Astrônomos podem ter flagrado estrela morta sendo devorada por buraco negro

Ondulações no tecido do espaço-tempo revelam o que pode ser uma colisão cósmica inédita.

Por Michael Greshko
Publicado 20 de ago. de 2019, 14:28 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
A representação deste artista ilustra um buraco negro devorando uma estrela de nêutrons. À medida que ...
A representação deste artista ilustra um buraco negro devorando uma estrela de nêutrons. À medida que a estrela de nêutrons circunda o buraco negro, a imensa gravidade do buraco negro a despedaça, um fenômeno conhecido como ruptura por ação das forças de maré.
Foto de Illustration by Dana Berry, NASA

Cerca de 900 milhões de anos atrás, um buraco negro sinalizou que havia se alimentado e ficado satisfeito, e esse sinal ecoou pelo cosmos. Em 14 de agosto, as consequentes ondulações no tecido do espaço-tempo passaram pela Terra — que até agora são a melhor evidência de um tipo de colisão cósmica nunca vista antes, que pode oferecer novos detalhes sobre o funcionamento do universo.

A detecção, chamada S190814bv, provavelmente foi desencadeada pela fusão de um buraco negro e uma estrela de nêutrons, que são restos superdensos de uma estrela que explodiu. Embora os astrônomos acreditem que tais sistemas binários existam há tempos, eles nunca tinham sido vistos por telescópios que examinam os céus em busca de diferentes comprimentos de onda de luz. (Veja a primeira imagem da silhueta de um buraco negro feita com um enorme conjunto de radiotelescópios.)

No entanto, os astrônomos também acreditam que tais sistemas criem ondulações conhecidas como ondas gravitacionais quando o buraco negro e a estrela de nêutrons se fundem, se o fenômeno vier a acontecer. Essas ondulações do espaço-tempo foram previstas há mais de um século pela teoria geral da relatividade de Einstein, que sugeria que a colisão de dois corpos extremamente massivos faria com que o próprio tecido do universo se enrugasse.

Ondas gravitacionais foram detectadas pela primeira vez em 2015, quando o observatório LIGO captou o sinal da união de dois buracos negros. Desde então, o LIGO e seu equivalente europeu, o observatório Virgo, detectaram outras fusões envolvendo buracos negros, bem como a colisão de duas estrelas de nêutrons. Tanto o LIGO quanto o Virgo detectaram S190814bv e, se ele de fato representar a fusão de uma estrela de nêutrons com um buraco negro, seria o terceiro tipo distinto de colisão captado com ondas gravitacionais.

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Embora os detectores também tenham captado sinais da fusão de uma estrela de nêutrons com um buraco negro em 26 de abril, os pesquisadores dizem que S190814bv é muito mais convincente. O evento de abril tem uma chance em sete de ser um ruído proveniente da Terra, e falsos alarmes semelhantes ao sinal de abril são esperados a cada 20 meses. Mas é praticamente certo que S190814bv tenha vindo de fora do nosso planeta, e para observar um alarme falso parecido com o S190814bv, a equipe do LIGO estima que seria preciso esperar mais do que a idade do universo.

“Isso é algo que nos deixa muito mais animados”, diz Christopher Berry, membro da equipe do LIGO e físico da Northwestern University. “É muito mais provável que seja real, então isso significa que vale a pena investir mais tempo e esforço”.

Triturador cósmico

O LIGO e o Virgo também rastrearam a origem de S190814bv como sendo uma mancha oval no céu cerca de 11 vezes maior que a lua cheia — possibilitando o monitoramento, por parte dos telescópios, de flashes incomuns de luz. Instrumentos em todo o mundo e em órbita pausaram suas observações programadas para participar da caçada, publicando seus primeiros resultados em tempo real.

“É muito emocionante”, diz Aaron Tohuvavohu, cientista do observatório encarregado do telescópio Swift da NASA, que tem procurado por flashes de raios X e luz ultravioleta no mesmo trecho do céu que produziu o sinal da onda gravitacional. “Passei a noite em claro, mas estou muito feliz”.

Se o Swift e outros telescópios realmente conseguirem detectar o brilho proveniente da colisão que LIGO e Virgo sentiram, seria um grande passo para a astronomia, já que a luz permitiria aos cientistas analisar o interior de uma estrela de nêutrons pela primeira vez, e possivelmente testar os limites da relatividade de formas inéditas.

“Isso seria fantástico [e] um sonho para um teórico”, diz a integrante da equipe do LIGO, Vicky Kalogera, física da Northwestern University.

No entanto não é possível afirmar que os telescópios irão detectar algo. De acordo com a teoria atual, colisões entre estrelas de nêutrons e buracos negros nem sempre emitem luz, dependendo de como as massas dos dois objetos se comparam.

Quanto mais próximas as massas do buraco negro e da estrela de nêutrons, mais tempo leva para a estrela entrar em espiral no buraco negro. Isso permite que os dois orbitem um ao redor do outro a uma distância menor, o que dá ao buraco negro mais oportunidade de destruir, do ponto de vista gravitacional, a estrela de nêutrons. Antes de o confete brilhante cair no buraco negro, ele pode emitir luz que pode ser detectada pelos telescópios.

Mas se o buraco negro for muito maior que a estrela de nêutrons, ele pode engoli-la inteira com facilidade, impossibilitando a emissão de luz. Kalogera diz que os cientistas ainda estão analisando os dados referentes ao S190814bv para limitar a massa do buraco negro, o que deve esclarecer a situação nesse caso.

Avaliando a situação

Outra possibilidade estranha é que o objeto menor em S190814bv não seja uma estrela de nêutrons.

LIGO e Virgo classificam as fusões que detectam de acordo com as massas estimadas dos objetos em cada colisão. Qualquer objeto com menos de três vezes a massa do nosso Sol é considerado uma estrela de nêutrons. Qualquer objeto com mais de cinco vezes a massa do nosso Sol é considerado um buraco negro. Nesse caso, estima-se que o objeto menor em S190814bv tenha menos de três massas solares.

Embora, teoricamente, buracos negros com menos massa possam existir, medições do cosmo feitas com raios X ainda não encontraram nenhum sinal deles. Da mesma forma, nossas melhores teorias para estrelas de nêutrons dizem que, se ficarem muito maiores que duas massas solares, elas entram em colapso e se transformam em buracos negros. E se essa lacuna entre três e cinco massas solares simplesmente indicar uma lacuna em nossas observações, e o objeto menor em S190814bv for um buraco negro de tamanho reduzido?

“Há realmente dois mistérios que podem ser desvendados por esse evento”, diz Berry. “Qual é a massa máxima de uma estrela de nêutrons e qual é a massa mínima de um buraco negro?”

Características sutis das ondas gravitacionais podem permitir que os cientistas descubram a identidade do objeto menor em S190814bv. E se as medidas realizadas posteriormente realmente detectarem algum brilho, — que de acordo com Kalogera pode levar semanas — seria possível confirmar que o objeto menor é uma estrela de nêutrons.

Seja qual for o tipo de sinal, será inédito, Berry diz: “É uma situação em que todos saem ganhando”.

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