Animais selvagens utilizam a eletricidade de formas chocantes

Muitos bichos, como enguias-elétricas e equidnas, utilizam correntes elétricas para se comunicar, encontrar presas e se defender.

Por Lavanya Sunkara
Publicado 22 de mai. de 2021, 07:00 BRT

As enguias-elétricas (que não são enguias verdadeiras) podem gerar mais de 800 volts para atordoar presas.

Foto de George Grall / NAT GEO IMAGE COLLECTION

Uma força invisível da natureza, a eletricidade está por toda parte. Os humanos geram campos elétricos fracos a cada movimento dos músculos, por exemplo. Mas alguns animais impressionantes se sobressaem neste aspecto, tendo desenvolvido uma capacidade de se comunicar, se defender e encontrar alimento por meio da eletricidade.

A maioria dessas criaturas vive em ecossistemas de água doce, recorrendo à eletricidade para compensar uma visão deficiente ou a falta de visibilidade em águas turvas. Aproximadamente 350 espécies de peixes — incluindo a notória enguia-elétrica — possuem estruturas anatômicas que podem gerar até impressionantes 860 volts de energia. A título de comparação, um choque causado pela tomada de uma residência comum gera cerca de 120 volts.

Criaturas de água salgada, como tubarões, arraias e até mesmo uma espécie de golfinho, também dispõem de órgãos sensoriais especiais para caçar embaixo d’água. Embora menos comuns, animais terrestres como a mamangava, o ornitorrinco e a equidna se valem da eletricidade para se alimentar e se comunicar.

Eletrogênese e eletrorrecepção

Os animais usam a eletricidade de duas maneiras diferentes: eletrogênese (gerando pulsos elétricos) e eletrorrecepção (detectando esses pulsos).

“Animais eletrogênicos geram eletricidade e a enviam para fora de seus corpos”, afirma Jack Cover, curador geral de exposições vivas do Aquário Nacional em Baltimore, Maryland.

Algumas dessas espécies são as enguias-elétricas, arraias-elétricas, bagres-africanos e peixes-elefante, todos os quais emitem descargas de alta voltagem para incapacitar as presas.

Animais eletrorreceptivos, por outro lado, podem detectar campos elétricos fracos gerados por presas. Quando um campo elétrico atinge um objeto vivo, é criada uma distorção que pode ser sentida por um animal eletrorreceptivo.

“Essa distorção pode lhes informar a localização ou até mesmo o tamanho de obstáculos, presas ou predadores”, explica George Parsons, diretor de planejamento animal e operações de mergulho no Aquário Shedd, em Chicago.

Os tubarões são eletrorreceptores, procurando presas por meio de órgãos denominados ampolas de Lorenzini, concentrados em torno de suas cabeças.

“Eles podem sentir movimentos musculares, pois estes emitem campos elétricos, especialmente movimentos drásticos”, conta Parsons. Assim, um peixe doente agitando-se aflito, por exemplo, é logo encontrado por um tubarão.

Alguns animais eletrogênicos, como enguias-elétricas e peixes-elefante, também podem ser eletrorreceptivos, utilizando uma pequena fração de sua capacidade elétrica para detectar outros animais em seu ambiente durante a caça. No entanto existem muitos animais eletrorreceptores que não são eletrogênicos.

Águas turvas

Para muitos animais que se deslocam em ambientes turvos de água doce, correntes elétricas carregadas são tão importantes quanto a cor ou o som para os humanos.

Por exemplo, o habitat da enguia-elétrica — a Amazônia, na América do Sul, e as bacias do rio Orinoco — contém grandes quantidades de sedimentos provenientes da paisagem em constante alteração.

Por isso, esses animais com quase 2,5 metros de comprimento — que, na realidade, são peixes em forma de enguia pertencentes à família Apteronotidae — são eletrogênicos e eletrorreceptivos. A espécie possui três órgãos sensoriais localizados ao longo do corpo que emitem choques de até 860 volts — energia suficiente para atordoar predadores ou presas.

Cada um desses três órgãos — denominados órgão principal, órgão de Hunter e órgão de Sach — são compostos de células em formato de disco, denominadas eletrócitos, que possuem uma extremidade positiva e outra negativa, como os dois lados de uma pilha.

“A partir de um sinal do cérebro, as cargas são disparadas simultaneamente e podem atuar como milhões de minúsculas pilhas ligadas em série que produzem uma descarga elétrica enorme”, explica Parsons.

Esse mecanismo de defesa é útil durante a estação seca, quando os níveis de água estão baixos e os grandes mamíferos procuram alimento. Se esse peixe notar a aproximação de um predador, pode até pular para fora da água para se defender de um possível predador.

O bagre-africano, encontrado em ambientes tropicais de água doce da África, é capaz de produzir até 350 volts para encontrar alimento. O peixe-elefante, nativo da África Ocidental, utiliza a cauda elétrica para navegar em águas turvas.

Alguns peixes também atraem companheiros com características eletrizantes. Os peixes machos e fêmeas da família Apteronotidae, nativos da América do Sul, possuem um órgão em suas caudas que produz leves pulsos elétricos durante o acasalamento.

Esses choques ajudam a “coordenar e sincronizar a liberação de óvulos pela fêmea, seguida pela liberação de espermatozoides do macho sobre esses óvulos”, explica Cover.

Mamíferos e insetos chocantes

Embora os golfinhos sejam famosos pela ecolocalização — a capacidade de localizar objetos pelo som refletido — o boto-cinza, que pode viver tanto em água doce quanto salgada, desenvolveu uma estratégia totalmente diferente: ele detecta presas sintonizando seus campos elétricos, é o único mamífero marinho conhecido com essa capacidade.

Em um estudo conduzido em 2011 com botos-cinza mantidos em cativeiro, os cientistas descobriram que os animais possuem órgãos eletrorreceptores semelhantes aos encontrados em muitas espécies de peixes, além de ornitorrincos.

“Faz sentido que essa espécie desenvolva tal habilidade devido às águas turvas e lodosas da costa ocidental do Atlântico na América Central e do Sul”, afirma Tracy Fanara, engenheira e cientista pesquisadora da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos, com sede em Gainesville, Flórida.

O ornitorrinco, nativo da Austrália, é um mamífero semiaquático capaz de detectar presas por meio de 40 mil eletrorreceptores localizados no bico. Ele utiliza esse bico supersensorial como detector de metais, movimentando-o de um lado a outro ao nadar para encontrar lagostins e minhocas na água.

A equidna, integrante da mesma ordem dos monotremados do ornitorrinco e encontrada na Nova Guiné e na Austrália, é possivelmente o único animal terrestre a utilizar eletrorreceptores para encontrar presas. O sistema eletrorreceptivo localizado em seu focinho carnudo é semelhante ao do ornitorrinco, porém muito menos complexo, com menos de dois mil receptores.

Entre os insetos, as mamangavas são conhecidas por alterar a eletricidade estática das flores para se comunicar com os membros de sua colmeia.

“Suas asas são tão rápidas que, ao coletar o pólen, criam um campo elétrico”, afirma Fanara, o que pode alterar a carga elétrica em torno de uma flor por cerca de 100 segundos, comunicando às outras abelhas “que o pólen da flor já esgotou”.

Quem é que não gostaria de saber de antemão quando não há mais bolo na cozinha?

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