Este homem se afogou há 5 mil anos. Como sabemos isso?

Modificando uma técnica forense moderna, pesquisadores conseguiram determinar que um esqueleto encontrado no Chile pertencia a um pescador que se afogou no Pacífico há milhares de anos.

Por Tom Metcalfe
Publicado 11 de mar. de 2022, 10:25 BRT
chile atacama camarones

Os antigos restos humanos da costa norte do Chile foram analisados usando uma técnica forense moderna que identifica vítimas de afogamento. Os pesquisadores encontraram evidências de um pescador que provavelmente se afogou nas águas frias do Pacífico há 5 mil anos.

Foto de Alamy

Há cerca de 5 mil anos, na costa do Chile, perto do deserto do Atacama, um pescador se afogou nas águas frias do Pacífico. Essa história de vida ou morte de um indivíduo que viveu milênios pode finalmente ser contada, graças a uma revolução em uma técnica forense moderna.

O 'teste de diatomácea', usado hoje para identificar vítimas de afogamento, baseia-se no que acontece com o corpo humano durante o evento: a água inalada rompe os pulmões e é bombeada ao redor do corpo moribundo, inclusive ao longo de pequenos vasos capilares que passam pelos ossos e pela medula.

O adulto masculino era provavelmente um pescador devido a sinais de atividade frequente de remo em seus ossos e uma dieta quase exclusivamente marinha. Ele foi enterrado de uma maneira incomum, com as extremidades esticadas e com conchas substituindo as vértebras perdidas do pescoço.

Foto de Álvaro Andrade

Como é a técnica para identificar as vítimas de afogamento?

Cientistas forenses examinam a medula dos mortos para procurar diatomáceas, algas microscópicas com conchas de sílica, que são encontradas caracteristicamente em vítimas de afogamento.

Agora, os pesquisadores confirmaram no Journal of Archaeological Science que o teste de diatomácea pode ser realizado em restos humanos que datam de milhares de anos, um avanço que pode oferecer uma nova maneira de investigar tsunamis pré-históricos e identificar vítimas.

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    Estas microalgas foram encontradas durante a análise.

    Foto de James Goff

    Este ovo de parasita foi encontrado durante a análise.

    Foto de James Goff

    “Sabemos que muitas pessoas morrem em grandes tsunamis, mas onde estão as da pré-história?”, se pergunta James Goff, geólogo da Universidade de Southampton, no Reino Unido, e autor do novo estudo.

    Goff, um especialista em tsunamis antigos, encontrou um candidato adequado para a técnica em uma sepultura de 5,5 mil anos em Capoca 1, um sítio arqueológico no norte do Chile.

    O pesquisador James Goff estuda os restos mortais do pescador. Os cientistas esperam que este avanço forense lhes permita identificar vítimas de tsunamis antigos

    Foto de James Goff

    Como sabemos que o homem que se afogou há 5 mil anos era um pescador

    O túmulo foi pesquisado em 2016 por outro autor do estudo, o antropólogo Pedro Andrade, da Universidade de Concepción, no Chile, que identificou o esqueleto como provavelmente pertencente a um pescador devido ao desgaste nos ossos, que ocorre por causa do uso frequente de remos, e à análise isotópica que mostrou uma dieta quase exclusiva de frutos do mar.

    O esqueleto masculino estava quase intacto, mas faltavam algumas vértebras do pescoço, que tinham sido substituídas por grandes conchas. O homem também parece ter sido enterrado com os braços apontando em direções diferentes e uma perna ficou meio que para fora.

    Goff diz que o esqueleto é uma amostra ideal para uma demonstração conceitual do teste de diatomácea em restos arqueológicos. “Sabíamos que esse cara era pescador por causa de sua estrutura óssea e que ele tinha tido um enterro bastante estranho, então vamos ver se ele se afogou no mar”, diz ele.

    Como é o teste modificado de diatomáceas

    Goff e seus colegas fizeram milhares de imagens de microscópio eletrônico da medula dentro dos maiores ossos do esqueleto de Capoca 1, que eram menos propensos a terem sido contaminados por elementos externos após a morte.

    O teste modificado de diatomácea forense remove a medula do osso e adiciona produtos químicos para distinguir as diatomáceas; mas a modificação de Goff preserva a medula no lugar e usa menos produtos químicos, o que significa que outras partículas marinhas, além das diatomáceas, também são preservadas.

    Curiosamente, os pesquisadores não encontraram diatomáceas fossilizadas no esqueleto de Copaca 1. A razão exata não é clara e Goff espera vê-los nas medulas de outras vítimas antigas de afogamento.

    Porém, foram encontrados outros tipos de algas marinhas fossilizadas, ovos de parasitas e sedimentos que o teste comum de diatomáceas não teria detectado, diz ele.

    Como o teste modificado de diatomáceas pode ajudar os cientistas a entender os tsunamis pré-históricos

    Embora a equipe de pesquisa tenha agora estabelecido que o pescador morreu por afogamento, os pesquisadores não identificaram tais sinais nos outros dois conjuntos de restos humanos encontrados nas proximidades. Eles acham que é provável que o homem tenha morrido em um acidente de pesca, em vez de em um antigo tsunami.

    Mas a capacidade de determinar se pessoas pré-históricas morreram por afogamento é um grande avanço nas investigações arqueológicas de tsunamis.

    “Há todos esses locais de enterro em massa pré-históricos que conhecemos nas costas, e se descobrirmos que todas essas pessoas se afogaram, então podemos dizer que elas provavelmente morreram em um tsunami”, diz Goff. “Podemos, então, olhar para outras evidências arqueológicas e entender melhor como as pessoas pré-históricas viveram e morreram nos litorais do mundo.”

    Futuros estudos com o teste modificado de diatomáceas

    Os tsunamis devem ter tido um enorme impacto nas comunidades costeiras antigas, mas podem ser difíceis de identificar, diz Beverly Goodman-Tchernov, professora de geociências marinhas na Universidade de Haifa, em Israel, e exploradora da National Geographic.

    Ela e seus colegas já planejam usar um teste modificado de diatomáceas nos ossos de um cão e de um homem que se afogaram nos tsunamis que se produziram depois da erupção minóica, cerca de 3,6 mil anos atrás.

    Goodman observou que nem todas as vítimas de um tsunami podem ter morrido por afogamento. Outra causa pode ter sido, por exemplo, um traumatismo craniano sofrido durante o desastre.

    O teste modificado de diatomáceas, no entanto, pode ser uma peça importante do quebra-cabeça. “Se há uma vala comum, temos que usar um grande conjunto de evidências para argumentar que poderia ter sido um tsunami”, diz ela. “Isso definitivamente contribuiria para a interpretação de que um tsunami ocorreu."

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