo saberá se você pagou para ser um passageiro em um voo suborbital de 5 minutos ou se você é o comandante de um veículo espacial interplanetário. São coisas bem diferentes".

    Massimino concorda que haja uma distinção importante entre ser selecionado como astronauta da NASA—“os treinamentos, as dificuldades, as rejeições, tudo isso"—e ser um cliente que paga por um serviço. Mas ele é completamente a favor de os turistas espaciais ganharem o título.

    "Acho que se você ultrapassa a linha, você certamente se qualifica como um astronauta, sem dúvidas", afirma ele. "Quanto mais, melhor!"

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