Novas pistas revelam rastro de destruição do asteroide que extinguiu dinossauros

Vestígios incomuns encontrados no estado americano do Texas mostram o que aconteceu quando o asteroide Chicxulub vaporizou uma espessa camada de rocha, liberando gás superaquecido e iniciando um período catastrófico de mudanças climáticas.

Por Maya Wei-Haas
Publicado 29 de mar. de 2022, 15:08 BRT
Um impacto de asteroide há cerca de 66 milhões de anos mudou para sempre a trajetória ...

Um impacto de asteroide há cerca de 66 milhões de anos mudou para sempre a trajetória da vida na Terra. Agora, os cientistas usaram pedaços de detritos antigos para medir as temperaturas escaldantes da poeira e do gás que se espalharam desde o local do impacto.

Foto de DETLEV VAN RAVENSWAAY, Science Source

Pequenas manchas brancas pontilham uma seção de rochas quebradiças ao longo do rio Brazos, no Texas. Para um observador casual, os grãos podem parecer pequenos pedaços de areia, mas dentro de suas formas excêntricas estão pistas para o dia mais catastrófico da história do nosso planeta.

Cerca de 66 milhões de anos atrás, um asteroide de 10 km de largura atingiu o oceano na costa da península de Yucatán, no México, abrindo uma cratera de 110 km de largura conhecida como Chicxulub. Em um instante, a trajetória da vida na Terra mudou para sempre. O impacto desencadeou incêndios florestais e tsunamis por milhares de quilômetros. Em seguida, as oscilações do clima global – um período dramático de resfriamento seguido por um longo período de aquecimento – deram início à extinção de cerca de 75% de todas as espécies, incluindo os dinossauros não-aviários.

Mapa da região do México com marcas sobre a geografia na época do impacto do asteroide ...

Zona de impacto

A energia do impacto do asteroide que criou a cratera de Chicxulub vaporizou uma parte da rocha subjacente, criando uma nuvem abrasadora de poeira e gás que saiu do local. Os cientistas estudaram a química de pequenos aglomerados de material que choveram dessa nuvem, coletados a mais de 1.600 quilômetros de distância da cratera de impacto, revelando que o gás atingiu cerca de 311 graus Fahrenheit (ou 155º Celsius).

Fontes: Thomas E. Yancey, Transactions of the Gulf Coast Association of Geological Societies, 1996; David A. Kring, Lunar and Planetary Institute, 2021

Foto de Christine Fellenz, NG Staff

Agora, um estudo publicado na revista Geology usa as minúsculas manchas brancas no Texas, conhecidas como lapilli, para revelar novos detalhes intrigantes sobre o que aconteceu nos minutos após o impacto fatídico: o asteróide atingiu o solo com tanta força que instantaneamente vaporizou uma espessa camada de rochas de carbonato abaixo dele, levantado uma nuvem de gás superaquecida que subiu ao ar junto com uma cortina de fragmentos rochosos que explodiram na superfície.

Os lapilli se formaram em algum lugar nessa confusão geológica de vapor e poeira, e depois choveram no que hoje é o México, Belize, o estado do Texas, chegando até Nova Jersey, também nos Estados Unidos. “Eles se formaram, essencialmente, em um instante de tempo”, diz Gregory Henkes, geoquímico da Universidade Stony Brook, em Nova York, e autor do novo estudo.

Uma análise química revelou que o lapilli se formou quando as temperaturas subiram para cerca de 155ºC, sugerindo uma zona de devastação que atingiu mais de 1,6 mil km do centro da cratera em poucos minutos, escreve a equipe no estudo.

O lapilli também pode conter pistas de quanto dióxido de carbono permaneceu na atmosfera após o impacto, o que acabou causando um período de aquecimento global contínuo por até 100 mil anos, segundo uma estimativa. O efeito cascata em outros ecossistemas da Terra a partir dessas mudanças climáticas permanecem relevantes hoje.

Nós, seres humanos, estamos executando, essencialmente, “nossos próprios experimentos" enquanto bombeamos gases de efeito estufa para o céu, observa Brandon Johnson, cientista planetário da Universidade de Purdue que não fez parte do novo estudo. "Se pudermos entender o que aconteceu há 66 milhões de anos, poderemos entender melhor o que pode acontecer hoje."

O que são os termômetros químicos

Os lapilli analisados ​​no novo estudo foram coletados na década de 1990 e vieram de um pequeno afloramento de rocha no centro do Texas, ao longo do rio Brazos. Os minúsculos pedaços de rocha, desde então, representam muitos mistérios, incluindo como eles se formaram em primeiro lugar.

Lapilli são bem conhecidos em depósitos de alguns tipos de erupções vulcânicas, onde crescem nas nuvens de cinzas, à medida que aglomerados de fragmentos vítreos se unem pela água. “Na verdade, é um pouco semelhante a como uma pedra de granizo pode crescer”, diz Johnson.

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    Lapilli também são encontrados em torno de algumas crateras de impacto, mas não é claro se elas se formam da mesma maneira. A análise de isótopos de carbono e oxigênio no novo estudo fornece suporte para a ideia de um mecanismo sugerido anteriormente: os gases condensados ​​das rochas carbonatadas vaporizadas podem agir como cola lapilli, mantendo os pequenos aglomerados juntos. Johnson e um colega sugeriram um mecanismo semelhante para a formação de lapilli na Lua, onde a água é escassa.

    Além disso, as ligações entre os isótopos pesados ​​de carbono e oxigênio tornam-se mais escassas em temperaturas mais altas. Usando esse fato, e um método conhecido como análise de isótopos agrupados, os cientistas conseguiram medir a temperatura da nuvem de gás que se dissipou há milhões de anos, explica o primeiro autor do estudo, David Burtt, doutorando da Universidade Stony Brook.

    Um dos desafios dessa análise é confirmar que os lapilli não foram alterados posteriormente, como através de altas temperaturas nas profundezas do solo, o que pode ter obscurecido as temperaturas registradas. Para evitar isso, os pesquisadores também analisaram as conchas de carbonato de pequenos animais marinhos conhecidos como forams, que foram preservados na mesma época e nas proximidades. As fortes ligações dos foraminíferos estavam de acordo com as temperaturas esperadas da superfície do mar para aquele período, sugerindo que as temperaturas de lapilli também haviam sido preservadas.

    Os resultados indicam que as pequenas manchas de rocha se formaram a escaldantes 155ºC.

    "Para a biosfera, isso seria devastador", diz o geoquímico especializado em crateras de impacto Steven Goderis, da Universidade Livre de Bruxelas, na Bélgica, que não fez parte da equipe de estudo.

    Descobrir exatamente até onde esse inferno gasoso se espalhou, desde o local do impacto, foi um desafio. Os pesquisadores há muito debatem o ângulo e a direção exatos do asteroide ao atingir a superfície da Terra, o que ajudaria a determinar as áreas que foram mais intensamente afetadas pela explosão. Goderis observa que o estudo de lapilli adicional, no México, pode ajudar os pesquisadores a entender melhor as variações na propagação das temperaturas. Mas, curiosamente, diz Goderis, os lapilli não são encontrados em todas as áreas ao redor da cratera de impacto, e os cientistas não sabem ao certo o porquê.

    Outro fator desconhecido é quando e onde, ao longo da trajetória de impacto, o lapilli se formou, observa o geólogo David Kring, do Instituto Lunar e Planetário, no Texas, que fez um extenso trabalho no local de impacto de Chicxulub. “Espero que esses tipos de estudos nos levem a esse ponto”, diz Kring, que não fazia parte da equipe de estudo.

    A bola de fogo que mudou o mundo

    Modelos anteriores diziam que o impacto causou temperaturas atmosféricas ainda mais altas. Assim, as altas temperaturas da formação de lapilli não são, de certa forma, surpreendentes.

    “O que há de novo é que eles realmente fixaram uma temperatura em um tipo específico de objeto”, diz Kring.

    Algumas estimativas sugerem que os gases incandescentes liberados pelo impacto formaram uma bola de fogo em expansão, que irradiava tanto calor que era capaz de provocar incêndios florestais a até 2,4 mil km de distância. Acredita-se que as temperaturas tenham aumentado à medida que os fragmentos explodidos de detritos caíram de volta à Terra . À medida que o material corria pela atmosfera, diz Kring, ele superaquecia o ar e torrava grandes faixas de terra.

    Ao redor do local do impacto, as temperaturas teriam sido altas o suficiente para causar a ignição espontânea de plantas. Os detritos também circularam o planeta, concentrando-se no lado oposto do mundo, onde provavelmente provocaram incêndios semelhantes.

    Burtt e Henkes veem o novo estudo como um ponto de partida. Uma pergunta importante para as próximas pesquisas envolve o pulso de dióxido de carbono que foi liberado quando o asteroide vaporizou uma grande quantidade de rocha carbonática.

    A formação de lapilli dentro da nuvem de vapor consumiria parte desse dióxido de carbono, talvez influenciando as mudanças climáticas globais nos anos após a colisão do asteroide. A mistura de emissões do impacto – incluindo enxofre, dióxido de carbono e vapor de água – fez o mundo passar de frio para superaquecido, o que desmoronou as teias alimentares e levou inúmeras espécies à extinção. Estudar quanto desses gases que afetam o clima foi liberado é importante para entender completamente o que matou tantas espécies – algo que os cientistas ainda estão descobrindo, explica Johnson.

    E esse aspecto do que aconteceu não é somente história antiga. "Há um evento antropogênico de nível de extinção acontecendo agora", diz Henkes, referindo-se aos dramáticos declínios na biodiversidade que os humanos causaram ao liberar gases de efeito estufa, mudar o uso do solo, introduzir espécies invasoras e muito mais.

    As mudanças atuais não são tão repentinas quanto o impacto de um asteroide, diz ele, mas os efeitos ecoarão pela biosfera por milênios.

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