Isolamento de Cuba promoveu benefício ambiental não intencional

Cuba abriga menos espécies de plantas invasoras do que outras ilhas do Caribe. Especialistas acreditam que o isolacionismo do país colaborou para esse fato.

Por Katarina Zimmer
Publicado 26 de mar. de 2021, 07:00 BRT
Cachoeira deságua em uma floresta de palmeiras-reais-de-cuba criticamente ameaçadas de extinção em Soroa, Artemisa, Cuba.

Cachoeira deságua em uma floresta de palmeiras-reais-de-cuba criticamente ameaçadas de extinção em Soroa, Artemisa, Cuba.

Foto de Peter R. Houlihan, National Geographic Image Collection

As ilhas do Caribe são um tesouro ecológico, abrigando muitas espécies únicas na Terra. Ainda assim, devido à economia cada vez mais globalizada, as ilhas foram ocupadas por plantas e animais invasores, trazidos intencionalmente ou por acaso. Em diversas ilhas, os invasores representam uma ameaça de extinção para as espécies nativas.

Mas Cuba é uma exceção: seu comércio e turismo diminuíram há mais de meio século, depois que Fidel Castro assumiu o poder, e só voltaram a aumentar nas últimas décadas. Embora muitos cubanos tenham sofrido sob o regime de Castro, o isolamento econômico também protegeu a ilha de espécies invasoras, de acordo com um novo estudo.

Em uma pesquisa abrangendo 45 ilhas do Caribe, uma equipe de cientistas norte-americanos e cubanos descobriu que Cuba tinha relativamente poucas espécies de plantas invasoras do que outras ilhas bem menores.

As descobertas são “fortes evidências de que Cuba é um lugar realmente especial e espetacular”, comenta a autora principal Meghan Brown, ecologista especializada em espécies invasoras das Faculdades Hobart and William Smith em Geneva, Nova York. O estudo foi publicado recentemente na revista científica Frontiers in Ecology and the Environment.

Desequilíbrio ecológico

Brown e seus colegas primeiro compilaram uma lista de 738 espécies de plantas não nativas conhecidas por causarem desequilíbrios ecológicos ou se disseminarem rapidamente pelo Caribe. Por exemplo, a espécie de rápida disseminação unha-do-cão, Cryptostegia madagascariensis, nativa de Madagascar, conhecida por deslocar espécies nativas e, por vezes, envolver outras árvores, invadiu florestas costeiras em Porto Rico e nas Ilhas Virgens Americanas.

Observando a distribuição desses desajustes ecológicos em 45 ilhas, a equipe constatou que, em geral, quanto maior a ilha, maior a tendência a invasores.

Mas Cuba foi uma exceção: a contagem de espécies invasoras era semelhante à de Porto Rico, que tem um décimo do tamanho de Cuba. É improvável que algumas espécies tenham passado despercebidas em Cuba, afirma Brown: sua coautora, a botânica cubana Ramona Oviedo Prieto, organizou extensas pesquisas por toda a ilha.

A unha-do-cão não foi encontrada em Cuba, nem uma pequena erva conhecida como perpétua-roxa-do-mato, Centratherum punctatum, que pode rapidamente dominar grandes áreas e privar plantas nativas de luz e nutrientes, que também é uma invasora em Porto Rico e nas Ilhas Virgens Americanas, acrescenta Brown.

Apenas 13% das espécies de plantas em Cuba não são nativas. Em contraposição, cerca de 30% das espécies de plantas em Porto Rico e Grand Cayman, e quase 20% das espécies na Jamaica e na Ilha de São Domingos, não são nativas dessas regiões.

Embora vários fatores provavelmente contribuam para o menor número de invasores em Cuba — talvez os ecossistemas sejam mais resistentes a invasões, por exemplo — a economia pós-revolução do país definitivamente desempenhou um papel importante, ressalta Brown.

Após a revolução de 1959, quando Castro assumiu o poder, as conexões do país com o restante do mundo diminuíram, em parte devido ao embargo comercial dos Estados Unidos. Em 1991, a dissolução da União Soviética, o parceiro comercial mais próximo de Cuba, agravou temporariamente o isolacionismo do país.

As espécies invasoras são um problema para países com economias abertas e o isolamento incomum de Cuba provavelmente contribuiu para preservar seus ecossistemas nativos, segundo o coautor do estudo Rafael Borroto-Páez, biólogo de espécies invasoras do Instituto de Geografia Tropical de Cuba, em Havana. Sua pesquisa anterior também constatou um baixo índice de invasões por répteis e anfíbios no país.

A equipe também identificou dezenas de espécies de plantas invasoras ou potencialmente invasoras em Cuba, principalmente originárias da Ásia, África e das Américas, que não foram encontradas em outras ilhas do Caribe — um padrão que provavelmente reflete os parceiros comerciais do país. Isso inclui, por exemplo, a camedórea-elegante, Chamaedorea elegans, uma planta popular nos Estados Unidos que é nativa da América Central, e o candelabro, Euphorbia trigona, planta semelhante ao cacto que pode crescer em densas florestas.

Relação entre política e plantas

Embora as plantas tenham colaborado com a formação de sociedades, política e comércio, o inverso também ocorre, segundo Brown: “a política influenciou nossa ecologia moderna”.

Mas comprovar definitivamente a causa e o efeito é sempre complicado a partir de dados complexos, observa James Ackermann, ecologista de plantas da Universidade de Porto Rico que não participou do estudo. Alguns dados sugerem que em Porto Rico, por exemplo, a maioria das espécies invasoras surgiu antes da década de 1960, quando a ilha já havia se tornado uma importante parada para navios mercantes internacionais. Se o meio de invasão dessas espécies aconteceu de forma semelhante em Cuba, então é possível que muitos invasores tenham chegado a partir da Revolução Cubana de qualquer maneira, independentemente do isolacionismo da ilha. Idealmente, se as plantas invasoras de Cuba pudessem ser mapeadas ao longo do tempo, isso poderia descartar essa possibilidade, ele acrescenta.

A nova pesquisa de Brown e seus colegas aponta o turismo como um forte propulsor do surgimento de plantas invasoras. Em geral, de acordo com os dados de comércio e turismo disponíveis de 20 ilhas, os números de invasões tendiam a se correlacionar mais estreitamente com os dados de turismo do que com os dados de comércio.

“Ilhas com tráfego intenso de turismo, como Grand Cayman ou Saint Thomas, possuem centenas de espécies [invasoras] a mais do que esperávamos de acordo com sua área”, afirma Brown.

Cuba possui um setor turístico restrito pelas normas caribenhas. Por exemplo, não recebe muita frota de navios de cruzeiro, que muitas vezes partem do sul da Flórida, um provável meio de deslocamento de plantas invasoras.

Alguns intrusos ecológicos podem ser trazidos pelos próprios turistas — sem saber, eles podem desembarcar de aviões ou navios de cruzeiro com sementes presas nos sapatos, ou mesmo trazendo sementes intencionalmente para parentes caribenhos, salienta Brown. Mas muitas espécies invasoras podem ser um subproduto do turismo: flores ornamentais exóticas trazidas deliberadamente para decorar hotéis e casas de temporada e criar uma atmosfera tropical agradável. Na realidade, a unha-do-cão é popular na indústria de paisagismo devido às suas grandes flores cor-de-rosa.

“É uma grande indústria”, comenta a ecologista de plantas Julissa Rojas-Sandoval, da Universidade de Connecticut, cuja própria pesquisa sugere que quase 40% das plantas invasoras nas ilhas do Caribe são espécies ornamentais. A indústria do turismo é uma grande consumidora dessas plantas ornamentais.

Para Rojas-Sandoval, o novo estudo (do qual ela não participou) ressalta a necessidade urgente de controlar a chegada de espécies estrangeiras destrutivas aos ecossistemas caribenhos, muitos dos quais já estão prejudicados pela perda de habitat. As espécies invasoras “acrescentam uma camada de vulnerabilidade que ameaça ainda mais a vida selvagem singular do Caribe”.  

Algumas ilhas, como a Nova Zelândia, minimizaram o risco de invasão por meio da regulamentação das espécies que o país importa e inspeção das mercadorias importadas — desta forma, mantendo as fronteiras abertas, observa Brown.

O turismo e o comércio de Cuba devem crescer nos próximos anos, e Borroto-Páez comenta que espera que seus legisladores intensifiquem as ações para proteger a ilha de espécies invasoras e ajudem a “preservar a excepcional biodiversidade das Índias Ocidentais”.

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