Detectadas as primeiras estrelas do Universo? Entenda os fatos

Um novo estudo meticuloso sugere que as ardentes bolas de gás começaram a se formar 180 milhões de anos após o surgimento do cosmos.

Por Nadia Drake
Publicado 1 de mar. de 2018, 16:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma ilustração mostra como poderiam ter sido as primeiras estrelas do universo.
Foto de Ilustração de N.R.Fuller, National Science Foundation

Estrelas são nossas companhias constantes no céu da noite, mas esse mar de luzes cintilantes nem sempre fez parte do cenário do cosmos. Agora, cientistas de olho em um passado remoto sugerem que as primeiras estrelas não começaram a brilhar antes de 180 milhões de anos após o Big Bang, quando o universo como nós o conhecemos explodiu em existência.

Durante décadas, equipes de cientistas têm buscado – na verdade, corrido – para detectar os rastros dessas primeiras estrelas. A nova descoberta, de um projeto chamado EDGES, veio em forma de um sinal de rádio acionado quando a luz dessas estrelas começou a interagir com o gás hidrogênio que preenchia o que antes era espaço vazio.

Uma linha cronológica atualizada do universo mostra as primeiras estrelas surgindo aproximadamente 180 milhões de anos após o Big Bang.
Foto de Ilustração de N.R.Fuller, National Science Foundation

Caso o sinal vença o escrutínio de outros cientistas, a descoberta abre, simultaneamente, uma nova linha de perguntas cosmológicas enquanto oferece alguns mistérios a serem desvendados.

“A era da alvorada cósmica era um território completamente inexplorado até agora”, disse a física Cynthia Chiang da Universidade de KwaZulu-Natal, na África do Sul. “É muito empolgante poder dar uma nova olhada neste pedaço da história do universo, e a descoberta do EDGES é o primeiro passo em direção ao entendimento da natureza das primeiras estrelas em maior detalhe.”

ALVORADA CÓSMICA

Logo após o nascimento do universo, ele se submergiu em escuridão. As primeiras estrelas se acenderam quando gases aquecidos se uniram a aglomerados de matéria escura. Depois, contraíram-se e tornaram-se densas o suficiente para acender os corações nucleares de pequenos sóis.

Quando essas jovens estrelas começaram a lançar luz ultravioleta no cosmos, seus fótons misturaram-se com gás hidrogênio, fazendo com que eles absorvessem radiação e se tornassem translúcidos. Quando isso aconteceu, esses átomos de hidrogênio produziram ondas de rádio que viajaram pelo espaço em uma frequência previsível, ondas que os cientistas podem observar ainda hoje através de radiotelescópios.

O mesmo processo acontece com estrelas atuais enquanto emitem luz no cosmos. Mas as ondas de rádio produzidas por aqueles primeiros suspiros estelares viajam pelo espaço há tanto tempo que foram esticadas, ou deslocados para o vermelho. É assim que os astrônomos identificaram as digitais das primeiras estrelas em ondas de rádio detectadas por uma pequena antena no oeste da Austrália.

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    “A primeira indicação do sinal surgiu dentro de semanas após ligarmos o instrumento em 2015”, disse Judd Bowman, da Universidade do Estado do Arizona, coautor do estudo que apresentou os resultados na revista Nature. “No início, achávamos que se tratava de um problema com o instrumento porque era muito maior do que esperávamos.”

    Bowman e sua equipe passaram os últimos dois anos trabalhando para eliminar qualquer possibilidade de erro que possa imitar um sinal do fim da idade das trevas do universo.

    “Com a conclusão de dezenas de testes, ganhamos a confiança de que era realmente um sinal dos céus”, ele disse. “Mas é importante que outra equipe com um equipamento diferente confirme a descoberta.”

    Chiang, integrante de uma das outras equipes em busca do mesmo sinal, concorda: “Eles sugerem corretamente que o próximo passo seja confirmar a medição com outros experimentos”, ela disse.

    “Este tipo de medição é muito difícil devido a sensibilidade extrema à erros sistemáticos, e a equipe do EDGES fez um trabalho minucioso e impressionante ao investigar pequenos impactos instrumentais.”

    DA LUZ À ESCURIDÃO

    Caso o sinal seja real, ele apresenta um desafio para alguns cientistas que vêm pensando em como o universo funcionava no início. Para começar, a época em que estas primeiras estrelas surgiram alinha-se bem a algumas teorias, mas não bate exatamente com outras.

    “É muito estranho de diversas formas”, diz Steven Furlanetto da UCLA, que estuda como as galáxias se formam e produzem estrelas. “Isso pode ser uma indicação de física exótica, o que seria muito empolgante para muitas pessoas.” Por exemplo, é possível que a descoberta seja um sinal de galáxias se comportando de maneiras inesperadas.

    Em um estudo anterior, Furlanetto e seus colegas começaram com observações reais das mais antigas galáxias conhecidas, e então regressaram o relógio cósmico com modelos computacionais em busca da época em que um sinal das primeiras estrelas poderia aparecer. Acredita-se que as primeiras galáxias do universo eram pequenas, frágeis e não muito boas em originar estrelas, por isso Furlanetto não espera que o sinal aparecesse antes de cerca de 325 milhões de anos depois do Big Bang.

    Mas se as primeiras estrelas já haviam emitido luz suficiente para exibirem sua presença 180 milhões de anos após o Big Bang, essas primeiras galáxias devem estar fazendo algo diferente.

    “A explicação mais simples seria que, no início dos tempos, essas coisas muito pequenas eram capazes de formar estrelas de maneira mais eficiente que em outras épocas”, ele disse. “Isso é dramaticamente diferente do nosso entendimento físico das galáxias.”

    Além disso, o gás hidrogênio está absorvendo os fótons ao menos duas vezes mais rápido que o previsto. Isso é problemático para algumas ideias que temos sobre a temperatura do início do universo. Significa que o gás era mais frio do que o esperado, ou que a radiação era mais quente.

    Curiosamente, um segundo estudo publicado ontem na Nature sugere que interações com matéria escura sejam uma maneira de esfriar o gás a uma temperatura em que ele possa absorver mais fótons.

    A matéria escura constitui a maior parte da massa do universo, mas ela não se comporta como as demais matérias e já se provou difícil de ser compreendida. Ela frequentemente escapa de detecções diretas e cientistas têm dificuldade em dizer, exatamente, o que ela é e como influenciou a estrutura do universo durante o tempo.

    “Seria muito empolgante se esse fosse um sinal de matéria escura, e não é impossível”, diz Tracy Slatyer, do MIT.

    Mas ela observa que ainda é muito cedo para essa conclusão. Uma possibilidade alternativa é a de que existam simplesmente mais fótons para o gás hidrogênio absorver, apesar de não ser óbvio de onde viriam todos esses fótons no início do universo. Assim, ela e outros ainda esperam por uma confirmação independente do resultado do EDGES antes de mergulharem fundo nos possíveis cenários de matéria escura.

    “Eu ficarei mais confortável depois de ter a chance de pensar em como isso se encaixa nos conceitos que temos sobre matéria escura e galáxias”, disse Furlanetto. “Por ser tão incomum em comparação às nossas expectativas, me preocupo que seja algo totalmente não relacionado. Eu não faço ideia do que poderia ser.”

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