Brasil lidera lista de assassinato de ativistas ambientais em 2017

Ano passado foi o mais mortal para defensores do meio ambiente em todo mundo, aponta estudo. Maioria das mortes foi ligada ao agronegócio.

Por Elaina Zachos
Publicado 27 de jul. de 2018, 15:48 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um pedaço de terra desmatada divide a Floresta Amazônica, no Brasil, o país mais mortal para ...
Um pedaço de terra desmatada divide a Floresta Amazônica, no Brasil, o país mais mortal para ativistas ambientais.
Foto de Raphael Alves, AFP, Getty Images

Como alguns ativistas ambientais, a enfermeira e antropóloga Isela González arrisca sua vida todos os dias.

"Uma vez, do lado de fora de um julgamento, alguém se aproximou e me ameaçou de morte por ajudar comunidades indígenas", recorda González, que é diretora executiva da organização não-governamental pró-indígena Alianza Sierra Madre. "Com essas mortes, eles querem causar terror não apenas nas comunidades indígenas, mas naqueles que os ajudam também".

As vidas de incontáveis manifestantes pacíficos estão em perigo todos os anos em disputas ambientais e por terra, e um novo estudo diz que mais de 200 pessoas foram mortas no ano passado. Isso torna 2017 o ano mais mortal até agora.

"Isso me afeta moral e fisicamente", diz González. "Mas, ao mesmo tempo, o desejo por justiça e reparação pelos defensores caídos, por suas famílias e, acima de tudo, para que isso nunca mais aconteça, é uma energia que te obriga a continuar trabalhando".

Vítimas mortais

De acordo com a organização ambientalista internacional Global Witness, em 2017 houve um total de 207 assassinatos de ativistas ou defensores do meio ambiente. Isso é mais do que em 2016, tornando 2017 o ano mais mortal já registrado.

A agroindústria, que é qualquer negócio que lucre com a agricultura, teve o maior número de mortes associadas a ela, com 46 ativistas assassinados em disputas relacionadas a projetos agrícolas de grande escala. A agroindústria foi seguida pelas indústrias petrolífera e mineira, que historicamente têm sido o campo mais perigoso para ativistas, com 40 mortes. A caça ilegal e o desmatamento ficaram em terceiro lugar, com 23 mortes em cada.

"Nossas estatísticas representam apenas a ponta do iceberg", diz Ben Leather, principal pesquisador do estudo e ativista experiente na Global Witness. "Devido às dificuldades em reportar e verificar, os números, com certeza, são mais altos".

A Global Witness utilizou conjuntos de dados de fontes nacionais e internacionais, como os relatórios anuais e outras informações públicas. A organização incluiu apenas mortes comprováveis no relatório, verificando informações como os nomes dos defensores e suas causas de morte.

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    O total de mortes foi provavelmente muito mais alto, diz Leather, devido à falta de informações. Não foram encontrados números para países com liberdade de expressão restrita, como a China, a Rússia e algumas partes da Ásia Central. A África, diz o estudo, tinha relatórios enganosamente baixos, o que poderia ser em razão de assassinatos não documentados.

    Cerca de 60% dos assassinatos ocorreram na América Latina. Em geral, o Brasil foi o mais mortal, com 57 assassinatos. As Filipinas tiveram 48 mortes - o número mais alto registrado em um país asiático - e a taxa de mortalidade dos defensores do México aumentou cinco vezes, de três mortes em 2016 para 15 em 2017. (Confira a íntegra do estudo aqui, em PDF)

    De acordo com o estudo, 30 mortes foram relacionadas ao exército e 23 à polícia. Gangues, seguranças, fazendeiros, caçadores e outros agentes não estatais haviam cometido pelo menos 90 assassinatos.

    "A corrupção é um grande problema aqui", diz Leather. "Os funcionários que deveriam defender os direitos dos ativistas são cúmplices nesses ataques".

    Contrário ao restante do estudo, Honduras mostrou uma tendência oposta. O país da América Central teve menos mortes de ativistas ambientais do que nos anos anteriores, mas a sociedade está mais reprimida do que nunca.

    "Há uma série de táticas utilizadas para silenciar os defensores e os assassinatos representam apenas um lado da história", diz Leather.

    Além dos assassinatos individuais, em 2017 aconteceram mais massacres de defensores do que em qualquer outro ano. Em ao menos sete casos, mais de quatro defensores foram mortos de uma só vez, o que mostra que os agressores estão se sentindo mais encorajados, diz Leather. No passado, os assassinatos raras vezes foram julgados.

    "O relatório vai muito além de apenas dados", diz Leather. "Trata-se de uma cultura generalizada de impunidade que está permitindo a violência".

    Olhando para frente

    Apesar dos riscos, os defensores ambientais continuam lutando.

    "Eu continuo porque é meu trabalho. Abandonar essas comunidades, abandonar meu trabalho, seria desistir diante do terror e das ameaças", diz González Díaz. "Sim, é claro que eu tenho muito medo, mas todos os defensores possuem mecanismos para se defender. Nós nos preparamos para isso. Acho que é a maior decisão que a pessoa pode tomar."

    Em muitos desses campos, as decisões dos compradores têm um impacto, diz a Global Witness. Os consumidores podem escrever para as empresas e pedir para que garantam que a população local esteja sendo respeitada em toda a cadeia de fornecimento. As pessoas também podem pedir a seus representantes que pressionem os países para que eles julguem esses crimes.

    No agronegócio, uma planta particularmente controversa é a palmeira que dá origem ao azeite de palma. Florestas foram derrubadas para abrir espaço para plantações de palmeiras oleaginosas, e seu óleo comestível está em metade dos produtos embalados do mercado, do chocolate e da margarina ao sorvete, shampoo e batom.

    "Se você consome produtos com azeite de palma, você pode escrever para a empresa e perguntar exatamente o que eles estão fazendo para resolver esse problema", diz Leather.

    Outros cultivos que contribuíram para disputas de terra incluem café, açúcar e frutas, como bananas e abacaxis. A mineração e o desmatamento, que ainda são campos perigosos para defensores ambientais, contribuem para produtos que vão de eletrônicos a móveis.

    "Muito mais tem que ser feito se quisermos reverter essa tendência", diz Leather. "As pessoas não deveriam morrer ou serem ameaçadas apenas por protegerem suas terras e o meio ambiente. Se pudermos nos posicionar, espero que possamos persuadir nossos governos e empresas a fazerem o mesmo".

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