O Sol está cada vez mais estranho, revela sonda que mergulhará na atmosfera solar

Os primeiros resultados da Sonda Parker Solar oferecem novas pistas para os grandes mistérios de nossa estrela, além de algumas observações inesperadas.

Por Nadia Drake
Publicado 16 de dez. de 2019, 14:33 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Ilustração da sonda Parker Solar se aproximando do Sol. Lançada em 2018, ela agora é o ...
Ilustração da sonda Parker Solar se aproximando do Sol. Lançada em 2018, ela agora é o objeto produzido pelo homem que chegou mais próximo de nossa estrela.
Foto de Illustration by NASA/Johns Hopkins APL/Steve Gribben

POR BILHÕES DE anos, o Sol escondeu seus segredos em um turbilhão de energia chamado coroa solar. Extremamente quente e ocasionalmente superviolento, esse agitado manto de plasma magnetizado que arde a milhões de graus é uma região que nenhuma nave espacial ousou explorar — até agora.

Quatro estudos publicados na revista científica Nature relatam os primeiros dados recolhidos pela Sonda Parker Solar da Nasa, uma missão inédita que chegou mais perto do que nunca do Sol, três vezes até agora, e conseguiu se aproximar de sua coroa solar. Essas três aproximações já foram suficientes para solucionar alguns mistérios de nossa estrela e revelam valiosas e inesperadas descobertas.

“Ela está fazendo aquilo que nenhuma espaçonave jamais fez,” diz Sarah Gibson, do Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas. “Mal posso esperar para ver o que está por vir — está superando todas as expectativas.”

Essas observações mais detalhadas desvendarão enigmas básicos da física solar e podem ajudar a prever com mais eficiência erupções solares nocivas direcionadas à Terra. Chamadas ejeções de massa coronal (EMC), essas perigosas nuvens de partículas extremamente energéticas produzem auroras cintilantes que podem fascinar até mesmo em céus de latitude média, mas também podem derrubar satélites de comunicação, redes elétricas e serem letais para astronautas.

“Quando as pessoas pensam nos perigos do espaço, costumam imaginar o meteoro que matou os dinossauros,” afirma o autor de um dos estudos, David McComas, da Universidade de Princeton. “Mas se acontecer um enorme evento climático espacial que elimine várias de nossas tecnologias, o risco torna-se muito maior para a nossa sociedade atual.”

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Uma missão para ‘tocar’ o Sol

Sonda Parker Solar foi lançada em agosto de 2018 e realizou seu primeiro sobrevoo solar em novembro do mesmo ano. Ao longo dos sete anos de missão, a sonda orbitará o Sol 24 vezes, aproximando-se mais a cada volta até que finalmente alcance uma distância de 6,4 milhões de quilômetros da superfície solar.

Com quatro instrumentos a bordo, a espaçonave explora a coroa solar, realiza medições da atmosfera do Sol e tenta mapear a origem do vento solar, que são nuvens de partículas energéticas aceleradas que o Sol emite continuamente. Chegar tão perto do Sol é crucial, dessa forma a sonda pode obter amostras de um vento solar puro e intocado, impossível de ser estudado da Terra.

“Até chegar a nós, já evoluiu, mudou e foi processado. Muito da estrutura e outros aspectos que poderiam fornecer informações sobre sua origem já foram distorcidos ou atenuados,” explica Gibson sobre o vento solar. “A Parker está mergulhando onde ele ainda está jovem e está fazendo observações onde está mais recente.”

Os cientistas já sabem que as emissões mais fortes e supersônicas se originam em buracos frios e magnéticos localizados na coroa solar. Porém, a origem dos ventos solares mais lentos e densos é um mistério, assim como a atmosfera extremamente quente do Sol. Enquanto a superfície da estrela arde a uma temperatura relativamente amena de 5,5 mil graus Celsius, a coroa externa atinge mais de 555 mil graus.

“O Sol possivelmente libera mais energia do que podemos ver,” afirma Justin Kasper, autor de um dos estudos, da Universidade de Michigan. “Na verdade, ele tem que descarregar essa energia. Portanto, precisamos encontrar algum mecanismo para lançar energia no espaço antes de ela ser depositada.”

Ondas rebeldes no mar solar

Entre as observações iniciais, talvez a mais surpreendente seja a das dramáticas ondas magnéticas que cruzam a atmosfera solar, aumentando instantaneamente a velocidade do vento em até 480 mil quilômetros por hora e, em alguns casos, causando uma completa reversão do campo magnético local.

“O vento está se movendo tão rápido e isso que vemos passar rapidamente é tão violento que, em menos de um segundo, inverte o campo magnético em 180 graus,” conta Kasper. “Nosso primeiro questionamento foi: que diabos é isso?”

Durante suas duas primeiras passagens, a Sonda Parker Solar encontrou cerca de mil ondas desse tipo, que são gigantescas localmente, mas muito pequenas para serem detectadas da Terra. Elas duram entre segundos e minutos, enlouqueceriam completamente uma bússola e não têm uma origem clara.

A equipe chama essas estruturas de reversões e alguns cientistas suspeitam que, se as ondas estão depositando energia, elas podem ser um dos motivos do superaquecimento da coroa solar. Contudo ainda não está claro qual a origem dessas esquisitices ou se elas ficarão mais fortes ou numerosas à medida que a sonda se aproximar do Sol.

Também é intrigante a velocidade lateral do vento solar. O Sol gira ao redor do próprio eixo uma vez a cada 24,5 dias terrestres e, ao se movimentar, a sua emissão em forma de barreira de partículas, inicialmente, gira junto. No momento em que o vento solar chega à Terra, seu percurso ocorre de forma radial, isto é, jorrando como água saindo de um aspersor de jardim.

Isso faz bastante sentido. Entretanto quando a Sonda Parker Solar passou sobre o hemisfério sul do Sol, mediu a velocidade de rotação do vento solar e descobriu que ele circunda a estrela muito mais rápido do que se imaginava ser possível a essa distância.

“É cerca de 20 vezes maior do que o modelo padrão do Sol e sua previsão de rotação,” diz Kasper. “Há algo muito fundamental sobre a coroa e o vento solar que ainda não sabemos.”

Ventos excessivamente rápidos podem afetar a velocidade com que as estrelas evoluem. Estrelas recém-nascidas giram rapidamente e desaceleram ao longo do tempo, perdendo energia na forma desses ventos. Embora não seja provável que nosso Sol vá queimar mais rápido do que o previsto, esses ventos estranhamente rápidos sugerem que a taxa de rotação da nossa estrela pode diminuir mais rapidamente conforme envelhece.

Com implicações mais imediatas, a surpreendente velocidade rotacional também pode estar afetando previsões sobre trajetórias e tempos de chegada das ejeções de massa coronal, isto é, os espasmos solares que podem extinguir a energia na Terra.

“Muitas vezes, as EMC fluem em direções inesperadas… Grandes fluxos laterais podem gerar previsões ruins sobre as ejeções de massa coronal”, relata Kasper. “Eu não diria que somos péssimos nisso, mas também não somos ótimos.”

Zona livre de poeira

À medida que a missão continua, a Sonda Parker Solar certamente revelará ainda mais surpresas. Por um lado, a espaçonave está prestes a detectar uma área ao redor do Sol há muito prevista, mas nunca observada, cujo calor é tão intenso que “nenhuma poeira conseguiria sobreviver,” afirma o autor de um dos estudos, Russell Howard, do Laboratório de Pesquisa Naval dos EUA. Essa área livre de poeira tem escapado da detecção desde que foi prevista em 1928 — mesmo durante eclipses solares, quando o ambiente próximo ao Sol é muito mais fácil de ser observado da Terra.

Conforme o ciclo solar começa a intensificar a partir dos 11 anos mínimos de duração, os cientistas esperam que a missão fique ainda mais interessante. Por fim, a expectativa da equipe é que a Sonda Parker Solar enfrente uma ejeção de massa coronal monstruosa — um evento que será cada vez mais provável à medida que o Sol for despertando de seu estado letárgico.

“Estamos torcendo pela ejeção de massa coronal mais forte e rápida que o Sol possa produzir,” diz o cientista do projeto Nour Raouafi do Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins. “Venha com tudo, por favor.”

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