Pesquisadora brasileira recebe o maior prêmio de conservação ambiental do mundo

Exploradora da National Geographic e especialista em antas, Patricia Medici foi a vencedora do Whitley Gold Award de 2020. Gabriela Rezende, que estuda o mico-leão-preto, também foi premiada.

Por Paulina Chamorro
Publicado 29 de abr. de 2020, 13:54 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
patricia medici anta pantanal

Patrícia Medici observa anta anestesiada em armadilha de pesquisa no Pantanal. Exploradora da National Geographic, ela recebeu o que é considerado o maior prêmio da conservação ambiental do mundo: o Whitley Gold Award, conferido pelo Whitley Fund for Nature.

Foto de João Marcos Rosa, Nitro

O trabalho em conservação de duas cientistas brasileiras foi reconhecido em anúncio feito nesta quarta-feira (29/04). Patrícia Médici, exploradora da National Geographic e uma das maiores referências em pesquisa e conservação da anta brasileira (Tapirus terrestris), recebeu o Whitley Gold Award, principal prêmio da instituição Whitley Fund for Nature, do Reino Unido. A bióloga Gabriela Rezende, que coordena programa de conservação do mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus), levou um Whitley Award.

As duas pesquisadoras fazem parte do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) e trabalham pela conservação de duas espécies símbolos da biodiversidade brasileira.

Conversei com ambas por telefone em um período em que todas as atividades em campos estão suspensas. A cerimônia, que seria presencial, passou para uma nova data – dezembro de 2020, se o Covid-19 permitir. A premiação traz um reconhecimento global para trabalhos de conservação, além de recursos financeiros para a manutenção dos projetos.

Patrícia Medici, cofundadora do IPÊ e coordenadora da Iniciativa para Conservação da Anta Brasileira (Incab), já recebeu os mais importantes prêmios ambientais do mundo, entre eles, o National Geographic Society/Buffet Award for Leadership in Conservation, conferido em junho de 2019. Ela trabalha com antas há mais de duas décadas, criou o maior banco de dados sobre o animal no mundo e é uma das cientistas perfiladas na série de reportagens Mulheres na Conservação.

O reconhecimento mundial para o trabalho de conservação da anta brasileira chega em boa hora. Para a pesquisadora, o prêmio é um selo. “E vem em momento importante para mostrar ao mundo e à toda a sociedade brasileira que se continua fazendo ciência e pesquisa de qualidade no país”, me contou. “Momento em que a ciência precisa ser valorizada.”

Ao longo de quase três décadas, Patricia Medici conseguiu criar o maior banco de dados sobre as antas brasileiras no mundo. A espécie é conhecida como jardineira da floresta pelo importante papel de dispersão de sementes.

Foto de João Marcos Rosa, Nitro

O trabalho da pesquisadora une treinamento e capacitação, educação ambiental, pesquisa de campo e muita comunicação pela conservação. Todas essas iniciativas foram consideradas pelo comitê. O Whiltey Gold Award é entregue uma vez por ano para um pesquisador que já tenha recebido o Whitley Award em edições anteriores e garante 60 mil libras em financiamento de pesquisas (cerca de R$ 400 mil na cotação atual).

Patrícia conta que o apoio que recebe do prêmio também é de longo prazo. “É uma parceria construída e cultivada por ambas as partes”, diz ela. O primeiro apoio veio com o primeiro Whitley Award, em 2008. Com o dinheiro, Patrícia e o IPÊ puderam expandir a pesquisa para o Pantanal e implementar o Incab no Brasil. Cinco anos depois, na expansão do projeto para o Cerrado, o Incab ganhou um Continuations Grants, uma bolsa de pesquisa que visa “continuar participando da vida de conservação dos pesquisadores”.

O Whitley Gold Award de 2020 traz, além de divulgação sobre a importância da pesquisa de conservação da anta brasileira e dos biomas do país, recursos importantes para uma próxima etapa do projeto: a expansão da pesquisa para a Amazônia. O IPÊ também poderá apoiar o retorno a campo de pesquisadores que estão reavaliando populações na área do Parque Estadual Morro do Diabo, na Mata Atlântica paulista, ponto inicial das pesquisas de Patrícia com a anta brasileira.

O maior mamífero terrestre da América do Sul, conhecido como jardineiro da floresta por sua capacidade de dispersar sementes e contribuir na manutenção das florestas tropicais, é um fóssil vivo e também tem muito a ensinar sobre resiliência e sobre o impacto humano no planeta. Lições fundamentais para o momento que estamos vivendo.

“É um animal que está há 50 milhões de anos na Terra, tem uma história evolutiva longa e é muito resiliente. No Cerrado, apesar de todos os impactos, ainda as encontramos no bioma. Com caça, atropelamento, agrotóxicos, e a população ainda está lá. Não sabemos por quanto tempo”, diz Patrícia. “As antas sobreviveram por fases evolutivas, inclusive de extinções em massa, porém por questões naturais. Agora, é a primeira vez que elas estão passando por uma situação de impacto antropogênico. É o ser humano que entrou na equação da resiliência deste animal. E não só as antas estão passando por isso agora.”

O primata paulista

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    Gabriela Rezende segura um mico-leão-preto, espécie que chegou as ser considerada extinta na natureza. Por seu trabalho de conservação, ela foi uma dos seis pesquisadores agraciados com o Whitley Award, a única das Américas. 

    Foto de Katie Garrett

    A bióloga Gabriela Rezende foi uma dos seis pesquisadores a receber o prêmio Whiltley Award neste ano e a única das Américas. Agraciada com o prêmio de 40 mil libras (cerca de R$ 270 mil) para financiamento de suas pesquisas, ela também teve seu trabalho no projeto Conservação do Mico-Leão-Preto reconhecido. Trata-se de uma iniciativa de longo prazo, uma das mais longevas do tipo no país, para recuperar o primata endêmico do estado de São Paulo. Quando o projeto se iniciou há 35 anos – com o primatólogo Claudio Pádua, um dos fundadores do IPÊ e também agraciado com um Whitley Gold Award – a população contava com cerca de 100 indivíduos. Até os anos 1970, depois de 65 anos sem ser registrada, a espécie era considerada extinta na natureza. Quando os animais foram finalmente avistados por cientistas em São Paulo, o projeto de conservação pode ter início, começando com a identificação do primata e com educação ambiental da comunidade.

    Gabriela Rezende herdou o projeto em 2011 e desde então trabalha em duas frentes. Uma delas é a recuperação de áreas degradas para conectar trechos de Mata Atlântica fragmentados no estado de São Paulo. A outra, a conservação e recuperação do mico-leão-preto, espécie que consta na categoria Em perigo de extinção da lista vermelha de espécies ameaçadas do União Internacional para Conservação da Natureza .

    Hoje, cerca de 1,8 mil indivíduos estão espalhados pelas matas do interior paulista. Um número maior que o da década de 1970, mas ainda pouco.

    Mico-leão-preto em trecho de Mata Atlântica no interior de São Paulo. Quando o projeto Conservação do Mico-Leão-Preto teve início na década de 1970, a espécie endêmica do estado de São Paulo contava com cerca de 100 indivíduos. Hoje, mais ou menos 1,8 mil estão espalhados pelas matas paulitas.

    Foto de Luis Palácios

    O financiamento do Whitley Award permitirá que Gabriela e a equipe do IPÊ criem mais corredores para conectar todas as populações de mico-leão-preto em uma área de floresta contínua de cerca de 45 mil hectares. Isso ajudará a prevenir contra a consanguinidade genética, já que os grupos ficam isolados nos fragmentos de vegetação.

    Em 2014 foi assinado um decreto que reconhece o mico-leão-preto como espécie símbolo da conservação do estado de São Paulo. Gabriela Rezende, que já publicou um livro em 2014 sobre a espécie, explica a importância da manutenção destes pequenos primatas na floresta: “Eles têm o papel de contribuir para a manutenção de uma Mata Atlântica que é a mais ameaçada do estado, a mais fragmentada de todas [no interior paulista]”, diz a pesquisadora.

    “A espécie é boa dispersora de sementes e uma floresta muito afetada ao longo dos anos, mas que ainda tem biodiversidade. Eles cuidam do ambiente para que os outros animais possam viver ali.”

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