Nova variante Delta Plus é mais perigosa do que as outras? Veja o que se sabe

A última variante do coronavírus se espalhou para cerca de 12 países, entre eles a Índia, os Estados Unidos e o Reino Unido. Os cientistas ainda estão investigando se a cepa é mais letal e transmissível do que as outras.

Por Sanjay Mishra
Publicado 8 de jul. de 2021, 11:42 BRT
Delta

Nesta imagem de 15 de junho, profissionais usando trajes de proteção descansam depois de enterrar uma vítima da covid-19 em Bandung, capital da Província de Java Ocidental, na Indonésia.

Foto de Antara Foto, Raisan Al Farisi, via Reuters

Surgiu uma nova variante do coronavírus e os cientistas estão trabalhando para descobrir se ela é mais perigosa do que sua prima infame, a variante Delta, que já matou centenas de milhares de pessoas na Índia e está rapidamente se tornando a variante dominante no mundo todo.

Uma segunda onda de covid-19 devastou o estado indiano de Maharashtra. Preocupados com a nova variante, apelidada de Delta Plus (nome não oficial), as autoridades voltaram a decretar novos bloqueios no estado.

As diferenças entre as variantes Delta Plus e Delta são mínimas: acredita-se que a Delta Plus seja mais infecciosa e cause mais internações do que as cepas anteriores, como a Delta, que ainda é predominante na Índia e no Reino Unido. As vacinas existentes são eficazes contra a variante Delta somente após a administração da segunda dose.

Como medida cautelar, a Organização Mundial da Saúde insiste que as pessoas que já tenham completado o ciclo de imunização continuem usando máscaras. “Depois de ter sido vacinado, continue se cuidando para evitar o risco de fazer parte de uma cadeia de transmissão do vírus. Pode ser que você não esteja totalmente imune. Às vezes as vacinas não funcionam”, disse Bruce Aylward, conselheiro sênior da OMS, em uma entrevista coletiva na semana passada.

A variante Delta Plus está no radar de bancos de dados globais desde março. Em 26 de abril, foram constatados casos que envolviam a nova variante na Inglaterra, o que fez com que o Reino Unido restringisse a entrada de viajantes internacionais a partir do dia 4 de junho. Apesar dessas medidas restritivas, vários pacientes sem histórico de viagens ou contato com viajantes foram infectados pela variante Delta Plus, o que sugere que a variante já esteja circulando no Reino Unido através de transmissão comunitária. Embora a variante Delta Plus ainda não seja comum, o Ministério da Saúde da Índia passou a considerar a variante Delta Plus como uma Variante de Preocupação (VOC, na sigla em inglês) em 22 de junho, esse alerta se baseou no aumento da taxa de transmissão da nova variante, sua capacidade de se ligar aos receptores das células pulmonares e seu potencial de refrear a reação de anticorpos.

Em todo caso, ainda não se sabe se a variante Delta Plus atende às características de uma VOC. “A Índia está considerando a variante Delta Plus como VOC por precaução e não com base em dados concretos”, afirma Ravindra Gupta, imunologista e especialista em doenças infecciosas da Universidade de Cambridge.

A Delta Plus é uma variante de preocupação?

Quando uma variante passa a ser mais frequente em pacientes e apresenta características alarmantes, as autoridades da área de saúde pública iniciam pesquisas formais, designando-a como Variante Sob Investigação (VUI, na sigla em inglês). Se essa variante for considerada mais transmissível, mais resistente a anticorpos ou causadora de doenças mais graves, ela passa a ser considerada uma VOC.

O Consórcio de Genômica Sars-CoV-2 da Índia (Insacog, na sigla em inglês) — uma rede nacional de laboratórios e agências governamentais que monitora variações no código genético do coronavírus — descreveu a Delta Plus como uma VUI, como explica o virologista Shahid Jameel, que até recentemente liderava o grupo de aconselhamento científico do Insacog. Porém Jameel argumenta que a mutação provavelmente também não atenue a transmissibilidade da Delta Plus em relação à Delta, ou reduza a capacidade do vírus de resistir à resposta imunológica do organismo humano. “Portanto, não há nada de errado em considerar a Delta Plus uma VOC”, diz o virologista.

Até agora se tem conhecimento de pelo menos duas versões da variante Delta Plus que estão se espalhando lentamente pelo mundo. A variante já foi detectada em países como Canadá, Alemanha, Rússia, Suíça, Polônia, Portugal, Nepal, Japão, Reino Unido e Estados Unidos. A versão mais predominante em todo o mundo é designada AY.1. A outra versão, denominada AY.2, se restringe principalmente aos Estados Unidos. A variante Delta Plus já foi identificada como responsável por 150 casos de coronavírus nos Estados Unidos.

As vacinas existentes ainda funcionam contra a variante Delta original, mas são menos eficazes, especialmente entre pessoas em que a resposta imune não seja suficientemente eficaz após a vacinação, entre os mais velhos ou entre pessoas que tenham a imunidade mais frágil com o passar do tempo. Apenas uma dose da vacina da Pfizer ou da AstraZeneca foi 33% eficaz contra casos sintomáticos de coronavírus causadas pela variante Delta. No caso de pessoas que tomaram as duas doses, a vacina da AstraZeneca foi 60% eficaz, e a eficácia da vacina da Pfizer foi de 88%. Novas pesquisas iniciais sugerem que a vacina da Moderna é menos eficaz contra a variante Delta e a eficácia da vacina da Johnson & Johnson é de cerca de apenas 60%.

Mas em Israel, onde 57,1% da população já tomou as duas doses das vacinas, aproximadamente metade das infecções pela variante Delta ocorreram entre os que tomaram as duas doses da vacina da Pfizer. Isso fez com que Israel retomasse a obrigação do uso de máscaras.

“Sabemos que as vacinas funcionam contra as variantes; sabemos também que o uso de máscaras e o distanciamento social funcionam. Por mais assustadoras que pareçam as novas variantes, ainda temos recursos para combatê-las”, diz Priyamvada Acharya, imunologista do Duke Human Vaccine Institute.

O que se sabe até agora?

A variante Delta Plus se diferencia da Delta por causa de uma mutação extra — K417N — localizada na proteína de espícula, que cobre a superfície do vírus Sars-CoV-2. O mesmo ocorre em outras VOCs, por exemplo nas variantes Beta (identificada pela primeira vez na África do Sul) e Gamma (identificada pela primeira vez no Brasil). A mutação K417 também foi detectada em algumas amostras de Alpha (identificadas pela primeira vez no Reino Unido).

A mutação K417 se incorpora à região da proteína de espícula que interage com a proteína receptora ECA2 e permite que o vírus infecte células do pulmão, do coração, do rim e do intestino. Quando a proteína de espícula entra em contato com a ECA2, ela passa de um estado “fechado” para um estado “aberto”, que possibilita a ligação com o receptor e, a partir disso, a infecção da célula. Com base em estudos da variante Beta, que carrega essa mesma mutação, a mutação K417N pode ajudar a proteína de espícula a atingir o estado totalmente “aberto”, o que provavelmente amplia sua capacidade de infecção. A capacidade ampliada de ligação ao receptor ECA2 e um estado mais aberto são características de outras variantes altamente transmissíveis e resistentes a anticorpos.

Estudos mostram que mutações na K417 ajudam a variante Beta a driblar os anticorpos. Isso pode significar que a variante Delta Plus pode ter potencial ainda maior de ultrapassar a proteção oferecida pelas vacinas e os anticorpos em comparação com a Delta.

“Na linhagem da variante Delta, a presença da mutação K417N detectada em alguns casos é um forte indicador de que a variante pode evoluir e se tornar mais resistente a anticorpos neutralizantes”, supõe Olivier Schwartz, chefe da Unidade de Vírus e Imunidade do Institut Pasteur, na França. As primeiras pesquisas de Schwartz mostraram (em estudos ainda não revisados por pares) que a variante Delta é menos vulnerável a anticorpos extraídos do sangue de indivíduos recuperados da infecção e vacinados.

Mas não é fácil identificar o efeito da K417N na proteína de espícula que distingue as variantes Delta Plus e Delta, pois o impacto das mutações individuais nas proteínas não pode ser observado em conjunto.

“As mutações atuam [em conjunto] sobre a proteína de espícula e provocam um efeito maior do que qualquer uma delas teria se atuassem sozinhas”, explica Acharya. Além da mutação K417N, a variante Delta Plus também herda uma parte de mutações de sua parente Delta.

“A parte importante aqui não é apenas de uma única mutação, mas como todas essas mutações juntas mudam a proteína de espícula”, diz Sophie Gobeil, bioquímica do Duke Human Vaccine Institute.

Por exemplo, uma proteína de espícula mais aberta pode ter mais facilidade em se ligar ao receptor ECA2 e infectar uma célula, mas isso também a torna mais suscetível a anticorpos neutralizantes.

Portanto, os dois efeitos dessa mutação podem anular um ao outro, diz Thomas Peacock, cientista de pós-doutorado no Imperial College London. “Isso é muito especulativo e exigirá dados empíricos para provar uma coisa ou outra”.

Acharya, que estuda novas variantes em seu laboratório, afirma: “Os dados que estão disponíveis até agora revelam que nenhum efeito ou aumento na ligação de ECA2 é visível devido à mutação K417N. Não vemos nenhum efeito significativo na evasão imunológica com base nos anticorpos testados por nós ou por outros colegas. Por isso, minha impressão é de que a mutação K417N, por si só, provavelmente não fará nada para tornar a variante Delta mais assustadora”.

Quais precauções devemos tomar?

Alguns cientistas acreditam que a mutação K417N pode enfraquecer a variante Delta Plus e torná-la menos ameaçadora do que a variante Delta.

“A mutação no 417 foi observada repetidamente na cepa B.1.1.7 e não se desenvolveu, então sugiro que observemos a expansão desta variante”, diz Ravindra Gupta.

Ainda não se sabe se a variante Delta Plus é predominante na Índia ou em outros países. “Portanto, é precipitado concluir que a variante Delta Plus seja realmente problemática”, reitera Schwartz.

As vacinas existentes ainda são eficazes contra a variante Delta Plus, pois metade dos casos que envolviam a nova variante no Reino Unido ocorreram entre pessoas que não foram vacinadas; apenas alguns casos envolvem pessoas que tenham completado o ciclo de imunização contra covid-19. Nenhum dos pacientes infectados com a variante Delta Plus morreu.

Apenas 400 de 97,374 variantes Delta sequenciadas até o momento foram identificadas como Delta Plus. Mas, devido ao sequenciamento limitado na Índia, no Nepal e em outros países onde a Delta Plus pode ser predominante, “[ainda] não há sequenciamento suficiente para determinar sua transmissibilidade ou sua letalidade”, diz Jameel, que é diretor da Trivedi School of Biosciences da Ashoka University.

Normalmente, os cientistas cultivam amostras da variante em laboratório e testam uma quantidade conhecida do vírus com quantidades variáveis de anticorpos de pessoas vacinadas. Isso permite que os cientistas determinem se os anticorpos são capazes de neutralizar a nova variante com a mesma eficácia que o fazem contra outras variantes.

Os resultados preliminares dos estudos mais recentes são animadores: eles revelam que os anticorpos de indivíduos vacinados podem neutralizar algumas variantes de Delta Plus. Mas os cientistas estão apenas no início dos estudos dessas novas mutações.

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