O Sol continua sendo um mistério ardente, mas isso pode estar prestes a mudar

O histórico lançamento da nova sonda europeia Solar Orbiter ajuda a fomentar um período áureo de conhecimento sobre nossa estrela mais próxima.

Por Nadia Drake
Publicado 18 de fev. de 2020, 17:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma ilustração mostra a Sonda Solar Orbiter, da ESA, de frente ao Sol durante seu voo ...
Uma ilustração mostra a Sonda Solar Orbiter, da ESA, de frente ao Sol durante seu voo mais próximo à estrela.
Foto de Illustration by ESA/ATG medialab

Mesmo que o Sol arda em nossos céus diariamente, os humanos viram a gigantesca estrela apenas de uma perspectiva: de frente, por dentro do plano dos planetas. A sonda Solar Orbiter, ou SolO, foi lançada pela Agência Espacial Europeia e está prestes a mudar isso, pois é projetada para executar um reconhecimento detalhado do Sol que permitirá observar as regiões, anteriormente ocultas, dos polos da estrela.

A partir dessa exclusiva posição estratégica, o conjunto de dez instrumentos da SolO auxiliará na descoberta de como a estrela emite as correntes de partículas energéticas, chamadas de ventos solares, por todo o nosso sistema planetário. Também ajudará a responder o que controla o ciclo magnético do Sol, que dura 11 anos e varia em intensidade, criando flutuações imprevisíveis na atividade solar.

“Fundamentalmente, não entendemos isso de fato,” afirma Daniel Müller, que trabalha na ESA como cientista do projeto SolO. “Com sorte, preencheremos essa lacuna com a sonda Solar Orbiter.”

Desvendar esses fatores não é simplesmente uma questão acadêmica, visto que pode melhorar a segurança pública na Terra. As mudanças do fator de atividade magnética solar na forma de erupções solares poderosas e energéticas podem causar o desligamento de redes de energia, derrubar satélites e ser letais para os seres humanos no espaço sideral. No momento, não conseguimos prever direito quando ou com que intensidade essas erupções afetarão o planeta.

“A compreensão desses processos fundamentais e físicos que ocorrem na região interna da atmosfera solar realmente nos ajudará”, diz Holly Gilbert, cientista do projeto da Nasa para a SolO.

A SolO está sendo lançada durante um momento em que o monitoramento solar está especialmente em alta. Este é apenas um dos vários novos projetos instituídos para observação do Sol, oferecendo oportunidades para uma exploração científica ainda mais robusta de nossa estrela local.

Esta foto tirada pelo Telescópio Solar Daniel K. Inouye, e divulgada em fevereiro de 2020, é a imagem de maior resolução já obtida da superfície solar. Ela mostra as enormes estruturas celulares criadas pelos movimentos violentos à medida que o calor interno da estrela é transportado para cima.
Image by NSO, Nsf, Aura

“Agora é um bom momento para ser um heliofísico”, relata Nicola Fox, diretora da divisão de heliofísica da Nasa. “Ter esse tipo de esforço coordenado propicia grandes mudanças na quantidade de ciência que se pode fazer.”

O período áureo de estudo do Sol

Você deve ter reparado que Sol está super em alta ultimamente. Alguns dias atrás, o Telescópio Solar Daniel K. Inouye, ou DKIST, divulgou uma impressionante imagem aproximada da superfície solar. No formato de vídeo, essas imagens revelam que a camada mais externa do sol é uma superfície de retalhos que borbulha lentamente, com células plasmáticas do tamanho do estado do Texas.

Além disso, em dezembro, a Sonda Parker Solar da Nasa publicou a primeira de suas observações coletadas durante a órbita extremamente próxima ao Sol. Esta semana, uma edição especial da revista científica The Astrophysical Journal publicou quatro dúzias de estudos adicionais sobre a missão. Entre as valiosas descobertas, estão as primeiras observações de ondas magnéticas “rebeldes”, a primeira sugestão de um ambiente livre de poeira imediatamente ao redor do sol, o primeiro vislumbre de uma ejeção primitiva de partículas e a impressionante descoberta de que os ventos solares aceleram lateralmente bem mais rápido do que o esperado, o que pode afetar a evolução estelar de forma drástica.

A Sonda Parker Solar está fazendo essas observações à medida que mergulha na coroa solar, um manto misterioso de gás e partículas superaquecidas a milhões de graus. Ao longo de sua jornada de sete anos, ela se aproximará cada vez mais do Sol durante cada órbita, até chegar a 6,4 milhões de quilômetros da superfície ardente de nossa estrela.

A Sonda Parker Solar poderá se associar à nova espaçonave SolO, apesar de que esta última não chegará tão próximo do Sol quanto a primeira.

Após o lançamento da SolO, ela passará pela Terra e Vênus, capturando uma ajuda gravitacional dos planetas, que a lançarão mais perto do Sol. Nos próximos cinco anos, a gravidade de Vênus impulsionará a sonda para uma órbita que permitirá a observação dos polos solares, com estimativa de obtenção das primeiras imagens em 2025.

“Cada órbita ficará cada vez mais alta, então, de certa maneira, estamos desembrulhando as regiões polares, pouco a pouco”, conta Gilbert.

Juntas, o par de naves compilará observações de alta resolução sobre o que poderia ser o ambiente mais dinâmico e extremo do sistema solar. Orbitando o Sol em conjunto, as duas espaçonaves observarão como o vento solar primitivo, ou as partículas exaladas incessantemente pelo Sol, evolui à medida que se espalha pelo sistema solar. E a SolO possui uma câmera integrada que pode capturar imagens dos locais pelos quais a Sonda Parker Solar está sobrevoando.

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“Será realmente uma grande sinergia”, diz Gilbert. “Isso nos dará a informação contextual e, em seguida, a Parker estará lá, medindo o plasma real à medida que a Orbiter [SolO] faz as imagens.”

À medida que os dois orbitadores “tocam” o Sol, o DKIST — de seu cume havaiano no topo de Haleakalā, em Maui — verá a superfície solar em mais detalhes do que qualquer uma das referidas naves. Isso se deve em parte ao seu espelho de cerca de 4 metros, que é muito maior do que o do Telescópio Espacial Hubble.

“As coisas que o DKIST pode fazer, nunca poderíamos fazer do espaço”, afirma Müller. “Ele possui uma resolução sem precedentes na parte visível do espectro.”

Não é por acaso que o Sol finalmente está tendo a oportunidade de brilhar, diz Kelly Korreck, heliofísica do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics e uma das principais pesquisadoras de um dos instrumentos a bordo da Sonda Parker Solar. Esses novos observatórios, terrestres e espaciais, são frutos de décadas de planejamento e desenvolvimento tecnológico, sem os quais essas explorações seriam impossíveis.

“A tecnologia foi aprimorada”, diz Korreck, “e agora podemos realizar algumas dessas missões mais ousadas e legais.”

Ciência de assinatura da SolO

Enquanto isso, as observações polares da SolO poderiam adicionar uma peça importante que estava faltando no quebra-cabeças do ciclo magnético solar. Os cientistas sabem há anos que a atividade do Sol diminui e aumenta ao longo de um período de 11 anos — mas as teorias que descrevem como isso funciona nunca foram capazes de corresponder às observações físicas. Uma das razões dessas surpresas, diz Müller, é que faltam dados detalhados sobre as regiões polares do Sol. Em meados dos anos 90 e início dos anos 2000, a sonda Ulysses obteve um vislumbre dos polos solares, apesar de muito distante e sem uma câmera a bordo.

“Simplesmente não sabemos como são os polos e realmente achamos que precisamos desses dados para desvendar alguns dos mistérios do ciclo magnético”, diz Müller. “Esse tem sido nosso ponto cego.”

Com uma visão global mais abrangente, os cientistas devem ser capazes de aprofundar verdadeiramente na complexidade desses ciclos magnéticos e na forma como a energia se manifesta na superfície da estrela. Os anéis e ondas magnéticas têm a capacidade de ser extremamente potentes, com as recém-descobertas “ondas rebeldes” possivelmente explicando o mistério de por que a coroa é mais quente que a superfície do Sol.

Os anéis, que se erguem bem acima da superfície do Sol, costumam ser os locais onde surgem as erupções solares. Ocasionalmente, essas explosões lançam partículas supersônicas e sobrecarregadas de partículas no espaço, chamadas de ejeções de massa coronal, ou EMCs. Se uma dessas rajadas se aproximar da Terra, pode ser catastrófico.

Em 1859, uma EMC particularmente poderosa derrubou telégrafos e iluminou os céus da Terra com auroras tão brilhantes que imitavam a luz do dia. Agora chamado de Evento de Carrington, esses tipos de ocorrências do clima espacial são exatamente o que os cientistas esperam prever com a maior antecedência possível.

Avisando com antecedência, satélites e redes de energia vulneráveis podem ser desativados proativamente e qualquer humano que esteja em órbita ou no espaço sideral pode se proteger.

“Podemos mitigar isso, mas realmente precisamos entender quando o Sol estará ativo e como isso interagirá com a magnetosfera da Terra”, diz Korreck. “À medida que nossa comunicação se torna cada vez mais dependente dos satélites, que vamos para a Lua e Marte e nos tornamos pessoas que viajam pelo espaço, precisamos realmente entender os perigos para a tripulação e para nossos próprios bens eletrônicos no espaço.”

Além disso, uma compreensão mais íntima de como o Sol funciona pode ajudar a informar as perspectivas de vida em planetas que orbitam estrelas semelhantes à nossa.

“A outra coisa que acho muito legal é o simples fato de ser uma estrela”, revela Fox. “Estamos aprendendo como uma estrela funciona e isso tem aplicações para outras delas em diferentes sistemas estelares.”

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