O que podemos aprender com a árvore mais antiga de Paris
A árvore simbólica, levada de Appalachia, nos Estados Unidos, para a França, mostra a propagação de espécies invasoras, mesmo às sombras da Catedral de Notre-Dame.
Pilar de concreto sustenta uma acácia-falsa (Robinia pseudoacacia), a árvore mais antiga de Paris, na Praça René Viviani.
Da janela do meu apartamento consigo ver o topo de uma árvore não tão alta, mas muito marcante, que ocasionalmente me distraía do motivo pelo qual vim a Paris. Sei que a árvore é notável porque uma placa a identifica como a mais antiga da cidade, plantada em 1601. Uma acácia-falsa (Robinia pseudoacacia), originária de Appalachia, nos Estados Unidos.
Contudo, diversos motivos tornam essa data de 1601 duvidosa. Mas parece provável que a árvore de fato tenha sido plantada no início do século 17 por Jean Robin, jardineiro de uma sucessão de reis franceses. A árvore sobreviveu a guerras e revoluções e, no meio deste ano, nasceram belas folhas em toda a sua copa. Como um velho soldado ferido — o tronco cheio de cicatrizes é mantido em pé por suportes de concreto — acabou sendo a precursora de um exército invasor: desde o século 17, acácias-falsas norte-americanas se propagaram pela Europa e certamente pelo mundo.
Na Europa Central, principalmente, silvicultores se apaixonaram pela espécie. Acácias-falsas crescem rapidamente em terras desmatadas para obtenção de lenha, protegendo o solo da erosão. Mais recentemente, no platô Loess, no noroeste da China, foram plantadas acácias-falsas em mais de 10 milhões de hectares durante as últimas décadas para combater uma das piores erosões de solo na face da Terra. A madeira da acácia-falsa também é valiosa, não apenas para lenha, pois ela é rígida e resistente. Quatro séculos depois de Robin ter plantado a árvore proveniente dos Estados Unidos em seu jardim, Robinia foi estabelecida como a única madeira “europeia” que pode ser utilizada para fabricação de móveis de jardim sem a necessidade de tratamento com pesticidas — uma alternativa sustentável à teca tropical (Tectona grandis) importada.
O problema é que a acácia-falsa não permanece apenas onde é plantada. É uma espécie extremamente invasora que se propaga pelo solo subterrâneo. Assim como outra precursora resistente, a Ailanthus altissima, popularmente conhecida como árvore-do-céu, que foi levada da China para a América no século 18, ocasião em que, mais uma vez, botânicos parisienses ofereceram uma ajuda fundamental. Jardineiros norte-americanos se apaixonaram pela beleza do ailanto, que cresce praticamente em qualquer lugar, mesmo entre rachaduras em pavimentos — e foi inspiração e personagem principal do livro A Tree Grows in Brooklyn (“Uma árvore cresce no Brooklyn”, em tradução livre). Mas Troy Farrah relatou recentemente para a Nat Geo que cientistas buscam avidamente uma maneira de extinguir a espécie também apelidada de “árvore do inferno”, pois destrói a biodiversidade, depositando suas esperanças em um fungo recém-descoberto.
O mundo está sofrendo as consequências das nossas ações. Cientistas tchecos recentemente analisaram a propagação da acácia-falsa no sul da Europa e concluíram que: “nossos resultados confirmam que é difícil definir se a Robinia deve ser cultivada, estimulada e amplamente tolerada ou erradicada por ser uma espécie invasora perigosa”. Eles afirmam que essa definição dependerá de cada caso e da região.
A cerca de 152 metros ao norte da árvore mais antiga está o real motivo da minha visita a Paris: a catedral de Notre-Dame. Um portal para os séculos 12 e 13, mas também para o século 19, quando foi completamente reformada. No momento, com o objetivo de recapturar esses fragmentos da história, a igreja está sendo reconstruída após o incêndio catastrófico de 2019 que causou a queda das torres através de suas abóbadas altas. A acácia-falsa pendente que raramente é notada no pequeno parque do outro lado do rio Sena é um lembrete de que, na vida, também é raro podermos desfazer as escolhas difíceis que tomamos, podemos apenas tentar lidar com elas da melhor forma.