Esses filhotes de sapo nascem das costas da mãe — e outras maneiras surpreendentes de dar à luz

Os mamíferos não estão sozinhos — alguns répteis, anfíbios e insetos dão à luz filhotes vivos.

Por Jake Buehler
Publicado 24 de jun. de 2020, 08:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 01:56 BRT
Um sapo-do-suriname, da espécie Pipa pipa, no zoológico de Saint Louis. Os filhotes dessa espécie nascem ...

Um sapo-do-suriname, da espécie Pipa pipa, no zoológico de Saint Louis. Os filhotes dessa espécie nascem de orifícios nas costas de sua mãe.

Foto de Joël Sartore, National Geographic Photo Ark

DAS MUITAS maneiras de nascer, o parto pode ser o mais familiar para os humanos. Nós, mamíferos, damos à luz bebês que se contorcem ao nascer e imaginamos que diversos outros animais apenas botam ovos. Contudo, eles encontraram diferentes maneiras de trazer seus filhotes ao mundo.

O nascimento vivo, também conhecido como viviparidade, é comum em todo o mundo animal, e não apenas entre os mamíferos. Surgiu em peixes, anfíbios, insetos e aracnídeos, para citar alguns.

De fato, a viviparidade evoluiu de forma independente cerca de 150 vezes em várias espécies animais, incluindo pelo menos 115 vezes em répteis vivos, um número três vezes maior do que em todos os demais vertebrados combinados, afirma Henrique Braz, herpetólogo do Instituto Butantan em São Paulo, Brasil.

Existem vantagens — e desvantagens — em botar ovos e gestar vida, mas nenhum animal é obrigado a escolher apenas um dos métodos. A postura de ovos e a gestação são dois pontos em uma sequência, com muitas espécies ocupando posições intermediárias.

No meio do caminho

Todas as mães precisam fazer uma coisa por seus filhos: fornecer nutrientes. Isso assume a forma do vitelo no ovo ou, para animais que possuem gestação, geralmente ocorre diretamente do corpo da mãe. (No caso único dos cavalos-marinhos, é o corpo do pai que alimenta os filhotes.)

Algumas espécies conseguem dar à luz filhotes vivos, mas a mãe contribui com pouco ou nenhum nutriente dentro do útero. Elas fazem isso mantendo os filhotes em ovos dentro do corpo da mãe, permitindo que cresçam e se desenvolvam utilizando o vitelo como fonte de alimento. Assim, quando os filhotes estão completamente formados e prontos para sair, eclodem dentro de sua mãe no processo de nascimento.

Esse tipo de reprodução, conhecido como ovoviviparidade, é comum entre cobras venenosas chamadas víboras, embora não entre a maioria das outras cobras que depositam ninhadas de ovos. Há também vários peixes — como as molinésias e os lebistes — que se reproduzem dessa maneira.

Um dos exemplos mais surreais é o sapo-do-suriname (Pipa pipa), um anfíbio que se parece com uma folha, de corpo excepcionalmente plano, encontrado nas florestas tropicais da América do Sul. Durante o acasalamento, o macho deposita dezenas de ovos fertilizados nas costas da fêmea e, em seguida, sua pele cresce ao redor dos ovos, criando uma superfície semelhante a um plástico-bolha invertido. Os filhotes se desenvolvem nesses pequenos úteros por meses. Em algum momento, eles eclodem das costas da mãe e se dirigem para a água como pequenos e jovens sapos, ignorando completamente o estágio de girino.

Por que um processo tão inusitado? Como outras espécies ovovivíparas, o sapo-do-suriname protege seus ovos ao carregá-los por aí — uma estratégia interessante em um mundo repleto de predadores famintos por ovos.

Jantando em casa

A maioria dos vivíparos fornece a seus filhotes alguma forma de subsistência direta.

Nos mamíferos, isso é comum. Mas o sapo-nimba da África Ocidental, uma espécie criticamente ameaçada (Nimbaphrynoides occidentalis), é o único sapo alimentado inteiramente com os recursos de sua mãe no útero. Sapos-nimba fêmeas têm uma gestação de nove meses e alimentam seus fetos com um nutritivo “leite uterino”.

Existem até algumas mães vivíparas que usam a criatividade para nutrir seus filhotes durante a gravidez. A mosca tsé-tsé africana (Glossina morsitans) carrega uma única larva no útero, que é alimentada com um tipo de “leite” secretado por uma glândula especial. A barata-besouro do Pacífico (Diploptera punctata) dá à luz filhotes miniaturizados totalmente formados, após alimentá-los com um elixir uterino semelhante.

O fenômeno dos fetos que se alimentam dentro do útero pode ficar ainda mais estranho. Alguns cecilianos vivíparos — anfíbios semelhantes a minhocas que vivem a maior parte do tempo enterrados ou no leito de riachos — na verdade se alimentam da mãe enquanto estão dentro dela. Lá, eles raspam e ingerem o revestimento espessado de seu oviduto, canal que conduz os ovos a partir do ovário.

E a situação pode ficar ainda mais medonha. Diversas espécies de tubarões carregam uma batalha embrionária no útero, com filhotes que matam e se alimentam de seus irmãos para sobreviver.

Um vínculo mais profundo

Alguns animais vão ainda mais longe, interligando seu próprio sistema circulatório com o de seus filhotes em desenvolvimento, nutrindo-os e removendo produtos de excreção por esse método. Esse processo pode assumir a forma de um órgão especializado e temporário, como uma placenta. Embora a placenta esteja normalmente associada a mamíferos “placentários”, como os humanos, gatos, cães e baleias, esses grupos não são os únicos a possuírem o órgão.

“Na verdade, o órgão não é composto apenas dos tecidos da mãe ou do bebê”, diz Camilla Whittington, bióloga evolucionária da Universidade de Sydney. Tecnicamente, qualquer órgão constituído por tecidos maternos e fetais que transporte nutrientes é conhecido como placenta. Até os marsupiais, mamíferos que carregam seus filhotes em bolsas, possuem placentas rudimentares. E a placenta também evoluiu em alguns grupos inesperados.

Por exemplo, os tubarões-bico-fino (Rhizoprionodon) nutrem os fetos com um órgão que se parece exatamente com uma versão reduzida da placenta humana, diz Whittington. Existem também algumas espécies de lagartos que desenvolvem uma ligação placentária com os filhotes, embora o lagarto africano Trachylepis ivensi seja a única espécie de réptil cujos embriões conseguem se enterrar na parede do oviduto, aproximando-se do grau de implantação observado na gestação de mamíferos.

Esforço que vale a pena

A viviparidade claramente não é uma condição que exige tudo ou nada, mas uma na qual há flexibilidade. Por exemplo, alguns lagartos e cobras botam ovos em determinada parte de sua região de ocorrência, mas são vivíparos em outra. Os cientistas até observaram um lagarto botar ovos e dar à luz filhotes vivos em uma mesma ninhada.

Mas, afinal, por que a viviparidade precisou evoluir? Definitivamente, existem algumas desvantagens.

“Se você perguntar a qualquer mulher grávida quando ela estiver a duas semanas do parto, ela dirá que é bastante difícil se movimentar”, diz Whittington. “E no caso de um lagarto gestante que está muito grande, dá para imaginar como seria difícil escapar de predadores.”

Carregar internamente um filhote em desenvolvimento também aumenta os riscos se a mãe for devorada. Pelo menos, se os ovos foram depositados em outro lugar, há uma chance de a linhagem genética sobreviver, mesmo que a mãe morra.

Contudo manter os filhotes no interior do corpo por mais tempo pode ajudar a protegê-los e permite um controle mais direto das condições de desenvolvimento, como a temperatura. Pode ser por isso que em regiões frias é encontrada uma proporção maior de espécies vivíparas do que em locais mais quentes.

“Se um animal vive em um clima frio ou variável e simplesmente deixa seus ovos no ninho e se afasta, é possível que o frio excessivo seja um problema”, diz Whittington.

Quaisquer que sejam as vantagens que as mães vivíparas obtêm com a gestação e o nascimento, essa habilidade evoluiu inúmeras vezes em todo o reino animal — e isso sugere que o esforço extra deva valer a pena.

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