Condições meteorológicas mostram sinais das mudanças climáticas todos os dias desde 2012
Crianças nascidas a partir daquele ano não viveram um dia sem serem afetadas pelas mudanças climáticas.
Com um único dia de observação do tempo atmosférico global, os cientistas podem detectar um sinal das mudanças climáticas.
UMA TEMPESTADE ISOLADA, TORRENCIAL em um dia de junho. Um dia estranhamente quente em julho. Uma onda de frio no fim de novembro. O vento, o sol, a umidade e tudo aquilo que sentimos ao sair de casa todos os dias: isso são as condições climáticas.
O clima, já explicado pelos cientistas há tempos, é o que acontece quando combinamos, consecutivamente, as condições climáticas de um determinado dia. O clima é um pano tecido pelos fios das diferentes condições climáticas diárias.
Por muito tempo, os cientistas sempre disseram que as condições climáticas não serviam muito de parâmetro para sabermos como o clima tem mudado. Aquele dia que fez 31o Celsius em julho? Existem diversas razões para isso ter ocorrido. Eles diziam que as mudanças climáticas poderiam ser uma parte dessa equação, mas nossas técnicas estatísticas ainda não eram avançadas o suficiente para detectar a influência direta que o aquecimento global causado pelos humanos tem nas condições climáticas.
Mas isso é passado. As mudanças climáticas mostraram a grande força que exercem sobre o planeta e suas marcas podem ser vistas nas condições climáticas globais, todos os dias desde 2012. Uma criança de seis anos de idade nunca passou um dia de sua vida sem sentir a influência das mudanças climáticas.
Um cientista do clima “poderia sentar-se em uma estação espacial, observar a Terra de cima e ver de fato a marca das mudanças climáticas em qualquer dia” apenas ao observar o padrão climático global, diz Reto Knutti do Instituto de Ciências Atmosféricas e Climáticas da ETH, em Zurique, e um dos autores da pesquisa publicada em janeiro no periódico Nature Climate Change. “Estávamos tão distante do território inexplorado das mudanças climáticas que somente agora conseguimos ver com mais clareza.”
A febre só aumenta
Desde o fim da década de 1970, os cientistas estão cada vez melhores em mostrar e detectar os sinais das mudanças climáticas causadas pelos humanos a partir de um emaranhado que envolve todos os tipos de observações planetárias. Ao mesmo tempo, eles desenvolveram técnicas para descobrir exatamente quais desses sinais podem ser atribuídos a mudanças causadas pelos humanos devido à emissão descompensada de gases de efeito estufa na atmosfera da Terra.
O “sinal” procurado pelos cientistas é o seguinte: o que de fato ocorreu com a temperatura e a umidade com o passar dos anos, de acordo com os registros climáticos, em comparação às previsões dos modelos climáticos daquilo que teria acontecido caso os humanos não tivessem causado o aquecimento global. Quanto maior a divergência de ambos, mais forte é considerado o sinal.
Os traços das mudanças climáticas são relativamente fáceis de constatar em alguns dados, como a temperatura média global do ar ou do oceano, que aumenta quase que ininterruptamente há décadas. Durante os últimos dez anos, a temperatura média da atmosfera da Terra foi 0,7 grau Celsius mais quente do que no meio do século 20 — mais da metade do quase 1 grau Celsius que o planeta aqueceu desde o início da Revolução Industrial.
Mas em função da grande variação das condições climáticas de qualquer lugar em qualquer dia, os cientistas hesitaram em identificar um sinal de aquecimento global nas condições climáticas locais ou cotidianas.
“Trata-se de uma relação sinal-ruído”, explica Beena Balan Sarojini, cientista do clima no Centro Europeu de Previsões Meteorológicas de Médio Alcance. “As mudanças climáticas são o sinal. As condições climáticas e eventos como o El Niño são o ruído. Até agora, conseguimos encontrar esse sinal climático em registros de longo prazo, como de temperatura, precipitação e extensão do gelo no Mar Ártico. Mas assim que grandes mudanças regionais foram detectadas, passou a ser mais útil falar sobre lugares específicos e mudanças diárias.”
Essa equipe científica liderada por Sebastian Sippel, pesquisador no Instituto de Ciências Atmosféricas e Climáticas da ETH, em Zurique, encontrou um padrão em meio ao caos meteorológico global diário, como uma estação de rádio aguardando para ser sintonizada. No retrato das condições climáticas do mundo todo a cada dia desde 2012, havia uma marca clara do aquecimento global induzido pelos humanos em longo prazo.
“O que hoje é normal, no passado era algo fora do comum,” explica Balan Sarojini. “O evento extremo de ontem será a regra de amanhã”.
Agora, conseguimos ver com clareza
Mesmo há 10 anos, esse sinal era muito fraco e confuso para que fosse compreendido com clareza. Mas, na última década, o sinal do aquecimento ficou bastante notável, diz Friederike Otto, diretora do Instituto de Mudanças Ambientais de Oxford.
“A última década ficou mais quente do que qualquer outra. O sinal agora é tão forte que mesmo realizando um trabalho menos complicado, conseguimos detectar esses padrões,” ela explica. “O sinal se manifestou e evoluiu consideravelmente em pouco tempo.”
De certo modo, os cientistas do clima trabalham há 40 anos para ver exatamente esses resultados. Em 1979, um estudo científico de referência sugeriu que, em algum momento, com dados suficientes e com o aquecimento avançado, os cientistas conseguiriam identificar o sinal humano nos confusos dados climáticos.
Naquele mesmo ano, o Conselho de Pesquisa Nacional publicou um estudo denominado “Dióxido de carbono e o clima: uma análise científica,” uma das primeiras análises a estimar a resposta da atmosfera da Terra a grandes emissões de dióxido de carbono. E ainda naquele mesmo ano, a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos Estados Unidos (Noaa) e a Nasa lançaram uma série de satélites meteorológicos que realizam registros contínuos desde então, criando um registro inestimável e ininterrupto da atmosfera e dos oceanos à medida que a febre da Terra aumenta.
“O aquecimento global foi tão grande que todo o clima teve uma mudança maior do que deveria,” Peter Stott, cientista do clima no Met Office, Reino Unido. “Portanto, mesmo diariamente, as temperaturas médias globais mudaram significativamente. Acreditávamos que veríamos isso acontecer um dia, mas a verdade é que já está acontecendo agora.”