Fast-food aumenta exposição a substância química permanente chamada PFAS

Utilizada em embalagens, essas duradouras substâncias podem se infiltrar nos alimentos e se acumular em nossos corpos.

Por Sarah Gibbens
Publicado 14 de out. de 2019, 07:00 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma máquina de hambúrgueres em uma fábrica de empacotamento em Amarillo, Texas. Hambúrgueres de fast-food como ...
Uma máquina de hambúrgueres em uma fábrica de empacotamento em Amarillo, Texas. Hambúrgueres de fast-food como esses geralmente acabam em embalagens recobertas com uma substância que se revelou nociva aos consumidores.
Foto de Brian Finke, Nat Geo Image Collection

DE CALORIAS a aditivos, há inúmeras razões pelas quais comer fast-food não é saudável, mas um novo estudo sobre uma substância tóxica chamada PFAS revela que as embalagens com essa substância também podem estar nos fazendo mal.

PFAS, ou substâncias perfluoroalquiladas e polifluoroalquiladas, referem-se a uma classe de produtos químicos utilizados abundantemente em produtos domésticos comuns para torná-los impermeáveis ou não inflamáveis. Um novo estudo publicado no periódico Environmental Health Perspectives analisou os níveis de PFAS em pessoas que comeram fast-food comparado a pessoas que se alimentaram de refeições caseiras.

Utilizando dados da National Health and Nutrition Examination Survey (NHNES) do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), um banco de dados abrangente e regularmente mantido, os pesquisadores analisaram o PFAS em amostras sanguíneas coletadas de mais de 10 mil pessoas entre 2003 e 2014.

Foram encontrados cinco tipos comumente utilizados de PFAS no sangue de cerca de 70% dos participantes pesquisados.

A pesquisa ainda perguntou às pessoas com que frequência haviam comido fast-food nas últimas 24 horas, na última semana e no último mês.

Após um período de 24 horas, aqueles que haviam consumido fast-food continuamente apresentaram um aumento na quantidade de PFAS no sangue. Ao contrário dos demais contaminantes comuns que passam pelo corpo humano rapidamente, o PFAS pode levar anos para ser eliminado, o que significa que o consumo regular de fast-food acrescenta mais PFAS ao organismo, afirmam os cientistas.

Polêmico e abundante

Não se sabe ao certo a partir de que quantidade o PFAS começa a prejudicar a saúde humana. Uma série de estudos relacionou a substância a câncer, distúrbios da tiroide, alterações hormonais e ganho de peso.

O estado de Washington e a cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, aprovaram leis que limitam o uso de PFAS em recipientes de alimentos.

Um estudo de 2017 conduzido em 400 embalagens e recipientes de fast-food constatou que mais da metade dos materiais utilizados para embrulhar pães e sobremesas continha o composto de flúor. A substância também estava presente em quase 40% dos materiais utilizados para embrulhar sanduíches e hambúrgueres e 20% dos materiais de papel-cartão, os recipientes rígidos utilizados para servir batatas fritas. A substância geralmente é adicionada para formar uma barreira nas embalagens por ser resistente à gordura e à água, facilitando o transporte de alimentos.

Pois são essas mesmas propriedades de resistência que preocupam aqueles que estudam os efeitos do PFAS no corpo.

“Ainda estamos verificando os eventuais efeitos à saúde com níveis de exposição cada vez menores”, afirma Laurel Schaider, autora do estudo, química e engenheira ambiental do Instituto Silent Spring.

“Os alimentos são apenas uma das fontes de exposição”, afirma ela, destacando que o PFAS é comumente encontrado em tintas, carpetes e vestuário. “Neste momento, eu diria que faz sentido tentar reduzir a exposição, mas não podemos correlacionar uma determinada taxa de consumo de fast-food a efeitos prejudiciais à saúde.”

Ela afirma que a ingestão regular de PFAS pode surtir efeitos cumulativos na saúde humana.

O PFAS é tão famoso por sua incapacidade de se degradar que os seus compostos são geralmente chamados de “substâncias permanentes”. Enquanto outros contaminantes como o bisfenol-A são eliminados do corpo em algumas horas, até mesmo o PFAS menos potente pode permanecer meses.

Por que não sabemos o que não sabemos?

Demonstrar um impacto mensurável na saúde de uma pessoa que come cinco cheeseburgers contaminados com PFAS por semana em vez de apenas um é difícil porque as substâncias estão espalhadas por toda parte.

Para identificar o impacto que uma substância química pode ter, os cientistas primeiro contam com estudos em que animais de laboratório, como ratos e camundongos, são expostos a diversos graus de uma determina toxina. Estudos realizados com animais demonstraram que a exposição contínua ao PFAS resulta em danos ao fígado, rins e sistema imune. Tumores também são comuns e algumas classes de PFAS possivelmente causam câncer e distúrbios na tiroide.

Os cientistas também procuram tendências em doenças no nível populacional. Para tanto, são necessários grandes grupos de estudos formados por milhares de pessoas para o controle apenas do PFAS.

Foram necessárias dezenas de estudos populacionais para demonstrar que a exposição ao chumbo antes da idade adulta poderia afetar o desempenho cognitivo posteriormente na vida, uma descoberta que ajudou a estabelecer regulamentações mais rígidas referentes ao uso do chumbo. Os cientistas ainda não chegaram a um consenso sobre o bisfenol-A (ou BPA), substância que a FDA (Agência de Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos) considera segura, mas que algumas pesquisas indicam ser um possível disruptor endócrino.

Janela de exposição

Os níveis de exposição de uma pessoa ao PFAS podem variar muito, afirma Schaider, o que torna difícil para os cientistas formarem um retrato histórico de quando foi consumido o contaminante.

“Há janelas de suscetibilidade para algumas doenças, mas é muito difícil, quando se estuda adultos, voltar no tempo e recriar suas exposições”, explica ela.

Rolf Halden é diretor do Centro de Engenharia de Saúde Ambiental da Universidade Estadual do Arizona. Ele afirma que os dados do estudo mostram uma nítida relação entre fast-food e consumo de PFAS, mas ele está mais preocupado com a abundância generalizada de PFAS em bens de consumo.

“Estou menos interessado no aspecto da pipoca e do fast-food e mais intrigado por constatar que 70% da população dos Estados Unidos está exposta a substâncias químicas que não se degradam”, afirma ele.

Além das consequências desconhecidas à saúde de consumir alimentos contaminados com PFAS, Schaider afirma que os consumidores deveriam estar preocupados com o impacto do PFAS na natureza, ao ser descartado. Em aterros não impermeabilizados, o PFAS pode se infiltrar no lençol freático. No início deste mês, um relatório do Grupo de Trabalho Ambiental descobriu que a água proveniente do abastecimento público que chega a 7,5 milhões de californianos apresentou um resultado positivo para o contaminante.

Além de Washington e São Francisco, os estados da Califórnia, Nova York e Rhode Island propuseram, cada um, restrições ao PFAS. No mês passado, a Dinamarca foi o primeiro país a bani-lo das embalagens de alimentos.

Em relação aos resultados do estudo, Halden acrescenta: “Seria ingenuidade pensar que a exposição total ao PFAS se limita a isso. A exposição total é muito maior e ainda está ficando mais complexa.”

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