Não é exclusividade dos mamíferos: algumas aranhas também amamentam

Embora a lactação e a amamentação sejam mais comumente associadas a mamíferos, alguns outros animais — como estas aranhas saltadoras — fazem a mesma coisa.

Por Jason G. Goldman
Publicado 5 de dez. de 2018, 17:15 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um grupo de filhotes de aranhas, com três dias de idade, pode ser visto embaixo de ...
Um grupo de filhotes de aranhas, com três dias de idade, pode ser visto embaixo de sua mãe em seu ninho do laboratório.
Foto de Rui-Chang Quan

ZEBRAS, MORCEGOS e ursos fazem isso, além das baleias, tigres e seres humanos. Todos esses animais alimentam as crias recém-nascidas com leite. É uma característica que define o que significa ser um mamífero.

Segundo estudo publicado no periódico Science, uma aranha saltadora nativa do sudeste da Ásia faz a mesma coisa. Descobriu-se que a Toxeus magnus amamenta sua prole com um fluido nutritivo secretado por seu próprio corpo. O líquido contém uma solução de açúcares, gorduras e proteínas, de modo que os pesquisadores, liderados por Rui-Chang Quan, biólogo de conservação da Academia Chinesa de Ciências, estão chamando o fluido de leite.

Talvez o mais surpreendente seja que os pesquisadores constataram que os filhotes de aranhas continuam a beber o leite de sua mãe mesmo após alcançar a maturidade sexual. “Isso é superestranho”, afirma Jonathan Pruitt, ecologista evolucionário da Universidade McMaster, no Canadá. “O fato de o cuidado da mãe se estender até a cria da fêmea chegar à idade adulta é bem surpreendente, é algo de arregalar os olhos”.

As implicações evolucionárias desse comportamento também estão fazendo olhos arregalarem.

Um grupo de filhotes de aranhas, com três dias de idade, pode ser visto embaixo de sua mãe em seu ninho do laboratório.
Foto de Rui-Chang Quan

Bons pais

A ideia de leite de aranha, embora bizarra, na verdade é razoavelmente coerente com o que se sabe sobre a maternidade das aranhas.

Apesar de sua reputação como criaturas solitárias, diversos tipos de aranhas cuidam de suas crias. “Muitas aranhas fêmeas fazem a guarda de suas bolsas de ovos e deixam de comer enquanto fazem isso”, afirma Pruitt, que estuda o comportamento social de aranhas. “Algumas aranhas abrem as bolsas de ovos e deixam sua prole subir em suas costas.

Outras fêmeas inclusive regurgitam alimento pré-digerido para seus filhotes, assim como fazem as aves. Pruitt acrescenta que algumas aranhas mães vão tão longe a ponto de liquefazer seu próprio corpo para ser consumido pelos filhotes.

Contudo essa é a primeira vez que se observaram aranhas amamentando a cria com fluido semelhante ao leite.

Tem leite?

“Se o leite, em sua vaga definição, consiste em uma substância nutritiva que alimenta os filhotes, então seria considerado leite”, confirma Amy Skibiel, fisiologista de lactação da Universidade de Idaho.

Uma fêmea de Toxeus magnus prepara o ninho na natureza.
Foto de Rui-Chang Quan

“Quando se pensa em outros animais não mamíferos que produzem fluidos semelhantes ao leite, de fato fica um pouco menos surpreendente”, afirma Skibiel. Algumas aves, como pombos, rolinhas, flamingos e pinguins, produzem uma substância derivada de células epiteliais chamada de “leite de papo”, que alimentam seus filhotes. E sabe-se que baratas secretam um tipo de leite, que usam para nutrir embriões em desenvolvimento.

No caso da Toxeus magnus, entretanto, Quan e sua equipe argumentam que o comportamento das aranhas é mais parecido com a lactação dos mamíferos. Como inúmeros mamíferos, os filhotes de aranhas recém-eclodidos dependem totalmente do leite para satisfazer suas necessidades nutricionais, neste caso, durante os primeiros 20 dias de vida das jovens aranhas.

Em um experimento ilustrativo, os pesquisadores fecharam com cola o sulco epigástrico das aranhas mães, o órgão que bota os ovos e que também secreta leite. Todos os filhotes morreram nos primeiros 11 dias.

Adolescentes lactantes

Até depois que os filhotes têm idade o suficiente para encontrar alimento por si mesmos, os pesquisadores descobriram que os filhotes de aranhas continuam a se alimentar do leite da mãe por mais 20 dias. E as filhas (mas não os filhos) podem continuar a mamar até depois de alcançar a maturidade sexual.

Nos estágios adolescente e adulto, a privação de leite forçou simplesmente as aranhas a passar mais tempo à procura de alimento, indicando que o leite não era mais essencial a sua sobrevivência. Ainda assim, os pesquisadores suspeitam que, na natureza, a disponibilidade do leite poderia afetar favoravelmente a sobrevivência, já que procurar alimento fora do ninho aumenta o risco de predação.

No entanto, embora o leite possa ser essencial a certos estágios da vida, não é o único fator influenciador nesse caso. Ao que parece, o cuidado materno e o fornecimento do leite atuam juntos para garantir a sobrevivência das jovens aranhas em longo prazo. Em experimentos em que a mãe podia permanecer no ninho, mas era impedida de amamentar os filhotes após o 20o dia, os filhotes de aranhas ainda tinham menos parasitas que os de ninhos onde a mãe era retirada completamente.

Dos 187 filhotes de aranhas observados pelos pesquisadores em 19 ninhos diferentes, a taxa de sobrevivência daqueles que receberam tanto o cuidado materno quanto o leite foi de 76 por cento. Retirar a mãe no 20o dia reduziu a taxa de sobrevivência dos filhotes de aranhas para aproximadamente 50 por cento.

Leite derramado

Como as aranhas mães também depositam gotículas de leite no próprio ninho, isso sugere que o leite possa ter uma função além da nutrição. “Ainda restam perguntas sem resposta que nos ajudariam a determinar se isso é funcionalmente análogo à lactação dos mamíferos”, conta Skibiel.

Nos mamíferos, a princípio, o leite provavelmente não evoluiu pela nutrição. Pelo contrário, é mais provável que a lactação fosse um meio para as mães ativarem os sistemas imunes dos filhotes, fornecendo-lhes anticorpos ou um meio para manter os ovos úmidos, como fazem os ornitorrincos.

E, embora a evolução do leite na forma de fluidos fora da família dos mamíferos permaneça rara, também é improvável que esta seja a única espécie de aranha que faça uso dele. “Quanto mais eu reflito, mais acredito que haja realmente uma chance muito boa de que isso ocorra de forma generalizada”, afirma Pruitt. “Das 50 mil espécies de aranhas descritas, pode apostar que essa não é a única que faz isso”.

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