Nosso primeiro exemplo de um animal se locomovendo sozinho
O autor Robert Krulwich escreve sobre a primeira criatura a usar seus próprios músculos para se deslocar de um lugar para o outro.
Eis a pegada de um terráqueo muito, muito longe de casa.
Você conhece a famosa pegada da bota de Neil Armstrong na superfície da Lua: “um avanço gigante”, ele a nomeou. Bem, eis aqui outro avanço – provavelmente tão “gigante”, mas com um toque mais obscuro. Foi descoberta em uma placa de rocha escura localizada no limite do Atlântico Norte, na remota ilha de Newfounland, no Canadá...
É uma pegada deixada por outro terráqueo, um habitante oceânico de aparência estranha que viveu cerca de 565 milhões de anos atrás e que talvez tenha sido a primeira criatura – certamente a primeira que conhecemos – a usar seus próprios músculos para se deslocar de um lugar para o outro.
Nós os chamamos Ediacaranos, ou mais corretamente, ‘organismos ediacaranos’. Eles são uma família estranha, um pouco parecida com flores, alguns com pequenas gotas de lama. Este se parece um pouco com uma folha de palmeira ou talvez uma panqueca com nervuras.
Mas que panqueca! Como Robert Moor descreve em seu novo livro, On Trails: An Exploration, uma dessas coisas
“… fez algo virtualmente sem precedentes neste planeta – tremeu, inchou, lançou-se para frente, comprimiu-se e, ao fazê-lo, a um ritmo imperceptivelmente lento, começou a se mover pelo fundo do mar, deixando um rastro atrás dele.”
O caminho que trilhou aquele dia na lama do oceano – agora congelado e fossilizado – é a trilha mais antiga que já vimos na Terra, ridiculamente pequena em comparação com a jornada de Neil Armstrong, mas é “o começo”, nosso começo, a primeira evidência de locomoção animal.
Um vulcão deve ter expelido lava em uma parte do oceano milhões de anos atrás, congelando todas as criaturas vivas no local, até que a Terra lentamente se deslocou e a camada rochosa veio à superfície, tendo sido posteriormente esculpida e exposta. Então, agora, se você for a Mistaken Point na costa da Terra Nova, poderá ver vários destes vestígios em forma de folha, bolha ou panqueca.
Este é um local famoso, bem conhecido por caçadores de fósseis. Mas, como às vezes acontece de um novo olhar pode encontrar o que ninguém viu e, quando um jovem paleobiólogo de Oxford, Alexander Liu, veio em 2008 e se curvou para observar melhor (este é ele deitado de lado nas pedras, sem sapatos, com calçados para proteger os fósseis)...
… reparou no que, à primeira vista, parecia uma trilha de lodo, um caminho com a largura de um polegar que atravessava a superfície da rocha.
Moor visitou o local mais recentemente e, quando passou os dedos pelo mesmo caminho fóssil (havia vários deles naquelas rochas), escreveu: “Eles carregavam a textura distinta da vida. Sua superfície foi padronizada com uma série de arcos encaixados: ))))))”
Você pode ver isso claramente na extremidade superior, mas também aparecem no meio.
Esses podem ser os vestígios de um pé com sucção que essas criaturas provavelmente usavam para se fixar em pedras ou superfícies planas no fundo do oceano. As anêmonas-do-mar se comportam dessa maneira hoje: elas se agarram a um terreno plano, mas ocasionalmente se soltam e dão grandes “passos” quando precisam se locomover.
Em 2009, Alexander Liu e seus colegas escreveram um artigo sugerindo que essas antigas criaturas não estavam flutuando, se contorcendo, rolando, nem se esticando. Não, elas estavam “rastejando”. Esses foram passos primitivos e é possível ver cada um deles como uma série de parênteses encaixados.
Os críticos disseram que poderiam ser facilmente rastros feitos por pedras lançadas pelas ondas, mas quando especialistas examinaram melhor, a maioria concluiu que Liu está certo. Não são marcas de pedras. São trilhas – nossas primeiras evidências de locomoção, de vida em movimento.
Por que ir a algum lugar?
A pergunta é: por que se dar ao trabalho? Por que se movimentar?
Estavam procurando comida? Procurando sexo? Fugindo de um predador? Ou – e aqui volto a Neil Armstrong – estavam somente passeando, imaginando o que teria depois do próximo monte de areia?
Não havia muita coisa acontecendo no oceano há 565 milhões de anos. A Terra estava se recuperando de um frio extremo que havia deixado o fundo do oceano, como Moor descreve, “desprovido de predadores”, vazio. A mesma coisa para o mar. Não havia muito que olhar: “Talvez uma água-viva primitiva se passasse como uma nuvem viva”.
Sem nenhum motivo para se mexer, penso que talvez o que levou esses pioneiros a viajar foi (como colocar isso?) uma certa inquietação, um comportamento que foi transmitido pela grande corrente da vida enquanto os animais se mudavam em arcas, voavam para o México, viajavam do Canadá até o extremo sul da Argentina, circunavegavam o globo, saíam do planeta e, finalmente, aterrissaram na Lua.
É por isso que, nos movimentamos, acho eu: para ver, para ultrapassar, para ter mais escolhas.
Mas quando Moor faz a mesma pergunta (Por que nós, como animais, nos desenraizamos e vamos para outro lugar?), ele não responde que é por inquietação. As criaturas que inventaram a locomoção, diz o paleobiólogo Liu, provavelmente queriam segurança – uma superfície plana e limpa onde se agarrar. Superfícies racham, mudam. Quando a vida se torna muito difícil onde você está, você vai para onde é mais fácil.
Eles não buscavam uma aventura, buscavam conforto.
As duas explicações parecem opostas, mas não são. Nenhum lugar fica seguro para sempre, nem mesmo o nosso pequeno planeta azul. Em algum momento, seja por inquietação ou desespero – não importa qual – você tem que fazer aquilo que as panquecas inventaram 565 milhões de anos atrás. Não há escolha. A natureza soube disso cedo, então os terráqueos aprenderam isso cedo.
Ou você se move, ou você morre.
Então nós nos movimentamos. E nunca paramos.