Hipopótamos, hienas e outros animais estão contraindo covid-19

Mais espécies são consideradas suscetíveis ao coronavírus, com a maioria dos casos detectados em zoológicos.

Por Natasha Daly
Publicado 31 de dez. de 2021, 07:00 BRT
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Em setembro, seis leões (alguns retratados aqui em maio) e três tigres testaram positivo para covid-19 no Zoológico Nacional Smithsoniano em Washington, D.C. Eles estão entre as 15 espécies que apresentaram resultado positivo nos Estados Unidos.

Foto de Pete Kiehart, Bloomberg via Getty Images

Em novembro, Ngozi e Kibo, de 22 e 23 anos, apresentaram tosse, letargia e coriza em seu lar no estado do Colorado. Logo foi determinado que seus sintomas comuns eram sinais de algo nunca antes visto: esses residentes do Zoológico de Denver se tornaram as primeiras hienas no mundo conhecidas por estarem infectadas com covid-19.

O marco, quase 20 meses após o início da pandemia, faz parte de um padrão observado nos últimos meses. Em 6 de outubro, um urso-gato-asiático e um gato-pescador testaram positivo no zoológico de Chicago, e uma semana depois foi a vez de um quati. Em 05 de dezembro, dois hipopótamos em um zoológico na Bélgica também apresentaram resultado positivo. Todos foram os primeiros de sua espécie a contrair o vírus.

Eles agora fazem parte de um grupo de 315 animais de 15 espécies nos Estados Unidos que se infectaram com o Sars-CoV-2, o vírus que causa a covid-19. A lista também inclui gatos, cães, tigres, leões, leopardos-das-neves, gorilas, lontras, um puma, um furão e veado-de-cauda-branca. (Os visons infectados, quase todos em criadouros de produção de peles de animais, não estão incluídos no total).

O que sabemos sobre quais animais podem contrair o vírus? E o que isso significa para eles — e para nós?

Certos animais são mais suscetíveis?

Esses casos acometeram principalmente os carnívoros. (Os carnívoros pertencem a uma ordem de mamíferos que inclui gatos selvagens e domésticos, cães e lobos, ursos e muito mais. Carnívoro é um termo genérico para qualquer animal que se alimenta principalmente de carne. Os tubarões, por exemplo, são carnívoros, mas não pertencem a uma ordem de mamíferos).

As hienas, o urso-gato-asiático, o quati e o gato-pescador são carnívoros, assim como os gatos domésticos e os grandes felinos, que testaram positivo desde o início da pandemia.

Isso não significa necessariamente que os carnívoros sejam mais suscetíveis, pois ainda não há dados suficientes que comprovem isso, afirma Elizabeth Lennon, veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade da Pensilvânia.

No entanto, a história é diferente com os grandes felinos. Noventa testaram positivo nos Estados Unidos, de acordo com o Departamento Americano de Agricultura (Usda). “Se for observado o quadro geral em todos os zoológicos, pode-se dizer com segurança que há um aumento na suscetibilidade a doenças clínicas em grandes felinos”, explica Lennon.

Algumas espécies são mais suscetíveis a determinadas variantes.

Os ratos, por exemplo, escaparam do vírus Sars-CoV-2 original, mas sabemos que podem se infectar com a variante beta.

Conforme as variantes surgem em humanos, o vírus pode estar expandindo sua gama de hospedeiros — mutando para infectar mais espécies e talvez circulando “silenciosamente” entre elas, criando um novo reservatório, esclarece Diego Diel, professor associado e diretor do laboratório de virologia na Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Cornell.

Mas o oposto também é verdadeiro: é possível que novas variantes sejam inofensivas para certas espécies, explica Diel, porque “à medida que o vírus se torna mais transmissível entre humanos, pode se tornar menos eficaz na circulação entre animais”.

No momento, com exceção do vison, não há evidências de que qualquer espécie, incluindo animais de estimação, possa transmitir o vírus aos humanos, ou que as variantes tenham surgido após sofrer mutação em outra espécie.

A maioria dos animais não parece ficar gravemente doente com a covid-19

A maioria dos animais nos Estados Unidos — incluindo Ngozi e Kibo, as hienas — apresentou apenas sintomas leves e se recuperou totalmente.

Os casos mais sérios ocorreram em leopardos-das-neves e visons. No Lincoln Children’s Zoo, no estado do Nebraska, três leopardos-das-neves morreram em novembro de complicações causadas pela covid-19. Não se sabe se eles tinham comorbidades. Além disso, milhares de visons morreram em 17 criadouros de produção de peles de animais em Utah e outros estados. Outros milhões foram sacrificados em criadouros para a produção de peles de animais na Dinamarca e Países Baixos.

Estudar a covid-19 em animais é importante

“A partir do momento que mais de uma espécie pode reter e transmitir um vírus, ocorrem implicações significativas nas estratégias de controle e prevenção”, explica Diel. Portanto, é crucial descobrir se alguma espécie pode se tornar um reservatório para o vírus.

“Os animais apresentam riscos diferentes e desconhecidos”, esclarece Lennon. “É crucial continuar a vigilância em espécies distintas, porque o vírus já está amplamente disseminado”, o que aumenta a exposição e a transmissibilidade.

Os testes se fundamentaram em animais que apresentaram sinais da doença

O número de infecções em animais nos Estados Unidos provavelmente excede os 315 casos registrados, afirma Diel. Se os animais não apresentarem sintomas, é improvável que sejam submetidos a testes, e fica difícil conhecer os potenciais propagadores silenciosos — animais que podem contrair o vírus e transmiti-lo sem nunca apresentar sintomas.

O veado-de-cauda-branca é uma espécie que os cientistas estão monitorando de perto. Este ano, um estudo que analisou o sangue de mais de 600 cervos em quatro estados dos Estados Unidos encontrou anticorpos para o coronavírus em quase 40% das amostras. No mês passado, a covid-19 foi detectada em três cervos em Quebec, no Canadá. Nenhum dos animais parecia doente.

Não há evidências de que os cervos possam transmitir o vírus para humanos ou outras espécies. Contudo, a possibilidade de um reservatório silencioso faz os cientistas hesitarem. “É por isso que todos estão tão preocupados com esses estudos em cervos”, esclarece Lennon. Se um vírus se dissemina silenciosamente e até sofre mutação em uma grande população de animais, “é muito mais difícil controlar e erradicar”.

Maioria dos casos nos EUA foi relatada por instalações credenciadas com protocolos de saúde rígidos

O zoológico do Bronx, onde os primeiros tigres e leões testaram positivo em abril de 2020, o San Diego Zoo Safari Parkonde o primeiro gorila apresentou resultado positivo em janeiro de 2021, e o Lincoln Children's Zoo, lar dos três leopardos-das-neves que morreram, são todos membros do Associação de Zoológicos e Aquários (AZA), uma organização americana sem fins lucrativos que define padrões para o cuidado e segurança dos animais.

Os protocolos veterinários mais rigorosos da AZA indicam maior probabilidade de que os cuidadores detectarão as doenças nos animais e realizarão testes, esclarece Dan Ashe, presidente da AZA. “Eles monitoram constantemente os animais”, afirma ele. “Se percebem algo incomum, eles questionam”.

As práticas padrão durante a pandemia incluem o uso de equipamentos de proteção individual e a minimização do contato próximo com os animais, de acordo com veterinários de vários zoológicos credenciados pela AZA com casos positivos. “Nossas equipes adotaram diversas medidas de proteção e ainda estamos observando infecções”, explica Ashe. “Portanto, é difícil acreditar que não esteja acontecendo em outras instalações onde o contato é muito mais, digamos, liberal”.

E nos zoológicos “de beira de estrada” que oferecem interações com os animais?

Muitos zoológicos de beira de estrada, como os apresentados na série A Máfia dos Tigres da Netflix, oferecem contato direto com os animais, principalmente filhotes de leão e de tigre, cujas espécies são conhecidas por serem suscetíveis ao vírus. Esses zoológicos devem ser licenciados pelo Usda para expor os animais, mas não são credenciados pela AZA, que proíbe o contato entre os grandes felinos e o público. 

Os padrões de cuidado estabelecidos pelo Usda ficam bem abaixo daqueles da AZA, e os zoológicos de beira de estrada são notórios por cuidados veterinários e protocolos de segurança negligentes. Não se sabe se os grandes felinos em zoológicos de beira de estrada ou em instalações que oferecem interações com filhotes foram submetidos a testes para o vírus ou morreram por causa dele.

“Acho que o risco é maior” em zoológicos de beira de estrada, afirma Diel. “Um requisito para a transmissão é o contato próximo e, em todas as situações em que se amplia o número de pessoas que têm contato com animais, o risco aumenta”.

Precisamos de mais dados e estudos

Embora a covid-19 seja principalmente uma doença humana, declara Lennon, o número crescente de espécies conhecidas como suscetíveis ao vírus deve ser um apelo à ação. “Precisamos vigiar amplamente as diferentes espécies e as novas variantes”, como a variante Ômicron, esclarece ela. “Desde o início, o vírus surpreendeu a todos a cada momento ... Não podemos baixar a guarda em nenhum momento, pois continuamos aprendendo sem parar.”

Como ajudar 

  1. Se você testar positivo para a covid-19, isole-se de seus animais de estimação, assim como faria com outros humanos. Se o seu animal parecer doente, chame seu veterinário.
  2. Evite tocar ou se aproximar dos grandes felinos em zoológicos para evitar a propagação do vírus. Sabemos que os tigres e os leões são suscetíveis à covid-19. (E acariciar os filhotes também apresenta outros riscos para os animais.)
  3. Vacine-se, se ainda não o fez. A vacinação comprovadamente reduz a propagação da covid-19, protegendo humanos e animais.

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