A banana está cada vez mais perto de desaparecer

Um fungo que causa devastação em bananeiras chegou à América Latina, segundo confirmação do governo da Colômbia.

Por Myles Karp
Publicado 16 de ago. de 2019, 12:26 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma bananeira perene em uma plantação em Guadalupe em 10 de abril de 2018. Um fungo ...
Uma bananeira perene em uma plantação em Guadalupe em 10 de abril de 2018. Um fungo mortal ameaça o futuro da banana amarela, vendida quase exclusivamente nos Estados Unidos.
Foto de Helene Valenzuela, AFP/Getty Images

O fungo que assolou bananais no Oriente chegou às Américas, apesar de anos de esforços preventivos.

A ICA, autoridade colombiana de agropecuária, confirmou na que exames laboratoriais identificaram a presença da chamada Raça Tropical 4 do mal-do-panamá em bananais na região costeira do Caribe. Foi decretado estado de emergência nacional simultaneamente ao anúncio.

A descoberta do fungo representa um possível desastre iminente na produção de bananas tanto como fonte de alimento quanto como mercadoria de exportação. A Raça Tropical 4 do mal-do-panamá — ou TR4 — é uma doença transmitida a bananeiras pelo fungo do gênero Fusarium. Embora as bananas produzidas em solo contaminado não façam mal à saúde, as plantas contaminadas acabam interrompendo a frutificação.

Transmissão rápida

Identificado pela primeira vez em amostras de solo em Taiwan no início da década de 1990, o destrutivo fungo permaneceu, por muito tempo, confinado ao sudeste da Ásia e à Austrália, até a confirmação de sua presença no Oriente Médio e na África em 2013. Os especialistas temiam sua eventual aparição na América Latina, o epicentro da indústria global de exportação de banana.

“Quando se percebe, já é tarde demais e a doença provavelmente se espalhou para outras regiões sem que tenha sido notado”, afirma Gert Kema, professor de Fitopatologia Tropical da Universidade Wageningen, nos Países Baixos, cujo laboratório analisou amostras de solo para confirmar a presença da TR4 na Colômbia e epidemias anteriores.

Nenhuma medida de controle biológico e nenhum fungicida conhecido se revelaram eficazes contra a TR4. “Pelo que sei, o ICA e as propriedades rurais estão fazendo um bom trabalho em termos de contenção, mas a erradicação é quase impossível”, afirma Fernando García-Bastidas, fitopatologista colombiano que coordenou as análises laboratoriais.

O próprio cultivo da banana é, em parte, culpado pela possível transmissão do fungo. As culturas comerciais cultivam quase que exclusivamente uma variedade clonal, chamada de Cavendish, grupo da banana nanica; a genética idêntica dessas plantas implica que elas sejam igualmente suscetíveis à doença. A prática de cultivo com limitada diversidade genética — chamada tecnicamente de monocultura — barateia e torna mais eficientes a comercialização e a agricultura comercial, porém deixa as culturas de alimentos perigosamente vulneráveis a epidemias.

Consumidores de países importadores como os Estados Unidos podem ter de lamentar, em algum momento, os aumentos nos preços e quedas nos estoques de bananas para suas torradas e vitaminas, mas logo superarão isso. Contudo, para milhões de pessoas na América Latina, Caribe, África e Ásia, as bananas são uma fonte fundamental de nutrientes.

Além das bananas Cavendish que dominam as atuais prateleiras de supermercados, os moradores de países produtores de bananas contam com uma infinidade de variedades locais, como a banana-da-terra, para sua segurança alimentar. A TR4 do mal-do-panamá possui notadamente um amplo espectro, o que significa que ameaça quase todas essas variedades em certa medida.

Não serve apenas de alimento

A América Latina depende de bananas não somente como fonte de alimento, mas também como um importante recurso econômico. A região possui quatro dos cinco principais produtores de bananas para o mercado de exportação e todos os 10 principais exportadores de banana para os Estados Unidos. O Equador, que faz divisa com a Colômbia, é o maior exportador mundial. A proliferação da TR4 na América Central e na América do Sul poderia provocar um desequilíbrio econômico generalizado.

Entretanto a situação não seria totalmente inédita. Na primeira metade do século 20, uma linhagem anterior do mal-do-panamá — conhecida atualmente como Raça 1 — quase erradicou o fornecimento global da banana Gros Michel, que, na época, era a única banana importada pelos Estados Unidos e pela Europa.

Desesperadas, as antecessoras das empresas Chiquita e Dole trocaram a produção para uma banana que sabiam que era resistente ao mal-do-panamá, apesar de seu sabor relativamente insosso: a atual e abundante Cavendish. A TR4, a última linhagem do mal-do-panamá, não poupa sequer a Cavendish.

Ao contrário da epidemia anterior do mal-do-panamá, desta vez, não existe uma banana substituta pronta para socorrer o setor. Embora sejam cultivadas milhares de variedades de banana no mundo, apenas algumas contam com as características exatas necessárias para suportar os rigores do cultivo comercial em larga escala, do transporte por longas distâncias e do comércio internacional. Não existe uma banana com essas características, sabor e aparência semelhantes à da amada Cavendish e que tenha resistência à TR4.

Não existe uma banana substituta

Como a reprodução das bananas é assexuada, a criação de novos cultivares é uma tarefa extremamente difícil e que demanda muito tempo. Cientistas da Fundação Hondurenha de Investigação Agrícola, ou FHIA, desenvolveram bananas que toleram a TR4 e outras doenças, mas, por serem pouco conhecidas, provavelmente não serão aceitas por consumidores e produtores. Na década de 1990, um projeto de desenvolvimento levou pequenas quantidades das bananas Goldfinger e Mona Lisa da FHIA a mercados no Canadá, mas não tiveram aceitação pelos compradores.

Outros cientistas — em destaque, James Dale, da Universidade de Tecnologia de Queensland, na Austrália — estão testando bananas Cavendish resistentes à doença e geneticamente modificadas, mas a repulsa pública a organismos geneticamente modificados poderia se revelar um obstáculo expressivo para sua aceitação generalizada. As variedades criadas na Ásia por meio de um método chamado variação somaclonal são apenas parcialmente resistentes e possuem atributos agrícolas aquém do ideal.

Independente do método empregado, a criação de um único substituto viável não é uma solução em longo prazo. “Precisamos produzir uma grande biodiversidade gerando muitas variedades novas de banana, não apenas uma”, afirma Kema. “A monocultura é, por definição, insustentável.”

Os consumidores e participantes do setor podem adorar a banana Cavendish, mas uma adoção taxativa de uma única variedade ideal de Cavendish pode ser uma armadilha.

“Não estou dizendo que temos uma Cavendish alternativa para substituir a atual Cavendish, mas que existem outras variedades com diferentes cores, diferentes formatos e diferentes produções que sobreviverão à TR4”, afirma Rony Swennen, professor da Universidade de Leuven que possui o Banco Internacional de Germoplasma da Musa spp, uma coleção com mais de 1,5 mil cultivares de banana. “A questão é se o setor aceitará isso e se os consumidores estarão abertos a outra mudança no sabor?”

Com o avanço da TR4 do mal-do-panamá pela América Latina, logo não teremos escolha.

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