Dança de salão: de passatempo da elite para mania mundial

Valsa, tango e foxtrot. Esses movimentos icônicos – e por vezes escandalosos – inspiraram novas gerações de dançarinos a se conhecerem, misturarem e improvisarem.

Por Erin Blakemore
Publicado 14 de out. de 2022, 10:33 BRT

Dançarinos curtindo no Savoy Ballroom, no Harlem, Nova York (EUA), em 24 de abril de 1953. O bairro testemunhou uma explosão de expressão cultural no início do século 20 e deu origem ao lindy hop, que ainda hoje é popular entre os dançarinos de swing.

Foto de Hans von Nolde AP

A pista de dança é estimulante, um lugar onde as pessoas se encontram, se misturam e, às vezes, se exibem em danças sociais como o tango, o foxtrot ou o jitterbug.

Embora os salões de baile antigamente tenham sido território da elite e considerados proibidos para as pessoas comuns, na revolta do século 19 nasceram novos tipos de passos de baile – democratizando as pistas e influenciando todo o mundo. Aqui a história de como começaram alguns dos movimentos mais famosos – e como foram transmitidos aos dançarinos modernos.

La valse à Mabille, 1870. A chegada da valsa escandalizou os conservadores do século 19, pelo fato de encorajar os dançarinos a se abraçarem. Antes da valsa, o mais próximo que eles dançavam era de mãos dadas.

Foto de Fine Art Images Heritage Images, Getty Images

Valsa

Aos olhos modernos, a valsa – com seu ritmo cadenciado em ¾ e suas variações elegantes como o chassé de passos longos e a perseguição, em que uma dançarina “persegue” seu parceiro – pode parecer um símbolo de status ultrapassado, que incorpora riqueza e refinamento. Mas, na verdade, este baile de salão por excelência tem suas raízes nas classes mais baixas.

É o passo de dança mais antigo reconhecido na competição de salão moderna, e surgiu das danças de namoro dos plebeus na Alemanha e na Áustria do século 18. Seu nome deriva do termo alemão walzen, que significa “girar”. A dança desafiou os costumes sociais da classe alta com seus movimentos livres. Quando os aristocratas perceberam os movimentos de dança de seus criados observando suas festas indisciplinadas, eles os experimentaram – e gostaram.

Ao contrário do minueto, cuidadosamente coreografado e distante, e popular na época, a valsa permitia um contato mais próximo entre os parceiros e também dava lugar à improvisação – que logo levou à criação dos salões de dança públicos no final do século 18 e início do século 19. Lá, as pessoas podiam se misturar com estranhos e rodopiar a noite toda ao som de compositores como Johann Strauss. Como observa a historiadora Ruth Katz, a valsa ofereceu uma chance de liberdade, romantismo e mistura social entre as classes alta e baixa. 

O movimento foi tão popular que provocou uma mania no século 19, apesar das advertências de que era muito sensual ou frívolo. “A valsa não apenas possibilitou que diferentes tipos de indivíduos se reunissem em bases igualitárias, mas também possibilitou uma espécie de 'fuga' da realidade através da emocionante vertigem de girar em um mundo privado de sensualidade”, escreve Katz.

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    O lendário dançarino de salão Vernon Castle levanta sua esposa e parceira igualmente icônica Irene enquanto dançam diante de um grande espelho em um estúdio de dança em Nova York, em 1914. Os movimentos elegantes desta dupla inspiraram uma legião de dançarinos a adotar o foxtrot.

    Foto de Dietz FPG, Getty Images

    Foxtrot

    Os salões de dança surgiram primeiramente em Viena (Áustria), mas rapidamente se espalharam pelo mundo. Tanto públicos quanto particulares, eles ofereciam aos participantes a chance de se soltar, provocando uma mania de dança e uma explosão de novas formas de baile social. 

    No início do século 20, os casais inventaram “danças de animais” com nomes extravagantes como o Bunny Hug, o Grizzly Bear e o Turkey Trot, que muitas vezes eram tocados ao som do ragtime, um precursor do jazz interpretado por artistas e compositores negros. 

    Com seus ritmos sincopados, o ragtime deu origem ao foxtrot, um passo lento-lento-rápido-rápido que levava os dançarinos pela pista em pernadas longas e estilosas. Ele ganhou fama com Irene e Vernon Castle, dois dançarinos de salão conhecidos por seus passos glamorosos e leves. 

    Com a ajuda do cinema mudo e da mídia de massa, os Castle se tornaram nomes conhecidos, e os dançarinos imitavam suas roupas, cabelos e movimentos de dança. Quando Vernon Castle morreu tragicamente em um acidente de avião durante a Primeira Guerra Mundial, o foxtrot se tornou um padrão estabelecido nas pistas de dança ao redor do mundo.

    Rudolph Valentino dançando tango com a dançarina espanhola Beatrice Dominguez em frente a uma sala cheia, em uma cena do filme de 1921, Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse. O filme contribuiu para acender a mania do tango.

    Foto de Metro Pictures Getty Images

    Tango

    Outra febre do início do século 20 buscou inspiração na Argentina. Originado na década de 1880 nos cortiços das empobrecidas cidades portuárias do país sul-americano, o tango misturava aspectos da dança africana e europeia. Este baile sensual também aproximava escandalosamente os dançarinos – o que excitava o público e violava as normas sociais. 

    Na Argentina dominada por homens, geralmente era praticada por dois homens de forma particular e, portanto, tornou-se um bastião da cultura gay, segundo conta ao QZ o professor de tango e historiador Michael Trenner. Em seguida, espalhou-se para Paris e Londres, provocando uma “mania de tango” que acabou chegando às costas americanas.

    Nos loucos anos 1920, o tango era conhecido mundialmente, em parte graças ao filme de 1921 Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse, no qual o galã Rudolph Valentino dançava com a dançarina espanhola Beatrice Dominguez. A dança deu a homens e mulheres uma chance sem precedentes de mover seus corpos em ritmos eróticos cujo drama encantou tanto os dançarinos quanto o público.

    Lee Moates e Tonita Malau mostram seus passos de dança vencedores durante um concurso de lindy hop no Savoy Ballroom do Harlem, em 24 de abril de 1953. Este estilo de dança surgiu décadas antes durante a Grande Depressão, quando maratonas de dança ofereciam oportunidades de disputar prêmios em dinheiro.

    Foto de Hans von Nolde AP

    Lindy hop

    Hollywood ofereceu aos espectadores a chance de ver dançarinos profissionais como Fred Astaire e Ginger Rogers apresentando versões sofisticadas e glamourosas de danças sociais. Mas os dançarinos amadores não buscavam inspiração apenas na tela: a cultura negra influenciou profundamente a dança de salão americana e deu origem a um dos estilos de dança mais famosos do século 20, o lindy hop.

    Este estilo alegre nasceu de outra moda, a maratona de dança. Nas décadas de 1920 e 1930, os dançarinos da era da Depressão tentaram estabelecer recordes para as danças mais longas, dançando na pista por horas e até dias ou meses enquanto disputavam prêmios em dinheiro e fama. “Quanto maior o número de horas que o concurso estava em movimento, maior era a aposta”, escreve a historiadora de dança Carol Martin.

    Em 1928, George “Shorty” Snowden e sua parceira Mattie Purnell participavam de uma maratona de dança de 68 horas no Harlem, quando perderam a pegada das mãos um do outro, violando uma regra da competição. Para encobrir a gafe, Snowden fez um rápido trabalho de pés, depois puxou Purnell de volta para ele pela mão. 

    A inovação agradou ao público e, embora não esteja claro quem a nomeou. O eventual título da dança foi uma homenagem a Charles Lindbergh, o aviador que na época era famoso por suas aventuras aéreas. 

    Apelidada de lindy hop, a dança também foi chamada de jitterbug e derivou em outras formas de dança swing. Ginástica e até acrobática, a dança enérgica foi apropriada por dançarinos brancos. Quando o swing saiu de moda após a Segunda Guerra Mundial, os dançarinos negros mantiveram o lindy hop vivo por décadas, até que um ressurgimento do swing na década de 1990 o trouxe de volta à grande popularidade.

    A dupla de dança de Miami Beach Lucille e Tony Colon demonstram o cha-cha-cha – um estilo latino da família do mambo conhecido por suas reviravoltas e ritmos animados.

    Foto de Getty Images

    Cha-cha-cha

    Outro padrão de salão de baile é o cha-cha-cha, inspirado em Cuba e no líder da banda violinista-compositor Enrique Jorrín. Durante a década de 1950, danças cubanas como o mambo e a rumba ganharam popularidade nas pistas norte-americanas e, no início da década, Jorrín utilizou uma forma musical mais antiga, o danzón, com uma batida de 2/4 e influências do estilo afro-caribenho.

    A forma de baile em três partes que surgiu do danzón se tornaria a dança oficial de Cuba. Mas Jorrín transformou isso em algo novo quando acrescentou um novo ritmo à parte final em algumas apresentações do final da década de 1940. Como resultado, os pés dos dançarinos se arrastavam no chão em um enérgico passo triplo – um padrão que o líder da banda chamou de “cha-cha-cha”. O movimento, também conhecido como cha-cha, gerou uma nova mania tanto para a música quanto para a dança.

    Embora muitos ritmos de dança mais antigos tenham perdido popularidade, o cha-cha-cha vive tanto em competições de dança de salão quanto em clubes modernos, onde também floresce seu ritmo primo, a salsa. Hoje, os imigrantes que levaram para os Estados Unidos estes estilos e tantas outras danças populares do final do século 19 e 20, ainda mantêm essas tradições vivas – garantindo que os dançarinos de salão continuem mergulhando, balançando e dando passos rápidos durante muitos anos.

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