Asteroide com maior chance de se chocar com a Terra, Bennu preserva elementos essenciais para a vida
As revelações da sonda OSIRIS-REx da Nasa estão despertando entusiasmo devido à sua expedição de amostragem, prevista para as próximas semanas.
O asteroide Bennu, próximo à Terra, é um pouco mais extenso e mais largo do que o prédio Empire State Building, nos Estados Unidos. É o asteroide com a maior probabilidade de se chocar contra a Terra nos próximos 150 anos dentre qualquer asteroide conhecido. Desde o fim de 2018, o veículo espacial OSIRIS-REx vem revelando os segredos de Bennu com pesquisas orbitais detalhadas.
DE LONGE, o asteroide Bennu tem o formato de um pião, com largura aproximada de 300 metros, flutuando pelo espaço. Mas agora os cientistas podem observá-lo de perto graças ao veículo espacial OSIRIS-REx da Nasa, pronto para coletar amostras da superfície do asteroide em 20 de outubro. As novas observações indicam que a superfície de Bennu — e suas origens — são mais ricas e complexas do que imaginado por qualquer cientista.
Em seis estudos publicados recentemente nos periódicos Science e Science Advances, a equipe do OSIRIS-REx apresenta novos dados de mapeamento em alta resolução, coletados desde a chegada do veículo espacial a Bennu em 2018. Juntos, os estudos apresentam novas informações sobre o menor corpo celeste já orbitado por um veículo espacial — dados que preenchem uma lacuna crucial nos conhecimentos dos cientistas sobre asteroides.
Os astrônomos conseguem mapear asteroides à distância por meio de telescópios, mas apenas áreas do tamanho de cidades ou estados. Meteoritos possíveis de serem examinados de perto pelos cientistas permitem estudos em pequena escala, embora suas revelações possam ser limitadas. “Essas medições contribuem para relacionar as duas escalas e nos ajudam a visualizar detalhes impossíveis de observar de outra forma”, afirma Andy Rivkin, cientista planetário do Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, que não participou dos estudos de Bennu.
Esse asteroide caótico, em especial, pode conter pistas sobre os últimos estágios da origem da vida e é por isso que a Nasa lançou o OSIRIS-REx em 2016 para coletar amostras em sua superfície. Bennu é mais um dentre uma série de asteroides conhecidos por conter moléculas orgânicas compostas por carbono — elementos essenciais para a vida como conhecemos na Terra — bem como minerais alterados na presença de água. Pesquisadores suspeitam que ao menos parte da água e das moléculas orgânicas existentes na Terra sejam provenientes de asteroides e, assim, há uma boa possibilidade de que objetos como Bennu tenham semeado as substâncias químicas necessárias à vida na Terra.
Bennu também representa um possível risco de segurança a nosso planeta natal. Sua órbita atravessa a da Terra e há aproximadamente uma chance em 2,7 mil de que possa colidir com nosso planeta no fim da década de 2100, o que reforça ainda mais a importância do estudo minucioso do asteroide.
O mapa global de Bennu obtido por espectroscopia no infravermelho destaca regiões ricas em materiais que contêm carbono, como moléculas orgânicas e minerais de carbonato (em vermelho). Os veios presentes em algumas das rochas sugerem a existência passada de fluxo de água no asteroide que originou Bennu durante os primórdios do sistema solar.
Origem com a presença de água
Embora muitas das rochas existentes em Bennu remontem à fase inicial do sistema solar, o próprio Bennu é um produto do caos mais recente. Pesquisadores acreditam que, há cerca de um bilhão de anos, uma grande colisão no cinturão de asteroides destruiu um objeto com cerca de 100 quilômetros de largura. O cataclismo produziu numerosos detritos e formou um grupo de asteroides menores, entre eles Bennu.
Quando o corpo celeste que deu origem a Bennu ainda era jovem, possuía calor suficiente para manter água na forma líquida em seu solo. Com o gotejamento dessa água pelo asteroide, minerais de carbonato lentamente foram depositados nas fissuras pelas quais a água passou. Posteriormente, quando Bennu foi esculpido pela gravidade a partir dos escombros do corpo celeste que lhe deu origem, alguns desses veios minerais primordiais se mantiveram intactos no interior de rochas agora espalhadas pela superfície de Bennu.
O maior desses veios de carbonato já observado possui comprimento superior a 90 centímetros. A largura e o tamanho dos veios implicam que, por milhares — talvez milhões — de anos, o corpo celeste que originou Bennu dispunha de uma quantidade considerável de atividade hidrotérmica.
“É esse o motivo da exploração com veículo espacial”, afirma Hannah Kaplan, membro da equipe do OSIRIS-REx, coautora do estudo e cientista planetária do Centro Goddard de Voos Espaciais da Nasa. “Essas observações não eram esperadas, pois não é possível visualizá-las da Terra e é preciso orbitar muito próximo do asteroide para tanto.”
Os veios de carbonato foram identificados quando o OSIRIS-REx reuniu uma enorme quantidade de dados em alta resolução. Rivkin observa que um instrumento a bordo do veículo espacial captou imagens da composição da superfície do asteroide em uma resolução suficiente para visualizar uma área equivalente a uma quadra de basquete. Um instrumento mapeou a variação de cores de Bennu em uma área tão pequena quanto uma folha de papel — e outro até mesmo captou imagens da superfície de Bennu no tamanho de um selo postal.
Ilustração do veículo espacial OSIRIS-REx da Nasa prestes a coletar uma amostra do asteroide Bennu.
Pequena rocha espacial peculiar
Bennu é um asteroide poroso formado por uma “pilha de escombros” mantidos relativamente próximos por sua própria gravidade fraca, correspondente a menos de oito milionésimos da gravidade existente na Terra. Essas características fazem com que a exploração desse curioso objeto seja semelhante a uma aventura no País das Maravilhas.
Em sua órbita ao redor do asteroide, o OSIRIS-REx revelou inúmeras características inesperadas. Por exemplo, foram observados estranhos “estalos de rochas” a partir da superfície de Bennu, provavelmente devido ao aquecimento pelo Sol. O veículo espacial até identificou fragmentos de outro asteroide, o Vesta, entre as rochas cor de piche de Bennu ao coletar rochas que continham um conjunto de minerais característicos do Vesta.
Nos novos estudos, os pesquisadores encontraram dois tipos distintos de rochas na superfície: um mais forte e outro mais fraco. Também foram detectadas variações sutis na cor do asteroide, na capacidade de retenção térmica, na densidade local e na superfície de seus hemisférios norte e sul. Esses fatores podem servir como indicativo da formação e dos desgastes de Bennu ao longo do tempo no vácuo do espaço.
O OSIRIS-REx confirmou a existência de moléculas orgânicas que contêm carbono em quase toda a superfície de Bennu. Com base em evidências obtidas em meteoritos, os cientistas suspeitavam há muito tempo que Bennu possuísse uma abundância dessas moléculas. Mas a confirmação dessa teoria só reforça a importância de concretizar a tentativa de amostragem denominada “pouso e partida imediata” do OSIRIS-REx em 20 de outubro.
O traiçoeiro local de amostragem, apelidado de Nightingale, possui uma rocha com altura de três andares e largura aproximada de 14 metros (no centro da imagem) denominada Monte Doom (“perdição”, em português).
Em uma simulação, o braço de amostragem da sonda OSIRIS-REx é abaixado até perto da superfície de Bennu. O objetivo da manobra “pouso e partida imediata” é perfurar e coletar amostras com peso entre 60 gramas e dois quilos de materiais.
Em menos de duas semanas, a sonda pousará no ponto de aterrissagem de uma cratera denominado “Nightingale” (“rouxinol”, em português), uma das diversas formações geológicas no asteroide que receberam dos cientistas nomes de aves. Em apenas alguns segundos, o veículo espacial coletará ao menos 60 gramas de grãos e fragmentos de rochas do asteroide. O OSIRIS-REx então deixará a superfície e retornará à Terra, com chegada prevista para 2023.
“É provável que qualquer amostra coletada em qualquer local contenha minerais hidratados e materiais com certo teor de carbono”, afirma Amy Simon, membro da equipe do OSIRIS-REx, coautora do estudo e cientista sênior do Centro Goddard de Voos Espaciais da Nasa.
Planejar a manobra de “pouso e partida imediata” se revelou uma tarefa complexa. O OSIRIS-REx foi projetado com o pressuposto de que a superfície de Bennu fosse recoberta de grãos finos. No entanto é coberta de rochas com o tamanho de pequenas construções. Para traçar uma rota com segurança até sua superfície, o asteroide precisou ser completamente mapeado pelos pesquisadores com uma precisão de vários centímetros e o software de navegação do veículo espacial teve até mesmo de ser atualizado no meio da missão.
A menos de duas semanas dessa tentativa decisiva de amostragem, os cientistas da OSIRIS-REx estão entusiasmados.
“Ainda não estou nervosa — mas, quando chegar o dia, será outra história”, brincou Simon. “Até bato na madeira, pois tem sido uma experiência incrível.”