Por causa da carapaça, esta ave rara luta ara sobreviver
Os calaus-de-capacete estão virando alvo do tráfico de animais silvestres, ao mesmo tempo que encolhem os seus hábitats no Sudeste Asiático.
Confira a reportagem completa na edição de outubro da revista National Geographic Brasil.
Esta reportagem foi produzida em colaboração com o Laboratório de Ornitologia da Universidade Cornell e faz parte de um esforço para aumentar a conscientização global sobre o calau-de-capacete.
Vim para essa floresta para conhecer uma ave. Mas agora me pergunto se vale a pena tanto esforço.
O terreno no Parque Nacional Budo-Su-ngai Padi, no sul da Tailândia, é tão íngreme que, em certos trechos, dá até para a gente se inclinar para a frente e tocar com as mãos a trilha que ainda vamos percorrer. Em cada passo no solo encharcado de chuva, é enorme o risco de escorregarmos de volta lá pra baixo. Insetos zumbem nos nossos narizes e orelhas, e quem se arrisca a olhar em volta topa com um exército de sanguessugas avançando em sua direção com os pequenos corpos carnudos e ávidos de sangue.
Estamos aqui em busca do calau-de-capacete (Rhinoplax vigil), uma ave antiga, de aparência esquisita e que está se tornando cada vez mais rara. À frente do grupo está Pilai Poonswad, a “grande mãe dos calaus”. Desde 1978, essa cientista tailandesa vem estudando essas aves e lutando a favor da sua proteção. Também estão conosco o fotógrafo Tim Laman e um cinegrafista, além de membros da equipe de Pilai e alguns moradores do vilarejo que fica no sopé da montanha – são eles que carregam os suprimentos e vão nos ajudar na hora de montar o acampamento. Nós sabíamos que aquela missão seria árdua, uma espécie de odisseia – tanto pelos calaus-de-capacete serem aves muito esquivas como pela dificuldade para encontrá-las devido à rapidez com que estão desaparecendo.
Quando, afinal, avistamos a árvore que nos interessa, guardamos uma distância de cerca de 40 metros, ocultos atrás de um pano de camuflagem e galhos entrelaçados. É uma espécie tropical, com 55 metros de altura, erguendo-se bem acima da maioria das outras árvores na floresta. E, projetando-se logo acima da metade do seu tronco, via-se uma cavidade retorcida na qual uma fêmea de calau-de-capacete havia se encerrado meses antes para botar um ovo. Do posto de observação no chão, não é possível vermos nada no interior do ninho, mas sabemos que é apenas uma questão de tempo até que o macho apareça, trazendo comida para a parceira.
As horas vão passando enquanto esperamos, devaneando, imaginando que estamos longe das formigas ou das sanguessugas ou, ainda, daquela incômoda tábua que nos serve de banco. O sol ainda está subindo, mas a umidade já me envolveu com um abraço molhado e pegajoso.
Não sou uma observadora de aves, mas imagino que essa deva ser a experiência típica de quem se dedica a isso. Meu devaneio é interrompido por uma onda se espraiando no ar – Uoosh- -uoosh! As lacunas entre as penas nas asas fazem com que os calaus sejam aves ruidosas ao voar.
Hu. Hu. Hu-hu-hu, hahahaha! Então ouvimos o riso maníaco de um calau-de-capacete. Pelo som, o macho está apenas a algumas árvores de distância. Prendemos a respiração. E, de repente, lá está ele: um dinossauro vivo, medindo mais de 1 metro (sem contar as penas centrais da cauda, que lhe acrescentam mais meio metro), empoleirado na saliência do tronco, com um bicho-pau no bico, os olhos atentos espreitando ao redor.
Silêncio total à nossa volta. O calor irritante se foi, cessou o latejamento no meu tornozelo (torcido dias antes em casa, nos Estados Unidos). Acabou o tormento dos insetos, as cigarras deixaram de estrilar. Ficamos siderados diante daquela cabeça enorme, pesada com o “capacete” ou casco avermelhado sobre o bico amarelo em forma de cunha. Contemplamos o pescoço vermelho enrugado e sem penas, as longas penas pretas e brancas da cauda. É uma visão sobrenatural. Nada havia nos preparado para a sensação esmagadora de maravilhamento que sentimos.
O calau inclina-se sobre a cavidade do ninho e, através da abertura, passa o bicho-pau para o filhote. Missão cumprida, e com outro uoosh das asas, ele vai, atrás de mais comida para a família.
Confira a reportagem completa na edição de outubro da revista National Geographic Brasil.