Nova espécie de cobra descoberta no estômago de outra serpente

A “misteriosa cobra-jantar” tem hábitos estranhos, incluindo propensão a esconder-se.

Por Jake Buehler
Publicado 2 de jan. de 2019, 20:40 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
A cobra-coral da América Central (Micrurus nigrocinctus) normalmente se alimenta de outras serpentes menores, incluindo a ...
A cobra-coral da América Central (Micrurus nigrocinctus) normalmente se alimenta de outras serpentes menores, incluindo a espécie recém-descoberta que ainda não foi encontrada na natureza.
Foto de Matthieu Berroneau

CIENTISTAS DESCOBRIRAM uma espécie de cobra nunca vista anteriormente, mas essa serpente especial não foi encontrada deslizando em seu habitat florestal no tropical México. O animal recém-descoberto fez sua estreia científica em um lugar um pouco menos convencional: dentro do estômago de outra cobra.

Descrita recentemente em um novo artigo na revista científica Journal of Herpetology, a criatura foi adequadamente apelidada de Cenaspis aenigma, que significa “misteriosa cobra-jantar.” O nome vem do latim cena (jantar), aspis (uma espécie de cobra) e enigma.

Representação da nova espécie, Cenaspis aenigma, que significa “misteriosa cobra-jantar.”
Foto de Illustration by Gabriel Ugueto

Essa espécie apresenta características únicas que a separa de seus parentes, incluindo o formato de seu crânio, a cobertura de seu hemipênis—sua estrutura reprodutiva—e as escamas na parte inferior de sua cauda.

Escondendo-se na natureza

Com base em determinadas características de seu esqueleto e dentes, os cientistas acreditam que a Cenaspis seja uma cobra que vive no subsolo que provavelmente se alimenta de insetos e aranhas. No entanto, o incrível é que o animal nunca foi encontrado vivo—então é difícil saber exatamente o que come ou como vive, diz Jonathan Campbell, herpetologista na Universidade do Texas, em Arlington, que liderou a equipe de pesquisa.

Observe que a cobra evitou ser detectada durante 42 anos. Em 1976, no estado de Chiapas, sul do México, coletores de palmeiras que trabalhavam nas profundezas de uma das florestas da região encontraram uma cobra-coral da América Central—uma espécie que exibe cores vibrantes com veneno neurotóxico. Quando os pesquisadores a obtiveram, descobriram que sua última refeição havia sido uma serpente menor.

Essa cobra macho que media 25 centímetros era algo especial, pois não correspondia a nenhuma espécie conhecida, então o espécime foi preservado em uma coleção de museu. A equipe de pesquisa voltou à região pelo menos mais uma dúzia de vezes por várias décadas, mas nunca encontrou um representante vivo da estranha espécie de cobra.

Um vislumbre de alguns dos mais de 200 mil anfíbios e répteis abrigados no Centro de Pesquisa de Diversidade de Anfíbios e Répteis da Universidade do Texas, em Arlington.
Foto de Carl J. Franklin

 

“Isso fornece provas de como algumas cobras podem ser secretas,” diz Campbell. “Combine seus hábitos esquivos com intervalos restritos e algumas cobras não aparecem com frequência.”

Campbell não acha que o desaparecimento da cobra seja devido a uma extinção após a década de 1970. Em vez disso, ele acredita que a Cenaspis ainda esteja em algum lugar em Chiapas, mas um estilo de vida no subsolo combinado a outros hábitos secretos pode dificultar que seja encontrada.

Características estranhas

A parte inferior do animal apresenta três séries de manchas triangulares que formam listras irregulares; pouquíssimas cobras do continente têm listras semelhantes. Também possui 14 dentes curtos e fortes na mandíbula superior; a maioria dos membros de sua família tem mais ou menos que isso.

Mas o hemipênis da Cenaspsi é sua característica mais bizarra. A maioria de seus parentes apresenta hemipênis adornado com espinhos na estrutura do órgão, alguns decorados com estruturas semelhantes a taças, chamadas de cálices, em suas extremidades. O membro da nova espécie não possui espinhos e é totalmente coberto por cálices, que o faz parecer um tipo de favo de mel de outro mundo.

A cobra é única o bastante para se qualificar não apenas como uma nova espécie, mas também como um novo gênero (que é um grupo de espécies intimamente relacionadas—por exemplo, o gênero Canis inclui Canis lupus, o lobo-cinzento, mas também inclui outros animais, como coiotes e chacais).

Sara Ruane—herpetologista e bióloga evolucionista na Universidade Rutgers-Newark, que não participou do estudo—está impressionada com a descoberta.

“Essa é uma excelente contribuição para a herpetologia e nos faz lembrar que nunca se sabe quais novas informações podem ser obtidas ao realizar coletas de campo e analisar com mais atenção o que já temos em museus—e por que essas coleções são importantes,” diz Ruane.

Kevin de Queiroz—zoologista e curador da coleção de anfíbios e répteis no Museu Nacional de História Natural do Instituto Smithsoniano—concorda.

“É sempre interessante descobrir uma nova espécie para a ciência, ainda mais quando parece que ela não está especialmente relacionada a nenhuma outra atualmente conhecida.”

Ruane e de Queiroz não estão surpresos que foi uma cobra-coral que localizou a desafortunada Cenaspis antes que pesquisadores humanos o fizessem. Esses animais são especialistas em caçar e se alimentar de pequenas cobras, e a Cenaspis não é a primeira espécie a ser descoberta dentro de uma coral; já aconteceu algumas vezes antes. Mas até onde Campbell sabe, “essa é a primeira vez que um novo gênero foi descoberto dentro do estômago de uma cobra-coral.”

Embora pouco se saiba sobre a biologia da “cobra-jantar,” a estranha descoberta estilo boneca russa da espécie nos traz uma lição importante sobre a biodiversidade do mundo, muita da qual permanece oculta e não reconhecida.

“[A descoberta] nos mostra que provavelmente ainda há espécies de cobras neotropicais a serem descobertas que estão relativamente isoladas, do ponto de vista evolutivo,” conta de Queiroz.

Para Campbell, a singularidade da Cenaspis sugere que seu habitat também seja especial e insubstituível—e digno de ser considerado uma reserva ou área protegida. 

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