Por que usar sabão é melhor do que água sanitária na luta contra o coronavírus?

De acordo com especialistas, recorrer à água sanitária é como usar um “enorme bastão para golpear uma mosca”.

Por Sarah Gibbens
Publicado 23 de mar. de 2020, 07:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Funcionário com vestimenta de proteção desinfeta o interior de um ônibus público em uma estação de ...
Funcionário com vestimenta de proteção desinfeta o interior de um ônibus público em uma estação de lavagem na empresa Transport Company de Bratislava como parte das medidas preventivas contra a propagação do novo coronavírus em Bratislava, Eslováquia, em 11 de março de 2020.
Foto de Vladimir Simicek, AFP via Getty Images

HÁ QUASE 5 MIL anos, os humanos inventaram produtos de limpeza, mas a simples combinação de água e sabão continua sendo uma das armas mais poderosas contra doenças infecciosas, incluindo o novo coronavírus. Mesmo assim, quando ocorrem surtos como o da Covid-19 e o pânico se instala, as pessoas correm para comprar diferentes produtos de limpeza, muitos dos quais são desnecessários ou ineficazes contra o vírus.

Produtos para higienização das mãos estão desaparecendo das prateleiras das lojas, apesar de muitos não terem a quantidade necessária de álcool — pelo menos 60% por volume — para matar os vírus. Nos países mais atingidos pelo novo coronavírus, fotos mostram equipes em vestimentas de proteção pulverizando soluções à base de água sanitária nas calçadas ou em prédios comerciais. Especialistas duvidam, no entanto, se a medida é necessária para neutralizar a propagação do coronavírus.

Usar água sanitária “é como usar um enorme bastão para golpear uma mosca”, diz Jane Greatorex, virologista da Universidade de Cambridge. A substância também pode corroer metais e levar a outros problemas de saúde respiratória se inalada em excesso ao longo do tempo.

“Se você aplica água sanitária em uma superfície muito suja, a sujeira consome a água sanitária”, diz Lisa Casanova, cientista em saúde ambiental da Georgia State University. Ela e outros especialistas recomendam o uso de sabonetes mais suaves, como detergente de lavar louça, para higienizar facilmente superfícies em ambientes internos e externos.

Para saber por que as autoridades de saúde continuam preferindo o sabão, é importante entender como o coronavírus sobrevive fora do corpo e o que as primeiras pesquisas estão dizendo sobre quanto tempo o vírus pode permanecer em superfícies comuns.

Superfícies rígidas feitas para o coronavírus

A transmissão de pessoa para pessoa é a principal forma de propagação do coronavírus. Contato próximo na forma de um abraço, aperto de mão ou presença em um espaço público lotado permite que indivíduos infectados espalhem facilmente suas gotículas respiratórias, normalmente por meio de espirros ou tosse.

Mas como as gotículas respiratórias são pesadas, elas geralmente caem no chão. Dependendo de onde elas pousam, ficam na superfície antes de serem tocados por uma mão que leva o vírus ao nariz ou à boca, causando a infecção.

Os vírus são pedaços de código genético envoltos em uma capa de lipídios e proteínas, que pode ser um invólucro feito de gordura conhecido como envelope viral. Destruir um vírus envelopado exige menos esforço comparado ao necessário para destruir seus colegas não envelopados, que podem durar meses em uma superfície. Um exemplo de vírus não envelopado é o norovírus, que atinge o estômago. Os vírus envelopados normalmente sobrevivem fora do corpo apenas por alguns dias e são considerados os mais fáceis de matar, pois uma vez que seu exterior frágil é quebrado, eles começam a se degradar.

No entanto cada vírus envelopado é diferente, e cientistas de todo o mundo estão realizando extensas pesquisas sobre o SARS-CoV-2, o nome oficial do novo coronavírus, para entender como ele se comporta. Um estudo publicado no periódico New England Journal of Medicine analisou por quanto tempo ele pode ser detectado em diversos materiais. Dylan Morris, biólogo evolucionário da Universidade de Princeton e coautor do estudo, contou que a missão foi investigar quais superfícies presentes em ambientes médicos podem atuar como uma possível fonte de infecção aos pacientes.

Em superfícies, foi descoberto que o SARS-CoV-2 durava 24 horas em papelão, dois dias em aço inoxidável e três dias em um tipo de plástico rígido chamado polipropileno. O vírus só foi detectado por quatro horas no cobre, um material que decompõe naturalmente bactérias e vírus. O estudo também revelou que o novo coronavírus e seu primo SARS, que causou um grande surto em 2002 e 2003, perduram nas superfícies por tempo semelhante.

As pessoas que encomendam mercadorias pela internet para evitar aglomerações podem entrar em contato com papelão contaminado, embora os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA enfatizem que não se acredita que as superfícies sejam consideradas a principal forma de transmissão do vírus.

Morris não quer falar muito sobre as superfícies mais comuns no nosso dia a dia, mas seu conselho geral é lavar bem objetos e as próprias mãos.

Mas o estudo deles possui limitações. A equipe examinou o vírus em um ambiente de laboratório altamente controlado. Os espaços normalmente tocados, como um corrimão ou uma barra no interior de um ônibus, conteriam uma quantidade maior do vírus e apresentariam maior risco de infecção. As condições ambientais também podem influenciar a duração do vírus. Acredita-se que a umidade, por exemplo, dificulte a circulação de gotículas respiratórias pelo ar, e a luz ultravioleta é conhecida por degradar vírus.

O estudo também descobriu que o novo coronavírus é capaz de persistir na forma de aerossol — minúsculas partículas transportadas pelo ar — por até três horas, embora Morris esclareça que gotículas respiratórias maiores tenham maior probabilidade de serem infecciosas. O aerossol viral é principalmente uma preocupação em ambientes clínicos, onde certos tratamentos, como a ventilação, podem produzir essas partículas. É improvável que esses aerossóis de coronavírus tenham algum efeito ao ar livre ou em locais públicos como supermercados.

Madeira e alimentos

O estudo de Morris não incluiu itens normalmente tocados, como roupas ou alimentos, mas não há evidências de que o novo coronavírus possa ser transmitido por alimentos, de acordo com a Agência de Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA.

Em estudos sobre o vírus influenza, o vírus não ficou por mais de quatro horas em itens porosos como roupas e madeira. Isso ocorre porque esses itens retiram a umidade do vírus, causando a sua degradação.

Não importa o que você toque, lavar com água e sabão é a melhor maneira de remover qualquer possível coronavírus de suas mãos antes que possa ocorrer a infecção. O coronavírus não penetra na pele porque sua camada mais externa é levemente ácida, o que impede a maioria dos patógenos de entrar no corpo, explica Greatorex.

O sabão funciona de maneira tão eficaz porque sua química abre o envelope externo do coronavírus e causa a sua degradação. As moléculas de sabão retêm pequenos fragmentos do vírus, que são levados pela água. Os produtos para as mãos à base de álcool em gel funcionam de maneira semelhante, separando as proteínas contidas em um vírus.

A água da torneira também não é motivo de preocupação, dizem os especialistas, porque somente águas residuais trariam a possibilidade de causar contaminação. Embora o coronavírus tenha sido encontrado nas fezes, o vírus ainda não foi detectado em águas residuais, de acordo com o CDC. Mesmo se fosse esse o caso, o processo de tratamento de água nos Estados Unidos é robusto o suficiente para matar o coronavírus, diz Kyle Bibby, engenheiro ambiental da Universidade de Notre Dame.

“Seria tecnicamente plausível a possibilidade de exposição ao vírus por via aquática? Sim. O público precisa se preocupar com isso? Não.”, afirma Bibby.

“A última coisa que precisamos agora é que as pessoas tenham medo de beber água da torneira ou lavar as mãos.”

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