Tubarão “vegetariano” surpreende cientistas

Ele ainda pode jejuar por meses consecutivos. Mas por quê?

Por Christie Wilcox
Publicado 12 de fev. de 2019, 11:45 BRST, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Um novo estudo descobriu que tubarões-baleia não são totalmente carnívoros.
Um novo estudo descobriu que tubarões-baleia não são totalmente carnívoros.
Foto de Brian J. Skerry, Nat Geo Image Collection

Tubarões-baleia são os maiores peixes do mar e, como filtradores, eles não têm a mesma reputação sanguinária de seus parentes. Ainda assim, são tubarões e, por isso, normalmente acredita-se que esses gigantes gentis dependam quase que exclusivamente de proteína animal.

Pois não foi isso que descobriu novo estudo publicado este mês no periódico Ecological Monographs. Uma pesquisa criteriosa de amostras de sangue e tecido de mais de uma dezena de tubarões-baleia sugere que, na verdade, eles têm uma dieta bem onívora composta de plantas e algas.

A equipe da pesquisa, liderada por Alex Wyatt, biólogo da Universidade de Tóquio, utilizou um conjunto de amostras de tubarões de cativeiro e da natureza para desmistificar os hábitos alimentares desses enigmáticos viajantes dos oceanos. Embora estudos anteriores tenham encontrado algas marinhas nos estômagos de tubarões-baleia, esse é o primeiro estudo a sugerir que eles possam ingerir essas algas como base de sua dieta.

Assista a um mergulhador desenroscar uma corda do pescoço de um tubarão-baleia
O mergulhador e sua família encontraram o animal em perigo na costa de uma das ilhas do Havaí enquanto nadavam.

“Tubarões-baleia são criaturas muito carismáticas ameaçadas de extinção globalmente, mas ainda não sabemos o bastante sobre sua ecologia para uma conservação eficiente”, conta Wyatt à National Geographic. “Estou muito animado em contribuir para um maior entendimento da espécie”.

Estudar o que um animal ingere é “fundamental”, afirma Alistair Dove, biólogo de tubarões-baleia e vice-presidente de pesquisa e conservação do Aquário da Geórgia, em Atlanta, mas “isso também é importante para definir o tipo de modelos populacionais necessário para a iniciativa de desenvolvimento de planos inteligentes de conservação de uma espécie ameaçada.”

Os responsáveis pela tomada de decisões de conservação precisam de informações concretas sobre os hábitos da espécie, como dados de movimentação de indivíduos e suas necessidades alimentares, a fim de determinar as melhores formas de protegê-la. Estudos com etiquetas de identificação esclareceram o aspecto da movimentação, porém é quase impossível seguir esse peixe que se movimenta de forma inconstante para verificar o que está comendo. E é por isso que a abordagem de Wyatt e sua equipe é tão fascinante—ela utiliza amostras de sangue e outros tecidos que podem ser coletados oportunamente para averiguar o que um animal anda comendo.

“É uma grande contribuição sobre a alimentação e a dieta dos tubarões-baleia”, afirma Clare Prebble, cientista sênior da Marine Megafauna Foundation [Fundação Megafauna Marinha, em tradução livre].

Estilo de vida de abundância ou de fome

Para determinar o que os animais comem, a equipe de pesquisa mediu as diferentes formas, ou isótopos, de átomos importantes como nitrogênio e carbono nas amostras de sangue e tecidos. A proporção desses isótopos é diferente para cada fonte de alimento, como algas, zooplâncton e peixes, então a análise dos índices desses átomos nos tecidos dos tubarões pode fornecer aos pesquisadores muitas informações sobre o que os animais estão comendo.

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    Entretanto essa análise pode enganar. Embora os isótopos estáveis sejam utilizados frequentemente para prever as dietas de animais, o método geralmente baseia-se em pressupostos de como os animais processam os nutrientes de seus alimentos. Mas esse estudo pôde contar com cinco tubarões-baleia de cativeiro com dietas conhecidas do Aquário Okinawa Churaumi para comparar com os dados de oito animais na natureza. “É uma grande quantidade de estudos que aproveita o que de fato podemos aprender com animais de aquários e que se aplica ao que queremos saber sobre essa mesma espécie em seu habitat natural”, afirma Dove.

    Como os mamíferos marinhos de onde vem seu nome, os tubarões-baleia são enormes. Eles podem chegar a uma média de 12 metros de comprimento e a um peso médio de 22 mil quilogramas. O bom senso diz que seria necessário muito alimento para sustentar tanta massa corporal — e é verdade. Entretanto os pesquisadores verificaram que os animais também podem passar quatro meses ou mais sem comer. É provável que isso se deva ao fato de que eles não comem enquanto se movimentam, afirma Wyatt — talvez por não haver nada pelo que valha a pena parar no caminho.

    O jejum prolongado faz muito sentido quando se leva em conta o ambiente dos animais, explica Prebble. “A disponibilidade de alimento em mar aberto é muito inconstante, então seria uma boa estratégia eles se refestelarem quando o alimento é abundante e depois usar essa energia para se manter durante períodos de viagem ou para procurar o próximo banquete de frutos do mar”, afirma ela.

    Porém nem todos os animais mostraram sinais de grandes períodos de jejum entre refeições. Houve grande variação entre indivíduos, algo que Prebble e Dove acharam intrigante. Isso pode sugerir que certos tubarões podem se especializar em se alimentar em determinadas áreas ou no consumo de alimentos específicos. E, de modo geral, tudo indica que consomem uma variedade maior de alimentos do que o constatado.

    Comer tanto quanto puder

    Segundo os dados de Wyatt, os animais estão obtendo ao menos metade de seus nutrientes a partir de plantas e algas. Então por que os tubarões-baleia consumiriam uma quantidade tão grande de materiais de algas? Há algumas possíveis explicações.

    “Não está claro se é realmente benéfico ou até mesmo uma escolha feita pelos tubarões-baleia”, pondera Wyatt. “Contudo é plausível que materiais de algas possam ser uma fonte de alimento quando outras presas ficam escassas.”

    “Faz sentido tubarões-baleia poderem ingerir grande quantidade de matéria vegetal, uma vez que seu método de alimentação separa as partículas de acordo com o tamanho e não de acordo com a espécie”, afirma Dove. Foi o que concluiu um estudo de 2013  quando os pesquisadores notaram que algas marinhas geralmente são encontradas nos estômagos de tubarões-baleia. No entanto esses novos dados revelam que os animais estão utilizando muitos nutrientes provenientes das algas que consomem, o que pode sugerir que uma dieta mais vegetariana não é acidental.

    Para determinar se tubarões-baleia são onívoros acidentais ou intencionais, os pesquisadores terão de verificar se os animais buscam áreas com algas mesmo com a presença de possíveis alimentos à base de animais. Eles também precisarão estudar a eficiência com que tubarões-baleia aproveitam nutrientes das algas. Foi o que fizeram os biólogos quando continuaram encontrando grama marinha nos aparelhos digestórios de tubarões-de-pala e, para a surpresa deles, descobriram que os animais de fato digerem a grama graças às enzimas especiais de seu estômago.

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