Sonda chinesa não tripulada encontra rochas que podem ter vindo das profundezas da Lua

A missão Chang’e-4, que já estabeleceu recordes, pode ter encontrado minerais capazes de desvendar antigos segredos sobre a origem de nosso satélite natural.

Por Robin George Andrews
Publicado 21 de mai. de 2019, 23:17 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Esta imagem, criada com dados do Lunar Reconnaissance Orbiter da NASA, demonstra a superfície do lado oculto da Lua marcada por círculos. A bacia do Polo Sul-Aitken, exibida aqui em tons de azul, é a maior e mais antiga bacia de impacto conhecida no sistema solar, com cerca de 2,4 mil quilômetros.
Foto de NASA, Goddard

Começando o ano de 2019 com tudo, a China fez história no início de janeiro ao pousar a primeira espaçonave no lado oculto da Lua. Agora, os resultados dessa missão sugerem outra surpresa: os primeiros sinais de material do manto lunar disponível para estudo científico.

Yutu-2, a outra sonda não tripulada parceira da sonda Chang’e-4, utilizou a radiação refletida para analisar os minerais encontrados em seu local de pouso, o interior da cratera lunar de Von Kármán. Ao fazer isso, ela encontrou camadas ricas em dois tipos de minerais que não correspondem aos minerais tipicamente encontrados na crosta lunar. Os autores do estudo alegam que seja provável que essas áreas de minerais representem material exposto do manto, de acordo com um trabalho publicado na revista científica Nature.

Se confirmado, a rocha encontrada no manto da Lua pode oferecer aos pesquisadores uma visão inédita do funcionamento interno de nosso satélite natural, talvez ajudando a solucionar antigos mistérios sobre a formação da Lua e sua evolução.

"Se for realmente um pedaço do manto, será muito interessante", afirma Sara Russell, professora de ciências planetárias do Museu de História Natural de Londres.

O que sabemos sobre a Lua, de sua origem ao seu comportamento atual, normalmente vem de amostras trazidas pelas missões Apollo, que pousaram no lado da Lua mais próximo à Terra. As rochas encontradas possuem um valor inestimável, mas apenas contam uma pequena parte da história, pois são provenientes apenas de uma porção muito pequena da superfície da Lua. O manto lunar, uma sólida camada abaixo da crosta que já foi mais quente e mais maleável, ainda é um mistério e cientistas desejam estudar amostras dessa camada há décadas.

Uma foto tirada a partir da órbita exibe crateras ao redor do local de pouso da Chang'e-4, próximo ao Polo Sul da Lua.
Foto de <a href="https://www.alamy.com/search/imageresults.aspx?cid=54KFDEP5ZEKVSX7LV8DEHLBCMLM6ZCZFW7ZWA5PPZ6Z9Q6U9YAENBA2FEHWKB4ES&amp;name=Science+History+Images&amp;st=12&amp;mode=0&amp;comp=1">Science History Images</a>, Alamy Stock Photo

Uma verdadeira amostra do manto lunar representaria uma "importante peça do quebra-cabeça" finalmente encontrada, afirma Russell. Alguns pesquisadores, entretanto, levantaram suspeitas em relação à conclusividade da alegação do estudo em seu atual estágio.

"Isso representa um progresso interessante", afirma Clive Neal, especialista em geologia lunar da Universidade de Notre Dame, mas explicações alternativas ainda precisam ser exploradas em mais detalhes antes que algo seja considerado definitivo.

Revirando o passado

A missão Chang’e-4 é, sem dúvidas, uma missão sem precedentes. Todas as aterrissagens bem-sucedidas na Lua até o momento, realizadas pelos Estados Unidos e pela União Soviética, ocorreram no lado visível da Lua, parcialmente por que pousar no lado oculto envolvia problemas logísticos.

A China é agora o primeiro e único país a explorar o lado oculto com uma sonda não tripulada. Seu ponto de aterrissagem, a cratera de Von Kármán, está localizado no centro da enorme bacia do Polo-Sul Aitken, uma antiga cratera de 2.494 quilômetros de largura considerada uma das maiores estruturas de impacto do sistema solar. Isso faz desse ponto um lugar plausível para se procurar manto lunar, uma das razões pelas quais a Administração Nacional Espacial da China quis pousar lá.

"Modelos numéricos do evento do impacto indicam que ele deve ter atravessado a crosta lunar e penetrado no manto localizado abaixo", afirma Bill Bottke, cientista planetário do Southwest Research Institute.

"Se você deseja encontrar manto lunar, a bacia do Polo Sul-Aitken é a melhor opção", complementa Russell.

Cientistas suspeitam que a Lua tenha sido coberta por um oceano de magma logo após sua formação. Após ter resfriado e se solidificado gradualmente, os minerais mais densos permaneceram nas profundezas desse oceano, ao passo que os menos densos flutuaram até a superfície. Isso significa que a composição geológica do então manto é diferente da composição geológica da crosta.

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    Ao explorar Von Kármán, a sonda Yutu-2 encontrou materiais que, de acordo com seu espectrômetro, pareciam conter pelo menos dois minerais: piroxênio com baixo teor de cálcio e olivina. Esses dois minerais seriam correspondentes aos minerais que, de acordo com a previsão de modelos, estariam presentes na parte superior do manto.

    Os pesquisadores suspeitam que quando a bacia foi formada, ela tenha espalhado material do manto pela superfície da Lua. Posteriormente, um impacto menos poderoso formou a cratera de Finsen, que é menor, e a equipe especula que esse evento tenha projetado material já exposto do manto à cratera próxima de Von Kármán.

    A história de dois mundos

    Se a amostra for realmente material do manto, sua composição não irá apenas registrar a evolução magmática e térmica da Lua, afirma o principal autor do estudo Chunlai Li da Academia Chinesa de Ciências. As profundezas da Lua também escondem parte da história da origem da Terra.  (Descubra também a rocha lunar que pode ser o pedaço mais antigo do planeta Terra.)

    A teoria mais amplamente aceita é que a Lua tenha se originado quando um enorme protoplaneta se chocou contra a Terra que ainda estava em processo de formação, enviando uma grande quantidade de material terrestre à sua órbita. A Terra destruiu boa parte de seu passado geológico com a tectônica de placas. Porém, se ainda houver alguma chance de conhecer sua história, ela está registrada no centro da Lua, que tem um comportamento bem menos destrutivo.

    A equipe não conseguiu afirmar ao certo se o espectrômetro detectou material do manto incorretamente. Um dos autores do estudo, Bin Liu, pesquisador da Academia Chinesa de Ciências, afirma que a missão precisará reunir mais dados espectrais para ajudar a validar essas primeiras interpretações.

    Bottke acredita na ideia de que o material seja manto previamente exposto, mas ele concorda que outras possibilidades ainda não podem ser descartadas. De acordo com ele, em uma explicação alternativa, o material poderia ser material derretido que foi posteriormente solidificado, proveniente do impacto que criou a bacia. Ou poderia ser uma característica da lava solidificada conhecidamente presente no interior da cratera, afirma Neal.

    Daniel Moriarty, geólogo lunar do Centro de Voos Espaciais Goddard da NASA, também está cauteloso. A sonda espacial Kaguya do Japão, que também carrega um espectrômetro, detectou vidro vulcânico na cratera de Von Kármán e em outras crateras próximas, observa ele. Para um espectrômetro, olivina e vidro vulcânico podem ser bem semelhantes, o que significa que a Yutu-2 pode ter encontrado vidro vulcânico e não minerais do manto.

    Também não há muitas evidências de olivina na cratera de Finsen, a suposta fonte do material do manto visto na cratera de Von Kármán, afirma ele. Ele suspeita que uma cratera mais nova no centro da Von Kármán seja uma fonte bem mais provável para os materiais encontrados pela Yutu-2.

    Um grande salto para os robôs

    Neal e Russell afirmam que esse estudo demonstra a importância de financiamentos direcionados a outras missões capazes de trazer amostras lunares à Terra, onde seriam detalhadamente analisadas em laboratório. Felizmente, a China já está cuidando disso. Sua próxima missão Chang’e-5 enviará à Terra amostras do lado visível da Lua e sua missão Chang’e-6 tem como objetivo fazer o mesmo com amostras do Polo Sul da Lua.

    Enquanto isso, é bem provável que os cientistas discordem sobre o fato de Chang’e-4 ter encontrado ou não material do manto. Contudo, eles concordam com uma coisa: que o novo estudo não deixa de ser um feito inédito.

    "Embora eu encare algumas das interpretações das medições com certo ceticismo, acredito que só o fato de eles terem realizado essas medições já seja uma conquista incrível", afirma Moriarty. "Essa é uma bela contribuição ao avanço da ciência e da exploração lunar".

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