400 km a pé, por Gandhi – um fotógrafo refez a Marcha do Sal
Em 1930, para protestar contra o domínio colonial britânico na Índia, Gandhi fez história ao caminhar 400 km para apanhar um punhado de sal.
Esta reportagem está na edição de outubro da revista National Geographic Brasil.
O PRIMEIRO DIA
HORA DO DESAPEGO: Saindo de Ahmedabad, eu tentava observar o mundo com compaixão e livre de preconceitos – sem pensar demais nas centenas de quilômetros à minha frente. Vi meu reflexo na vitrine de uma loja e ri de mim mesmo. Cheguei a Aslali, o primeiro pouso, assustado com os desafios que eu teria, sobretudo do clima. Fui deixando peso e excessos pelo caminho, absorvendo toda a concussão moral e física que uma longa caminhada nos impõe. Gandhi disse: “Viva como se fosse morrer amanhã. Aprenda como se fosse viver para sempre”.
RIO VATRAK
ATOLADO: Já escurecia, antes do vilarejo de Matar, onde eu passaria a noite. No caminho, o Rio Vatrak. Não havia ponte: eu teria de cruzar com a água na altura dos joelhos. O fundo lodoso era uma armadilha. Cheguei ao outro lado, mas meus pés viraram duas bolas enormes de lama. As pessoas perceberam o meu drama e brotaram do nada, com água para ajudar a lavar os meus pés. Foi mais um gesto, entre tantos, que me lembrou de que eu estava em uma terra em que o espírito de Gandhi ainda cintila no coração dos homens.
O DIA DA CHEGADA
PÉ NA AREIA: Uma estrada monótona me conduziu à Praia de Dandi, o fim da jornada. Após anos sonhando com esse dia, lá estava eu, em uma manhã de sábado, naquela faixa de areia marrom castigada pelo Índico. Foi nas salinas da região que Gandhi apanhou para si um punhado de sal, um gesto simbólico contra as imposições comerciais dos britânicos. A marcha se tornaria emblemática do ideal de resistência não violenta de Gandhi, e fundamental no processo de independência da Índia, submetida ao jugo colonial inglês desde o século 18.
EM NÚMEROS
25
Dias de caminhada
13
Cobras apareceram no caminho
49
Graus no estado de Gujarate, no verão
“Gandhi dizia que toda a humanidade é uma só família. Eu acredito que a fotografia aproxima as pessoas e nos permite despertar para tal fraternidade.”
MARCHA EM LIVRO
O livro A Marcha do Sal (Vento Leste, 252 páginas) registra a peregrinação de Érico Hiller, em novembro de 2017, refazendo passo a passo o protesto pacífico contra a coroa britânica comandado por Mahatma Gandhi, em 1930.