Como a corrida espacial lançou uma era de exploração para além da Terra
As tensões da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética alimentaram uma corrida tecnológica ao espaço – que culminou com um pouso histórico na Lua.
Durante a Guerra Fria, os Estados Unidos e a União Soviética começaram a construir novos foguetes poderosos – que seriam eventualmente usados para enviar humanos ao espaço e, finalmente, à Lua.
As tensões aumentavam no Cosmódromo de Baikonur na manhã de 12 de abril de 1961, quando a União Soviética se preparava para lançar o primeiro humano ao espaço. Das 16 tentativas anteriores de colocar o foguete soviético Vostok em órbita, metade falhou. Dois dos principais engenheiros do programa espacial teriam que tomar tranquilizantes naquele dia enquanto esperavam a decolagem no local de lançamento do Cazaquistão.
Mas Yuri Gagarin permaneceu calmo na cápsula no topo do foguete. Após meses de rigoroso treinamento físico e técnico, o cosmonauta de 27 anos foi escolhido para o voo histórico em parte por sua serenidade. Inteligente, diligente e querido entre seus camaradas, um memorando escrito por médicos da Força Aérea Soviética e obtido pelo historiador Asif Siddiqi observou que Gagarin “entende a vida melhor do que muitos de seus amigos”.
Às 9h07, Gagarin gritou “Poyekhali!” – russo para “Vamos lá!” – quando o foguete decolou. Ele narrou o voo para os que estavam em solo enquanto a aceleração do foguete, a 27 mil km/h, o empurrava de volta ao seu assento. “Eu vejo a Terra. A carga g está aumentando um pouco. Sinto-me excelente, de bom humor. Eu vejo as nuvens. O local de pouso... é lindo. Que beleza.”
Momentos depois, o cosmonauta soviético tornou-se a primeira pessoa no espaço e, 89 minutos após o lançamento, a primeira pessoa a orbitar o planeta. Foi um momento crucial na corrida espacial entre a União Soviética e os Estados Unidos, que colocariam um homem na Lua até o final da década. Mas não é onde a história do voo espacial humano realmente começa: essa trajetória foi traçada anos antes, por outro sucesso soviético.
A corrida espacial começa
Apesar de serem aliados durante a Segunda Guerra Mundial, os EUA e a URSS ficaram cada vez mais desconfiados uns dos outros quando a guerra chegou ao fim, em 1945. Os EUA tinham acabado de demonstrar sua capacidade de destruir cidades inteiras lançando bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki para forçar o Japão a se render. Assim começou a Guerra Fria, na qual os EUA e a URSS disputavam o domínio mundial.
Para provar que tinham mais capacidade tecnológica, ambos os países começaram a construir enormes arsenais nucleares e foguetes capazes de atingir alvos em todo o mundo. Em meados da década de 1950, os dois países anunciaram planos para usar esses foguetes para impulsionar satélites artificiais ao espaço. Os EUA marcaram o lançamento do Projeto Vanguarda para 1958, e os soviéticos resolveram, discretamente, derrotar os americanos.
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Em 4 de outubro de 1957, o mundo foi pego de surpresa quando a União Soviética anunciou que havia lançado em órbita um satélite chamado Sputnik, russo para 'companheiro de viagem'. Embora não fosse maior do que uma bola de praia e tivesse capacidades técnicas limitadas, os americanos ficaram assustados ao ouvir a transmissão do rádio, “bip, bip, bip”, ao passar por cima de suas cabeças.
O presidente americano à época, Dwight Eisenhower, tinha suas próprias preocupações. Funcionários da Casa Branca estavam inquietos se o mundo veria a União Soviética como a superpotência mais sofisticada, escrevendo em um relatório que o lançamento do Sputnik “geraria mito, lenda e superstição duradoura de um tipo peculiarmente difícil de erradicar ou modificar, que a URSS pode explorar a seu favor”.
Recusando-se a conceder espaço à União Soviética, os Estados Unidos estabeleceram a Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (Nasa) em julho de 1958 e começaram a sério sua própria busca de voos espaciais.
Primeiros voos humanos ao espaço
A viagem espacial humana não era um conceito novo na década de 1950. Os EUA estavam lançando foguetes com animais – incluindo moscas e macacos – no espaço suborbital desde o final da década de 1940, enquanto a URSS começou a lançar cães em 1951. Apenas algumas semanas após o lançamento do Sputnik em 1957, os soviéticos enviaram um cachorro chamado Laika em órbita. (Laika morreu – de calor e estresse – poucas horas após o voo.)
Mas o verdadeiro objetivo era enviar humanos ao espaço. Em 1958, a Nasa lançou o Projeto Mercury com três objetivos específicos: lançar um americano em órbita ao redor da Terra, investigar a capacidade do corpo humano de tolerar voos espaciais e trazer a espaçonave e o astronauta em segurança para casa. O objetivo não declarado: realizar tudo isso antes dos soviéticos.
No entanto, mais uma vez a URSS mostrou-se um passo à frente. O voo histórico de Gagarin ocorreu um mês antes do astronauta Alan Shepard se tornar o primeiro americano no espaço. Embora o voo suborbital de 15 minutos de Shepard a bordo do Freedom 7 tenha sido um marco importante – assistido por milhões de telespectadores –, ele foi ofuscado pela viagem de Gagarin ao redor da Terra.
Semanas após o voo de Shepard, o presidente americano John F. Kennedy estava diante de uma sessão conjunta do Congresso dos Estados Unidos. Ele reconheceu que o país não tratou a exploração espacial com urgência suficiente, declarou sua intenção de torná-la uma prioridade e lançou um novo desafio: colocar um americano na Lua até o final da década.
“Nenhum projeto espacial neste período será mais impressionante para a humanidade, ou mais importante para a exploração espacial de longo alcance; e nenhum será tão difícil ou caro de realizar”, disse ele. “Em um sentido muito real, não será um homem indo para a Lua, [...] será uma nação inteira.”
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Alcançando a lua
Antes que a Nasa pudesse se aventurar na Lua, no entanto, seus cientistas e engenheiros tinham muito a aprender. A agência espacial avançou com o Projeto Mercury, fazendo do astronauta John Glenn o primeiro americano a orbitar a Terra em fevereiro de 1962. Em maio de 1963, Gordon Cooper completou um voo de 22 órbitas, uma viagem que durou cerca de 34 horas e 20 minutos. Um mês depois, porém, o cosmonauta Valery Bykovsky passou quatro dias e 23 horas no espaço – ainda o recorde do voo espacial solo mais longo – e Valentina Tereshkova se tornou a primeira mulher a ir para o espaço.
Depois do Mercury, a Nasa avançou suas capacidades de voo espacial com o Projeto Gemini. Considerado uma ponte para a Lua, os objetivos do Gemini eram encontrar e ancorar em órbita, testar manobras de reentrada atmosférica e determinar como períodos mais longos de viagens espaciais afetariam os humanos.
Enquanto isso, os soviéticos seguiam inaugurando marcos. Em março de 1965, o cosmonauta Alexei Leonov se tornou a primeira pessoa a sair de uma espaçonave em órbita. Com duração de 12 minutos, a caminhada espacial foi particularmente angustiante: o traje espacial de Leonov era tão rígido que ele teve dificuldade em reentrar na espaçonave e teve que liberar um pouco da pressão do traje para fechar a câmara atrás dele.
Dez semanas depois, Ed White tornou-se o primeiro americano a andar no espaço, passando 23 minutos flutuando no final de uma fio umbilical de mais de sete metros, enquanto ele e o astronauta James McDivitt, na cápsula Gemini 4, circulavam a Terra a mais de 27 mil km/h. Depois disso, os EUA começaram a ganhar influência sobre os soviéticos: em dezembro de 1965, os astronautas a bordo do Gemini 7 estabeleceram o recorde de maior tempo no espaço durante uma missão de duas semanas. A Gemini 8 conseguiu a primeira ancoragem espacial em 1966 – embora um mau funcionamento tenha feito a espaçonave girar fora de controle – Neil Armstrong, de 35 anos, a recuperou no assento do comandante.
Após dez voos tripulados em cinco anos, o programa terminou com Gemini 12 em 15 de novembro de 1966 – uma missão na qual Edwin “Buzz” Aldrin registrou um recorde de cinco horas e 30 minutos explorando do lado de fora de uma espaçonave. Finalmente chegou a hora de ir para a Lua.
Pegadas na Lua
Enquanto conduzia as missões Gemini, a Nasa já havia começado a desenvolver a espaçonave para o programa Apollo, missão que seria lançada com destino ao satélite. O veículo incluía um módulo de comando/serviço que voaria para a Lua e entraria em órbita, e um módulo lunar que se desencaixaria para o pouso e depois decolaria para se juntar ao módulo de comando para a viagem de volta à Terra.
Mas o programa Apollo teve um começo trágico. Em 27 de janeiro de 1967, os astronautas Gus Grissom, Ed White e Roger Chaffee foram mortos em um incêndio na plataforma de lançamento durante um teste de solo para a missão planejada para fevereiro. Uma investigação concluiu que o fogo foi provocado por um curto-circuito nos fios perto do assento de Grissom e que se espalhou rapidamente devido aos altos níveis de oxigênio e materiais inflamáveis na cabine.
Após uma longa reavaliação do projeto e da segurança da espaçonave, a primeira missão Apollo tripulada foi lançada em 11 de outubro de 1968, quando a Apollo 7 decolou em direção à órbita da Terra. No primeiro dos 11 dias no espaço, os três astronautas a bordo contraíram resfriados – aprendendo da maneira mais difícil que o muco não pode drenar da cabeça na ausência de peso do espaço.
A missão foi seguida pelo primeiro voo até a Lua, a mais de 370 mil km de distância. Antes da Apollo 8, o mais longe que os humanos chegaram da Terra foi cerca de 1,3 mil km. A tripulação orbitou a Lua dez vezes entre 24 e 25 de dezembro, e leu as linhas de abertura do Gênesis bíblico para uma audiência cativa de cerca de um bilhão de pessoas – um quarto da população global – durante uma transmissão de rádio na véspera do Natal. Os três astronautas foram os primeiros a ver o lado oculto da lua com seus próprios olhos e observar a Terra subir no horizonte lunar .
A Apollo 9 foi o primeiro voo com o módulo lunar, testando a espaçonave na órbita da Terra. A Apollo 10 levou o módulo lunar para a Lua e o desceu a 15 mil metros da superfície.
Finalmente, em 16 de julho de 1969, a Apollo 11 decolou. No quinto dia no espaço, os astronautas Neil Armstrong e Buzz Aldrin começaram os preparativos para pousar o módulo lunar Eagle na superfície da Lua. Eles pousaram exatamente às 15h17, horário de Houston, em 20 de julho – e, horas depois, às 21h56, Armstrong se tornou a primeira pessoa a pisar na Lua, e proclamou: “Este é um pequeno passo para o homem, um salto gigante para a humanidade”.
Nas duas horas seguintes, Armstrong e Aldrin coletaram amostras de solo e rocha e montaram experimentos. Eles deixaram uma bandeira americana plantada na superfície do satélite e uma placa que diz: “Viemos em paz por toda a humanidade”.
Explorações lunares seguintes
Os EUA fariam mais cinco viagens tripuladas bem-sucedidas à superfície da Lua nos anos seguintes. Os astronautas coletaram amostras, realizaram experimentos científicos e testaram uma sonda lunar. O programa terminou em dezembro de 1972 com a Apollo 17, que viu os astronautas Eugene Cernan e Harrison Schmitt passarem mais de três dias na lua.
Após as missões bem-sucedidas à Lua, os EUA e a União Soviética começaram a colaborar. Em 1975, os países lançaram a primeira missão conjunta, a Apollo-Soyuz, na qual as espaçonaves americanas e soviéticas se acoplaram com sucesso enquanto estavam em órbita – permitindo que suas tripulações se encontrassem no espaço. Após o colapso da União Soviética em 1991, EUA e Rússia continuaram a parceria no espaço, trabalhando juntos para construir a Estação Espacial Internacional .
Desde então, vários países fizeram viagens não tripuladas à Lua, mas os EUA continuam sendo o único país cujos astronautas pisaram na superfície lunar. A Nasa pretende levar novamente os astronautas à Lua até 2025 com o programa Artemis, e outros países como a China também planejam enviar humanos à Lua nos próximos anos ou décadas.
No futuro, os humanos podem se aventurar até Marte. Tal jornada exigiria tecnologias que ainda não existem – mas o mesmo aconteceu quando o programa Apollo foi anunciado seis décadas atrás.
“Nós escolhemos ir à Lua”, o presidente Kennedy disse à nação em um discurso de 1962. “Escolhemos ir à Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque são fáceis, mas porque são difíceis, porque esse objetivo servirá para organizar e medir o melhor de nossas energias e habilidades, porque esse desafio é estamos dispostos a aceitar, não estamos dispostos a adiar e pretendemos vencer.”