Transição energética: conheça o novo método para produzir hidrogênio industrialmente
O hidrogênio é o elemento químico mais abundante do planeta.
No contexto de transição energética e descarbonização da economia, o hidrogênio posiciona-se como um dos protagonistas. A produção de hidrogênio para fins energéticos é um campo que mobiliza vários países.
O investimento na produção de hidrogênio de baixo carbono está aumentando. A Espanha, por exemplo, está liderando 20% dos novos projetos de hidrogênio do mundo durante o primeiro trimestre de 2022. Durante esse período, os projetos relacionados ao hidrogênio aumentaram sua produção, totalizando 11,1 milhões de toneladas por ano, segundo dados da Wood Mackenzie, empresa de pesquisa e consultoria que promove recursos naturais.
"Só para contextualizar, o consumo atual da China é de 20 milhões de toneladas de hidrogênio. Essa é a mesma quantidade que a Europa precisa produzir em 2030 para substituir o gás russo", diz Africa Castro, chefe de desenvolvimento de negócios da H2B2, no podcast H2.
O que é hidrogênio verde e azul?
O hidrogênio é o elemento químico mais simples – formado por um próton e um elétron – e o mais abundante do planeta. No entanto, não está disponível em nenhum depósito, mas deve ser obtido de outros elementos que o contenham. É encontrado como um gás em estrelas e planetas gasosos, e também ligado a outros compostos químicos, como água e outros compostos orgânicos.
Portanto, o hidrogênio não é um combustível que pode ser obtido diretamente da natureza, mas deve ser "fabricado", e é classificado por cor de acordo com a pureza de sua obtenção. O mais limpo é o chamado hidrogênio verde, que é produzido a partir de fontes renováveis de energia e representa 80% de todos os projetos realizados de 2018 a 2021. O restante foram projetos de hidrogênio azul, que são extraídos do gás natural.
Rumo à produção sustentável
Agora, uma equipe internacional de cientistas desenvolveu um novo reator eletrificado para obter hidrogênio de maneira mais sustentável e energeticamente eficiente. O estudo foi publicado na revista científica Science. "Esta é a primeira vez que foi demonstrado que esta tecnologia permite a obtenção de hidrogênio industrialmente", destaca a pesquisa.
(Você pode se interessar por: O que é o mercado de carbono e como o Brasil pode se beneficiar com ele)
“Conseguimos produzi-lo com membranas cerâmicas, o que é muito inovador, em escala e a partir de fontes como amônia, biogás e gás natural”, explica Sonia Remiro Buenamañana, pesquisadora de pós-doutorado do Instituto de Tecnologia Química (UPV- CSI).
A equipe, composta pelo Instituto de Tecnologia Química (ITQ), um centro conjunto do Conselho Superior de Pesquisa Científica (CSIC) e da Universidade Politécnica de Valência (UPV), todos da Espanha, "combinou com sucesso 36 membranas cerâmicas individuais em um escalável e gerador modular que produz hidrogênio a partir de eletricidade e diversos combustíveis, com perda de energia quase nula”, explicam.
Cerâmica de prótons: rumo à energia limpa
Os resultados do trabalho são promissores para setores como o transporte terrestre e marítimo, bem como para outros mercados e seu uso industrial. O estudo usa energia elétrica para extrair hidrogênio de outras moléculas com eficiência energética excepcional e mostra pela primeira vez que a tecnologia de cerâmica de prótons "pode ser usada para criar dispositivos de hidrogênio escaláveis que abrem caminho para a fabricação industrial em massa".
Enquanto outras energias limpas, como a solar ou a eólica, são intermitentes. O hidrogênio tem a vantagem de poder ser distribuído e armazenado com mais facilidade. “Esse sistema permitirá que a energia seja armazenada na forma de moléculas de alta densidade energética com teor de hidrogênio, respondendo ao problema da intermitência das fontes renováveis”, explica Remiro.
O projeto permitiu dimensionar um reator eletrificado para atingir uma produção de cerca de meio quilo de hidrogênio pressurizado por dia, por eletro compressão, com pureza muito alta e eficiência energética máxima, acima de 90%. Outra grande descoberta da equipe é que “é possível trabalhar com esse tipo de tecnologia a 150 bar de pressão”.
Além disso, com esse sistema, o dióxido de carbono (CO2) que é produzido no processo não é emitido para a atmosfera, mas é transformado em um fluxo pressurizado que permite seu posterior uso ou armazenamento, o que pode ser fundamental para a descarbonização
“A eficiência energética é a chave para o futuro do hidrogênio”, diz Irene Yuste, engenheira química da CoorsTek Membrane Sciences, empresa que participou do estudo, e estudante de doutorado na Universidade de Oslo, coautora do estudo.
Máxima eficiência energética
“Quando a energia é transformada de uma forma para outra há uma perda de energia”, explica José Manuel Serra, professor investigador do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC) no ITQ e co-autor principal do trabalho.
“Com nossas membranas cerâmicas de prótons, podemos combinar diferentes etapas da produção de hidrogênio em um único estágio, onde o calor para a produção catalítica de hidrogênio é fornecido pela separação eletroquímica de gás para formar um processo termicamente equilibrado. O resultado é o hidrogênio feito com perda de energia quase nula”, destaca.
Essas membranas operam em altas temperaturas, entre 400 e 800 graus Celsius, decompondo o hidrogênio em suas partículas subatômicas (prótons e elétrons) e transportando os prótons através de um eletrólito cerâmico sólido.
Segundo os especialistas, para alcançar estes resultados, foi seguida uma estratégia de inovação aberta, que visa “libertar conhecimento e promover a maturidade desta tecnologia disruptiva”. Por enquanto, o próximo passo será “instalar um protótipo de gerador de hidrogênio autônomo no campus da sede da Saudi Aramco em Dhahran, Arábia Saudita”, mas é apenas mais um passo no desenvolvimento do hidrogênio como mais uma ferramenta de transição energética.