Coalas não estão funcionalmente extintos — pelo menos ainda

Com os marsupiais emblemáticos sofrendo nos incêndios florestais australianos, espalhou-se a desinformação sobre seu desaparecimento. Veja o que sabemos sobre isso.

Por Natasha Daly
Publicado 15 de dez. de 2019, 09:00 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Coala fêmea, chamada de Anwen por seus socorristas, recebe tratamento no Hospital de Coalas em Port Macquarie, na Austrália. Ela se queimou em um incêndio que devastou a área.
Foto de Nathan Edwards

A AUSTRÁLIA ESTÁ EM meio a uma temporada antecipada, catastrófica e sem precedentes de incêndios. Enquanto dezenas de incêndios florestais assolam a costa leste do país, de Sydney à Baía de Byron, destruindo casas, florestas e até pântanos, um dos animais mais emblemáticos da Austrália ocupa o centro das manchetes.

Imagens de coalas queimados e moribundos surgiram como um símbolo do resultado devastador dos incêndios. “São bichinhos tão desamparados”, diz Christine Adams-Hosking, pós-doutoranda na Universidade de Queensland, na Austrália. “Os pássaros conseguem voar, os cangurus pulam bem rápido, mas os coalas são muito lentos. Ficam praticamente presos onde estão.”

A situação desses animais indefesos provocou uma onda de preocupação — e confusão. Declarações equivocadas de que esses animais haviam perdido a maior parte de seu habitat e de que estavam “funcionalmente extintos” circularam nas manchetes e nas mídias sociais, ilustrando a rapidez com que a desinformação se propaga em tempos de crise.

Os voluntários do Hospital de Coalas encontraram esta mãe e seu filhote procurando comida e água no chão, na zona de incêndio de Port Macquarie. A dupla, chamada Julie e Joey, está recebendo atendimento no hospital.
Foto de Nathan Edwards

Os coalas são considerados vulneráveis à extinção — o que significa que estão apenas uma classificação acima dos animais ameaçados de extinção — e os relatórios indicam que de 350 a mil coalas foram encontrados mortos até agora em zonas devastadas pelo fogo no norte de Nova Gales do Sul.

Mas os especialistas dizem que ainda não estamos diante do fim de uma espécie. “Nós não veremos a extinção dos coalas tão rapidamente”, diz Chris Johnson, professor de conservação da vida selvagem na Universidade da Tasmânia. “As populações de coalas continuarão a diminuir por diversas questões interligadas, mas não chegamos a um ponto no qual um evento poderia eliminá-las.”

Por que os coalas estão sofrendo tanto?

Quando se trata de incêndio, tudo parece estar contra os coalas. Sua única defesa real é subir bem alto nos eucaliptos onde vivem — uma defesa ínfima em meio a um incêndio florestal violento.

O eucalipto é uma das plantas mais bem adaptadas ao fogo da Terra, sendo capaz de brotar e crescer novamente logo após um incêndio. Em condições normais, as chamas de um incêndio normalmente não chegariam ao topo das árvores, o que deixaria os coalas relativamente ilesos. O aumento que estamos presenciando nas mortes de coalas indica que algo está errado, diz David Bowman, diretor do Centro de Pesquisa em Incêndios da Universidade da Tasmânia.

101 | Coalas
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A dimensão dos incêndios atuais — em grande parte resultante das mudanças climáticas e da lenta extinção dos métodos aborígines de controle de incêndios — não tem precedentes, segundo Bowman. “Os incêndios estão acontecendo em uma intensidade particularmente alta”, diz ele.

Com alto teor de óleo, as árvores queimam com voracidade e rapidez; às vezes elas explodem, lançando faíscas em todas as direções.

Ainda é primavera na Austrália. “Em termos de crise de incêndios florestais, pode-se dizer que isso é apenas o começo”, diz Bowman. Ele teme que a situação piore muito em janeiro e fevereiro, já que as temperaturas continuam a subir e a seca se agrava muito.

Os funcionários do Hospital de Coalas cuidam dos ferimentos de Peter, um coala macho gravemente desidratado e em estado de choque, com patas, pés e orelhas muito queimados. Se ele conseguir se recuperar, será devolvido à natureza.
Foto de Photograp by Nathan Edwards

Quantos coalas restam?

Em 2016, os especialistas estimaram que havia cerca de 329 mil coalas na Austrália, o que representa uma queda média de 24% nas populações nas últimas três gerações.

“É muito difícil estimar as populações de coalas, mesmo nas melhores épocas”, afirma Adams-Hosking, porque eles estão distribuídos por todo o leste da Austrália, são tímidos e ficam bem no alto das árvores. “Algumas populações estão se tornando localmente extintas e outras estão prosperando.”

Os coalas estão ameaçados devido ao uso da terra e à degradação dos alimentos (o aumento do dióxido de carbono na atmosfera diminuiu a qualidade nutricional das folhas de eucalipto), além da seca, dos ataques de cães e da clamídia.

E, sim, devido ao fogo também. Em certas áreas drasticamente atingidas pelas queimadas, é possível que as populações de coalas não se recuperem, “mas é muito cedo para afirmar”, diz Adams-Hosking. “Precisaríamos monitorar por vários anos.”

Os incêndios realmente devastaram 80% do habitat dos coalas?

Não. A distribuição demográfica dos coalas é ampla, estendendo-se por toda a costa leste da Austrália. Os recentes incêndios florestais em Nova Gales do Sul e Queensland cobrem cerca de um milhão de hectares, de acordo com Fisher (algumas estimativas indicam 2,5 milhões de hectares), mas a área florestal no leste da Austrália, onde os coalas vivem, é de mais de 100 milhões de hectares.

Além disso, o fato de uma área ter sido afetada por um incêndio, diz Grant Williamson, pós-doutorando em ecologia da paisagem na Universidade da Tasmânia, “não significa que tenha sido ‘destruída’ e não seja mais adequada para ser ocupada pelos coalas”.

Voluntários do Hospital Port Macquarie Koala procuram por coalas feridos depois que um incêndio atingiu um campo de reprodução nobre.
Foto de Nathan Edwards

Os coalas estão funcionalmente extintos?

“Funcionalmente extinto” refere-se a uma espécie que não possui mais indivíduos suficientes para produzir gerações futuras ou representar um papel no ecossistema.

Os incêndios podem ter matado muitos coalas, “mas isso não é suficiente para alterar sua classificação geral de ameaça como espécie”, diz Fisher.

As manchetes alegando que os coalas estão funcionalmente extintos parecem se basear na declaração feita por um grupo de conservação de coalas no início de 2019. Os cientistas contestaram isso na época e continuam a contestar agora: “A espécie está ameaçada em algumas partes de sua distribuição geográfica, mas não em outras”, afirma Diana Fisher, professora associada na Faculdade de Ciências Biológicas da Universidade de Queensland.

Para algumas populações locais de coalas nas zonas de incêndio, especialmente no norte de Nova Gales do Sul, o impacto provavelmente foi “catastrófico”, diz Adams-Hosking. Um terço dos coalas nas zonas de incêndio pode ter morrido.

Mas outras populações, como as do estado de Victoria, no sul, não foram afetadas por esses incêndios, de acordo com Johnson.

Então, o que vai acontecer?

“A situação não está boa para os coalas, mesmo antes dos incêndios”, diz Adams-Hosking. Apesar de serem protegidos pelo governo — é ilegal matar um coala, por exemplo — seu habitat é bastante vulnerável, diz ela. “Uma parte bem pequena do habitat do coala é designada como área protegida. Quase nada.” Ela argumenta que o governo precisa colocar o meio ambiente à frente do crescimento econômico. “Até que a vontade política entre em ação — e na Austrália isso não acontece —, nada vai melhorar para os coalas.”

Enquanto isso, o Hospital de Coalas de Port Macquarie, localizado a aproximadamente 402 quilômetros ao norte de Sydney, em uma das zonas mais afetadas pelo fogo, está ativamente resgatando e tratando os coalas. Até o momento, eles trataram pelo menos 22, de acordo com o New York Times.

Adams-Hosking e David Bowman, especialista em queimadas, argumentam que, além de proteger o meio ambiente, é vital começar a analisar a recuperação e o reposicionamento dos coalas. “Temos que acompanhar o programa e começar a nos adaptar”, diz Bowman. “Se queremos coalas, precisamos cuidar deles. Precisamos nos esforçar.”

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