Como a União Europeia surgiu das ruínas da Segunda Guerra Mundial
O que nasceu para ser uma união econômica em prol da paz se tornou um dos maiores órgãos políticos do mundo. O Brexit, contudo, sinaliza a chegada de tempos difíceis.
Quando os eleitores britânicos decidiram deixar a União Europeia (UE) por uma pequena margem de votos em 2016, a Europa foi tomada por ondas de choque. Se o chamado “Brexit” efetivamente ocorrer, terá sido a primeira vez que um estado-membro da UE rompe esse que ainda é um dos maiores órgãos político-econômicos do mundo — uma organização de 28 estados formada para promover a paz duradoura a partir dos escombros da grande guerra. Veja o que o Reino Unido deixará para trás se tiver sucesso em sua saída da UE.
A UE tem suas raízes na devastação provocada pela Segunda Guerra Mundial. Em 1945, a economia europeia estava em frangalhos. Grande parte da população estava desabrigada ou refugiada. E, enquanto as indústrias europeias ainda tentavam se reerguer, as tensões políticas dividiram o Oriente e o Ocidente na iminente Guerra Fria.
A instabilidade econômica e o fantasma da hiperinflação — as mesmas condições que, antes, ajudaram o fascismo alemão a chegar ao poder e abrir caminho para a Segunda Guerra Mundial — colocaram os líderes europeus do pós-guerra em movimento. Oficiais se uniram para evitar confrontos por meios econômicos. Os setores siderúrgicos e carvoeiros da Alemanha Ocidental, França, Bélgica, Luxemburgo e Holanda se associaram, criando um mercado comum de bens de exportação numa tentativa de estabilizar a economia e de impossibilitar que um único país monopolizasse materiais utilizados para fins bélicos.
A Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) não tardou em inspirar outras reformas econômicas. Em 1957, com o acirramento da Guerra Fria, os seis países da CECA assinaram o Tratado de Roma, que criava a Comunidade Econômica Europeia (CEE). A CEE garantia um mercado comum e um alinhamento de políticas econômicas, agrícolas, logísticas e outras políticas nacionais.
Os países da CEE tiveram muito êxito nos anos 1960, transformando a antes faminta Europa Ocidental numa região próspera. Em 1973, foram admitidos mais três estados-membros, inclusive o Reino Unido. Com o colapso do comunismo nas décadas de 1980 e 1990, outros também ingressaram.
Em 1993, 12 estados-membros assinaram o Tratado de Maastricht, formando a União Europeia. O tratado criou a cidadania europeia, estabeleceu políticas comuns de relações internacionais e segurança nacional e abriu caminho para uma moeda comum, o euro. Quatro liberdades ainda regem a união: livre movimentação de pessoas, bens, capital e serviços.
O euro entrou em vigor em 1º de janeiro de 1999. Até então, já vigoravam na maioria dos países europeus leis do Acordo de Schengen que garantiam a livre movimentação de cidadãos europeus pelas fronteiras nacionais, e a União se transformara em um dos maiores órgãos políticos do mundo.
A partir de 2009, a UE, naquele momento com 27 estados-membros, passou por uma crise econômica precipitada pela incapacidade de estados-membros mais novos de honrarem suas dívidas. Mesmo assim, a União suportou a crise de endividamento e outras controvérsias. Com a adição de seu estado-membro mais recente, a Croácia, em 2013, a UE conta agora com um contingente de 28 membros. Hoje, ela compreende mais de 4 milhões de quilômetros quadrados e abriga 513 milhões de habitantes. Ela garante direitos fundamentais como a dignidade humana, igualdade e os direitos à vida (dentre os quais, o banimento da pena de morte), asilo político, consentimento livre de coerção e liberdade de pensamento e expressão.
A UE não é mais uma mera união econômica. Com os anos, ela criou uma paz duradoura e relativa estabilidade na Europa. Ela inclusive chegou ganhar o Prêmio Nobel da Paz em 2012. Mas qual a real intensidade dos vínculos entre os estados-membros? Embora alguns afirmem que exista uma "identidade europeia", estudiosos debatem sua existência. Ser europeu não significa necessariamente que você apoia a União Europeia, e o Brexit faz pairar uma nuvem de incertezas sobre o experimento europeu. A UE está, mais uma vez, navegando em águas desconhecidas. E não se sabe se a saída pretendida da Grã-Bretanha é uma tempestade passageira ou sinal de um vindouro mau tempo.