Fóssil raro contém camarão antigo preservado dentro de marisco

A curiosa descoberta é a primeira evidência de um camarão se abrigando na concha de outro animal, um comportamento ainda observado entre esses crustáceos nos dias atuais.

Por Rebecca Dzombak
Publicado 30 de nov. de 2021, 12:00 BRT
Shrimp Fossil

Um dos três camarões fossilizados que foram preservados dentro de um antigo marisco.

Foto de School of Environmental and Rural Science, University of New England

Há cerca de 100 milhões de anos, quando os dinossauros vagavam pelo planeta, três pequenos camarões partiram em busca de um esconderijo. Talvez precisassem de refúgio contra predadores por estarem longe da proteção de recifes de corais e escolheram um marisco enorme: não era o maior das redondezas, porém era aconchegante com pouco mais de 25 centímetros de largura.

Tão logo se estabeleceram, foram imersos em lodo e lama. O refúgio procurado de repente se transformou em túmulo. E ali permaneceram até 2016, quando um agricultor australiano os encontrou. A concha fossilizada contendo os três camarões, cada um com cerca de três centímetros de comprimento, está agora no museu Kronosaurus Korner, na Austrália.

Recentemente descrito no periódico Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, o fóssil representa o exemplar mais antigo de um camarão usando outra criatura (ou a casa de outra criatura) como abrigo — algo ainda observado em camarões vivos nos dias atuais. Esse comportamento, conhecido como inquilinismo, existe em muitos animais, tanto terrestres quanto marinhos.

Como os camarões fossilizados foram preservados inteiros, provavelmente estavam vivos na concha quando foram imersos subitamente em lama, talvez durante um terremoto ou tempestade intensa. Se houvessem sido levados para dentro da concha depois de morrer, não estariam intactos. “Camarões são bastante delicados”, afirma René Fraaije, diretor do museu de história natural Oertijdmuseum, nos Países Baixos, que não participou do estudo. “Quando são encontrados espécimes completos com a casca, a cauda e as patas ainda interligadas ao corpo, geralmente foram preservados na condição em que morreram.”

Os camarões podem ter entrado no marisco para fazer ninho ou a muda, mas não há evidências desses comportamentos. Podem ter tentado escapar da tempestade que acabou os sepultando, mas é quase impossível determinar uma sequência tão curta de eventos como essa “sem uma máquina do tempo”, observa Russel Bicknell, paleontólogo da Universidade da Nova Inglaterra, na Austrália, e autor principal do novo estudo.

Segundo Bicknell, uma explicação provável é que os camarões estivessem seguindo um instinto básico de sobrevivência: se escondendo de predadores. “O camarão estava bastante longe do topo da cadeia alimentar”, conta ele. “Quase todos os outros animais existentes, exceto criaturas como bivalves que se alimentam por filtragem, poderiam ter abocanhado esses pequenos crustáceos.”

O espécime é o mais recente acréscimo a uma lista que pouco a pouco está aumentando de criaturas fossilizadas em busca de abrigo em outros animais e indica a biólogos que alguns camarões já adotam o inquilinismo há ao menos 100 milhões de anos.

“É uma grande descoberta”, afirma Ninon Robin, paleontóloga do Instituto Real Belga de Ciências Naturais, que não participou do estudo. “É bastante raro encontrar exemplares como esses associados. É preciso ter muita sorte.”

Intruso comedido

No espectro das parcerias de organismos, o inquilinismo se enquadra entre a simbiose, benéfica a ambos os organismos, e o parasitismo, em que um organismo tira proveito do outro. Se o organismo hospedeiro ainda estiver vivo — como ocorre muitas vezes, por exemplo, com pequenos caranguejos da espécie Pinnotheres ostreum aninhados dentro de mexilhões — ele não se beneficiará com a relação, mas também não será prejudicado. O intruso obtém alguma segurança sem precisar oferecer algo em troca.

Um inquilino clássico é o caranguejo-eremita. Ele não constrói a própria concha à medida que cresce, mas depende das descartadas por outros animais produtores de conchas, como caramujos. O caranguejo-eremita precisa de conchas alheias para sua sobrevivência, mas, para outros inquilinos, como o camarão, é mais uma questão de conveniência.

O inquilinismo “começou bastante cedo” na história da vida animal, afirma Adiël Klompmaker, paleontólogo da Universidade do Alabama, nos Estados Unidos, e um dos autores do estudo. O animal mais antigo conhecido provavelmente evoluiu há mais de 541 milhões de anos, embora algumas evidências indiquem que os primeiros animais tenham surgido muito antes; animais com conchas provavelmente se originaram logo depois.

Pouco após o desenvolvimento das conchas pelos primeiros animais, conta Klompmaker, outros animais começaram a usá-las para se esconder. A mais antiga evidência fóssil plausível de inquilinismo é um conjunto de trilobitas, grupo extinto de artrópodes marinhos, encontrado no interior de conchas de nautiloides, grupo de cefalópodes que datam do período Ordoviciano, ocorrido entre 485 e 444 milhões de anos atrás. Uma variedade de habitantes oceânicos também foi encontrada em amonitas, moluscos extintos com conchas espirais características que podem atingir cerca de 1,8 metro de diâmetro.

“Animais como nautiloides e amonitas grandes oferecem muito mais proteção porque há mais espaço para um animal se refugiar”, explica Bicknell. Mas, se necessário, uma concha de marisco poderia servir também.

Escondendo-se do perigo

Além dos três camarões dentro de um marisco, os paleontólogos encontraram outro marisco maior, abrigando cerca de 30 peixinhos fossilizados na mesma formação geológica. O marisco com peixes ainda não foi descrito em detalhes em um artigo científico, mas ter dois espécimes bem preservados de pequenos organismos vivendo no mesmo tipo de marisco é bastante sugestivo de que as criaturas procuraram refúgio devido a uma ameaça ambiental, observa Bicknell.

Se essas criaturas buscavam proteção contra predadores, como acredita Bicknell, podem não ter encontrado outro lugar para se esconder. Não há evidências de recifes de corais na região, algo que provavelmente ofereceria melhores refúgios para camarões e outros animais em níveis inferiores na cadeia alimentar.

“Existem muitos perigos no fundo do mar”, afirma Klompmaker. Longe dos recifes, na falta de opções para se ocultar de predadores, um camarão poderia se refugiar até mesmo em um bivalve.

Tenha o camarão de fato se mudado para o marisco para se esconder de predadores ou de ameaças ambientais, o certo é que o fóssil preserva as primeiras evidências da vida desses animais no fundo do mar. “Desde o início, adaptaram-se a essa ecologia muito específica”, conta Robin. “Essa era a única maneira de prosperarem.”

Bicknell está animado com a descoberta. “É incrível terem sido encontrados esses fósseis, preservados casualmente, como agulhas no palheiro”, prossegue ele. “É como se fossem cápsulas do tempo que nos oferecem uma visão muito nítida da interação dos membros de um ecossistema extinto entre si.”

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