O que o mundo perderia em um eventual conflito dos EUA com o Irã
À medida que as tensões entre os EUA e o Irã se intensificam, importantes patrimônios culturais podem sofrer danos colaterais.
A série de tuítes do presidente norte-americano Donald Trump no fim de semana advertindo que os EUA terão como alvo pontos culturais iranianos (“... esses alvos, e o próprio Irã, SERÃO ATINGIDOS MUITO RÁPIDO E DE FORMA INTENSA”, escreveu ele) fez com que muitos comentaristas chamassem o anúncio pelo que realmente é: uma ameaça de cometer crimes de guerra.
Existem 22 Patrimônios Mundiais culturais da UNESCO no Irã, como as grandes capitais do Império Persa, mosteiros cristãos e centros religiosos sufis (para fins de comparação, os EUA possuem apenas 12 Patrimônios Mundiais culturais). No momento, o presidente Trump não declarou explicitamente quais desses locais culturais iranianos (se é que realmente escolherá algum) ele pretende atingir.
Após os tuítes de Trump no domingo, Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA, não endossou expressamente as ameaças do presidente de atacar locais “importantes ao Irã e à cultura iraniana”, porém disse que “vamos fazer o certo e agir de acordo com a legislação dos Estados Unidos”, e esses alvos serão “lícitos”.
A proteção do patrimônio cultural está consagrada na Convenção de Haia para a Proteção dos Bens Culturais em Caso de Conflito Armado de 1954 e na Convenção relativa à Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural de 1972 — ambas convenções internacionais de que os EUA e o Irã são signatários (muitos alegam que a Convenção de Haia de 1954 teve suas origens em um documento anterior utilizado apenas nos Estados Unidos e que Abraham Lincoln transformou em lei no auge da Guerra Civil. O Código Lieber declara, dentre outros pontos: obras clássicas de arte, bibliotecas, coleções científicas, instrumentos preciosos como telescópios astronômicos e hospitais devem ser protegidos contra todos os danos que possam ser evitados, ainda que estejam em fortificações, quando sitiados ou bombardeados).
Horas após as declarações de Pompeo, Trump questionou a validade da Convenção de Haia de 1954 diante de repórteres a bordo do Força Aérea Um: “O Irã tem autorização para torturar e mutilar nosso povo. Eles têm permissão para colocar bombas na beira das estradas e explodir nossos cidadãos. E nós não podemos tocar no patrimônio cultural deles? Não é bem assim que funciona.”
Há uma boa razão pela qual o patrimônio cultural é explicitamente protegido em tempos de guerra: objetos e monumentos que refletem os valores de uma comunidade ou cultura propiciam um senso crítico de coesão e continuidade. Destruir esses monumentos significa eliminar a identidade humana.
É por isso que o Estado Islâmico atacou especificamente monumentos muçulmanos de grupos religiosos contra os quais lutavam. É por isso que as forças sérvias bombardearam a Biblioteca Nacional de Sarajevo. E fomos lembrados de como essas perdas podem ser dolorosas, mesmo em tempos de paz, com os incêndios de Notre Dame e do Museu Nacional no Brasil.