O que é o solstício: tudo o que você precisa saber sobre o evento
A data, que está intimamente ligada à evolução humana na Terra, marca a chegada das principais estações do ano – o inverno no hemisfério Sul e o verão no hemisfério Norte.
Pessoas se reúnem no Stonehenge, monumento milenar localizado na Inglaterra, para observar o solstício. Durante o evento astronômico, o Sol se alinha a uma das enormes pedras da construção neolítica.
Você já deve ter ouvido falar do solstício: um evento astronômico que ocorre duas vezes ao ano, nos meses de junho e dezembro, marcando a entrada de uma nova estação. Na próxima terça-feira, dia 21, a Terra passa mais uma vez por esse marco, que anuncia a entrada do verão, no hemisfério Norte, e do inverno, no Sul.
O solstício é um evento astronômico ligado à inclinação da órbita da Terra em relação ao Sol. Segundo a Nasa, essa inclinação influencia a quantidade de luz solar que cada metade do planeta recebe, o que, por sua vez, causa as mudanças de estações.
Para a humanidade, no entanto, o solstício significa muito mais do que um marco para quando o verão ou o inverno começam. “A relação humana com o solstício data de milhares de anos atrás. Essa observação do movimento do Sol resultou em avanços humanos desde a construção de edifícios até a criação do calendário”, disse José Daniel Flores Gutiérrez, astrônomo da Universidade Nacional Autônoma do México e editor responsável do Anuário do Observatório Astronômico Nacional do México em entrevista à reportagem.
De acordo com Gutiérrez, mesmo sendo um conhecimento antigo, o evento astronômico ainda influencia como os humanos se organizam, festejam e veem o mundo.
O que é o solstício
Solstício é um fenômeno astronômico que representa o momento em que o Sol atinge maior declinação em latitude em relação à linha do Equador. Mas o que isso quer dizer?
Primeiro precisamos relembrar que a Terra cumpre uma trajetória ao redor do Sol ao longo de um ano, que se chama plano orbital. Em comparação a esse plano, o eixo da Terra tem uma inclinação aproximada de 23,4° que não varia muito durante o trajeto, ou seja, o planeta sempre estará inclinado para a mesma direção, independente da posição da Terra.
Isso faz com que um dos hemisférios receba maior incidência dos raios solares do que outro durante um período do ano. Durante seis meses, o polo sul está mais inclinado para o Sol e, consequentemente, o polo norte está mais afastado. Nos outros seis meses, a situação se inverte. “Esses dois momentos são chamados solstícios. Quando a intensidade solar é maior em um dos hemisférios, caracteriza-se o solstício de verão. Por outro lado, quando a intensidade solar é menor, há o solstício de inverno", explicou Roberto Dell'Aglio Dias da Costa, professor do departamento de Astronomia da Universidade de São Paulo, em entrevista por videochamada à reportagem.
Outra característica desse evento em específico, é que, enquanto ele acontece, o Sol aparenta estar “parado” no céu. “No solstício, o Sol atinge sua posição extrema no céu – tanto no [hemisfério] Norte quanto no Sul, a depender da época do ano", diz Gutiérrez. "Isso significa que, a partir daquele ponto, o astro começará a ‘voltar o seu caminho’ no céu. Durante o solstício, porém, ele fica algumas semanas no mesmo ponto, dando a impressão de estar parado.” Esse aspecto é o que nomeia o fenômeno: “Solstício significa ‘sol parado."
Solstício x equinócio
Da mesma forma, o equinócio também é um efeito da inclinação do eixo terrestre durante sua órbita.
“O equinócio é a metade do caminho”, diz Gutiérrez. Durante o equinócio, que também ocorre duas vezes ao ano (nos meses de abril e setembro), o Sol está exatamente em cima do Equador celeste (que nada mais é do que a projeção da Linha do Equador no céu), o que faz com que a luz solar incida de maneira igual nas duas metades do planeta.
Em comparação, quando é solstício de verão no hemisfério Norte – o que acontece no próximo dia 21 –, o Sol incide perpendicularmente sobre o Trópico de Câncer. Já quando verão no hemisfério Sul, o Sol está sobre o Trópico de Capricórnio. Esses trópicos estão aproximadamente em latitudes de 23º, o que coincide com a inclinação do eixo terrestre.
Outra diferença é que no equinócio temos a duração do dia igual à noite, enquanto os solstícios são os dias mais longos (verão) e mais curtos (inverno) do ano. O equinócio também marca a entrada da primavera e do outono.
Solstício: de monumentos antigos ao calendário solar
Os solstícios de verão e inverno servem de marcos e guias para a humanidade há milênios. “O solstício representa uma questão muito importante do ponto de vista do pensamento humano quando ele toma consciência de si mesmo e como um ser que vive em um ambiente na natureza", diz Gutiérrez. "Ele percebe que o Sol tem movimentos e isso o leva a pensar sobre sua origem e como ocorrem os fenômenos da natureza."
Como exemplo, Gutiérrez cita que, ainda nos dias de hoje, os solstícios de inverno e verão reúnem multidões de pessoas em volta do Stonehenge, um dos monumentos pré-históricos mais famosos do mundo, localizado na Inglaterra. Tudo para observar um alinhamento único entre a luz solar e as antigas e imensas pedras que compõem a construção milenar.
No solstício de verão, o sol nasce atrás da pedra Heel, na parte nordeste do horizonte, e seus primeiros raios brilham diretamente no coração de Stonehenge. Já no solstício de inverno, os observadores de pé na entrada da formação rochosa e de frente para o centro das pedras, podem observar o pôr do sol na parte sudoeste do horizonte.
“Há indícios de que o Stonehenge e outros monumentos pré-históricos tenham usado fenômenos astronômicos como base para sua construção", diz Gutiérrez. "Outro exemplo é a pirâmide de Mayapan, no México, onde a cada solstício de inverno a luz do Sol contorna a construção formando triângulos de luz."
Vale mencionar ainda o Templo do Sol, em Machu Picchu, no Peru. Nela, durante o solstício de verão, o Sol brilha através de uma janela do templo e se alinha tanto com a rocha na parte de dentro quanto com a ponta do pico de uma montanha próxima.
Como o solstício influencia no calendário que usamos
A maneira como nos organizamos em relação ao tempo e ao clima, e até mesmo no que se refere à criação do ano solar, também está ligada à existência do solstício e do equinócio, como explica Dias da Costa: “A observação desses dois eventos astronômicos era a forma como os antigos determinavam o início e fim das estações do ano. Toda a nossa ideia de calendário e duração de um ano solar é baseada nesses marcos físicos”.
Segundo o astrofísico, se a humanidade tivesse determinado a duração de um ano apenas pelo tempo que a Terra leva para dar uma volta inteira em volta do Sol, as estações iriam “caminhar” ao longo do ano, ocorrendo em diferentes épocas. Isso porque o eixo de rotação da Terra, que “bamboleia como um pião", de acordo com Dias da Costa, muda a cada 26 mil anos, alterando a posição da órbita em que ocorrem os solstícios e equinócios.
“O calendário foi criado por razões práticas, para as pessoas saberem quando plantar, quando colher, quando levar o gado do lugar quente para o frio e vice-versa", diz Dias da Costa. "Então, é essencial que ele acompanhe o ciclo das estações."
Como ver o solstício de junho
Para quem se interessar em observar o solstício, os astrônomos dão uma dica. No dia 21 de junho, use um gnômon, que segundo diz Dias da Costa, “pode ser qualquer objeto que sirva de haste vertical para projetar uma sombra, como em um relógio de sol”. Então, observe a variação da sombra ao longo do dia. “O menor comprimento de sombra que puder medir nesse dia será a sombra mínima mais comprida possível para aquele lugar do mundo”, diz ele. “No solstício de verão seria o inverso. A menor sombra do dia será a mais curta possível.”
Para esse experimento, é preciso apenas de um objeto para servir de haste, como um lápis, um lugar plano para colocá-lo na vertical e a luz do dia. De acordo com Gutiérrez, o experimento também pode servir como uma aula de história. “Com isso é possível determinar uma linha de sombra que, se repetirmos o experimento no próximo solstício, em um ano, será a mesma", diz Gutiérrez. "Essa é a parte interessante e é algo que pode nos conectar com os povos antigos que usavam os movimentos solares como uma das principais medidas para suas construções."