Moradores de bairro autoconstruído em Portugal denunciam vida precária na pandemia
Com a colaboração da comunidade, o fotógrafo português José Sarmento Matos documentou a vida dos imigrantes e descendentes africanos e ciganos étnicos que vivem no Jamaica, bairro da zona metropolitana de Lisboa.

Cerca de 700 pessoas que vivem em condições precárias – no frio, em meio a goteiras, mosquitos e ratos – reclamem de atrasos no processo de realojamento prometido pelo governo português.
Com a necessidade de isolamento social para conter o avanço do coronavírus, o conforto de um lar tornou-se mais importante do que nunca. Mas, até ao momento, a comunidade não obteve qualquer apoio para melhorar as suas condições de habitação.
Alguns moradores do Jamaica tornaram-se jogadores de futebol profissionais, como Rafael Leão, atacante do Milan, da Itália. Os corredores e dependências compartilhadas dos prédios não possuem energia elétrica.
Manuela Pedro, 34 anos, escreve uma nota para o seu namorado: “Não há água desde a manhã”. Durante a pandemia, Manuela engravidou e teve o seu primeiro filho. Marcelo nasceu em novembro de 2020. Durante a gravidez, Manuela só conseguiu ter quatro consultas, e uma das vezes que foi a uma clínica privada foi-lhe negada a entrada, mesmo com um atestado médico para fazer exames. Ela sentiu-se discriminada por residir no bairro da Jamaica. Esse episódio deu-se em junho de 2020; um mês antes, foi noticiado pelos meios de comunicação um surto no bairro – 16 estavam infetadas com covid-19.
Salimo Mendes, na Associação de Moradores do Bairro da Jamaica. O Salimo era o presidente da associação e um resiliente lutador pelos direitos dos moradores por uma habitação digna. Faleceu em dezembro de 2020, aos 53 anos.
Edna Nazaré, 37 anos, dança à porta de sua casa com uma das filhas. Para Edna, o mais difícil nos períodos de confinamento foi gerir a falta de espaço em casa. ”Eu fiquei muito preocupada. Se alguém apanhasse covid, como é que a gente ia ficar em termos de espaço?”
Lurdes Pontes, 10 anos, posa para um retrato na sua secretária de estudo.
Este é o quarto de Arioste Mandinga, 59 anos. Arioste é natural de São Tomé e Príncipe e mudou-se para Portugal há quatro anos por motivos de saúde com junta médica
Roberto Cravid, o Kid Robinn (sentado à esquerda), um rapper nascido e criado no bairro da Jamaica, de 22 anos, convive com os seus amigos no exterior de um café do bairro. Roberto, para além de estar no começo da sua carreira como rapper, em 2020, durante a pandemia, começou a trabalhar na Uber Eats. O trabalho ajuda-o a manter o seu sonho de viver apenas da música.
Tiago, um ano, e Clemente, cinco, brincam na sala, enquanto atrás Analese, de nove, vê televisão. Os três são filhos de Telma Reis, 36 anos, natural de São Tomé e Príncipe.
Telma Reis, 36 anos, abre a cortina da casa onde mora com os três filhos. Telma é natural de São Tomé e Príncipe e mudou-se para Portugal em 2018. Em 2020, devido à pandemia, perdeu o emprego que tinha num restaurante. Acabou por só encontrar trabalho seis meses depois, na construção civil. “Chorei muito durante este período, mas no dia seguinte levantava a cabeça e tentava encontrar uma solução. Luto por uma solução para mim, mas principalmente para os meus filhos."
Em pleno confinamento, Aurora Coxi, 30 anos, ajuda o seu filho mais velho, Diego, 12 anos, com os trabalhos de casa. Por baixo da manta, está o William, filho mais novo da Aurora que vê desenhos animados.
A fachada de um dos prédios que faz parte do bairro de Jamaica. Atrás da janela, está um homem em sua casa. Não só por terem empregos maioritariamente não qualificados – o que os fragiliza economicamente durante a pandemia -, mas também pelas condições de habitação, os moradores do bairro estão muito mais expostos à atual situação pandêmica.
O governo promete realojar todos os moradores até 2022, mas apenas uma das quatro torres, que corria risco de desabamento, foi esvaziada até agora.
Vista dos três prédios centrais do bairro da Jamaica.