O icônico telégrafo do Titanic será recuperado por robôs que exploram o fundo do oceano?

Nova decisão judicial marca a mais recente tentativa de uma empresa privada de salvar o equipamento sem fio que transmitiu os últimos pedidos de ajuda do naufrágio.

Por Kristin Romey
Publicado 30 de mai. de 2020, 09:00 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Guglielmo Marconi (1874-1937) foi pioneiro na comunicação sem fio e o Titanic foi um dos grandes ...

Guglielmo Marconi (1874-1937) foi pioneiro na comunicação sem fio e o Titanic foi um dos grandes transatlânticos que usava sua tecnologia de ponta. Esta imagem mostra ele trabalhando na sala sem fio do iate Electra.

Foto de Hulton-Deutsch Collection, Corbis, Getty

Durante três horas, na noite de 14 a 15 de abril de 1912, as mensagens transmitidas pelo operador do telégrafo a bordo do R.M.S. Titanic foram de um recado insignificante (enviado de um passageiro para um amigo em Nova York: “Olá. Estou jantando com você esta noite em pensamento”) para os avisos desesperados (do Titanic para o R.M.S. Carpathia: “Batemos num iceberg.”) até as mensagens finais (“Venham rápido. A sala de máquinas está quase completamente inundada.”).

Agora, um juiz federal decidiu que a empresa privada que possui direitos de recuperação do Titanic poderá recuperar o telégrafo localizado nos destroços do navio, um ato que o tribunal afirma que “contribuirá para o legado deixado pela perda indelével do Titanic, daqueles que sobreviveram e daqueles que deram suas vidas no naufrágio.”

A decisão, proferida por Rebecca Beach Smith do Tribunal Distrital dos Estados Unidos no Distrito Leste da Virgínia, altera uma sentença determinada no ano de 2000 por outro juiz que proibia a empresa de recuperação, RMS Titanic, Inc. (RMST), de realizar cortes ou retirar peças do naufrágio. A remoção da máquina de telégrafo, localizada dentro dos aposentos dos oficiais do navio, pode exigir cortes ou alargamento dos furos no casco e a extração do equipamento fixado nas paredes internas.

Diversos arqueólogos e representantes de patrimônios culturais se opuseram à remoção de artefatos do Titanic, que foi a última morada de mais de 1,5 mil pessoas.

“Assim como apreciar um leão nas savanas africanas (sic) é muito melhor do que em um museu, a invenção de Marconi também conta melhor sua história e compartilha seu valor no local onde está agora”, escreveu David Conlin, chefe do Centro de Recursos Submersos do Serviço Nacional de Parques dos Estados Unidos, em um recurso judicial.

A voz do Titanic

O telégrafo a bordo do Titanic  era um equipamento avançado para sua época: um dispositivo de comunicação sem fio desenvolvido por Guglielmo Marconi, pioneiro na área. O dispositivo estava localizado na “Sala Marconi”, um conjunto de três salas a bombordo dos aposentos dos oficiais que incluíam uma cabine-dormitório, a sala do operador do telégrafo e uma “Sala Silenciosa” onde ficava o principal transmissor do telégrafo.

A famosa história dos eventos que ocorreram na Sala Marconi — incluindo os esforços heroicos do telegrafista-chefe Jack Phillips para transmitir chamadas de emergência para navios próximos conforme as águas geladas do Atlântico cobriam suas pernas — foi contada pelo assistente de Philips, Harold Bride. Philips afundou junto com o navio; Bride foi resgatado e compartilhou um relato angustiante daquela noite nas páginas do New York Times.

Um recurso judicial da RMST alega que, se o conjunto gerador e o descarregador de disco do telégrafo fossem recuperados da Sala Silenciosa, “é possível que possam ser restaurados à sua condição operacional” e com novos componentes “a rádio do Titanic – a voz do Titanic – poderia mais uma vez ser ouvida, hoje e sempre.”

Disputa jurídica

A decisão é o avanço mais recente de uma disputa jurídica que se iniciou há muitos anos sobre o destino do lendário naufrágio, que foi descoberto pelo Explorador da National Geographic Robert Ballard em 1985. A entidade que eventualmente se tornou a RMST recebeu direitos de recuperação em 1994; esses direitos foram mantidos em 2011 sob um conjunto específico de termos e condições.

A empresa privada recuperou entre 1993 e 2004 mais de cinco mil artefatos da área de escombros ao redor dos principais destroços do Titanic. Vários itens estão em exibição em museus e exposições em todo o mundo.

Como o Titanic está a cerca de quatro quilômetros de profundidade no Atlântico Norte, para recuperar os artefatos do local, é necessário utilizar um veículo operado remotamente (ROV) conectado a um navio de pesquisa.

De acordo com um recurso judicial de janeiro de 2020, a RMST planeja utilizar um ROV para entrar no Titanic, seja através de uma claraboia existente sobre a Sala Marconi ou de um furo no casco. O ROV iria até a Sala Silenciosa, onde um operador localizado na parte superior manipularia os braços robóticos do veículo para separar os componentes do telégrafo localizados nos destroços.

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    Representantes da RMST alegaram na audiência que “novas evidências” — uma delas a suposta deterioração acelerada dos destroços — eram suficientes para um pedido de alteração da decisão de 2000 que proibia o corte do navio.

    O recurso de janeiro também afirma que os principais componentes do telégrafo de Marconi a serem recuperados consistem no conjunto gerador e descarregador montados sobre uma placa de base e parafusados no convés de aço, e no par de quadros de distribuição e reguladores afixados na parede. Ambos estão localizados na Sala Silenciosa.

    O recurso também observa, no entanto, que os objetos principais “apresentam grandes desafios de recuperação”. Três “objetos secundários” — componentes menores e mais leves do telégrafo de Marconi, também foram identificados para recuperação na Sala Silenciosa.

    De acordo com um recurso judicial apresentado no início deste mês, no entanto, a RMST previu que “com base nas informações atuais... não tentará recuperar o conjunto gerador da Sala Silenciosa, em função da inacessibilidade e alto risco.”

    Na decisão de segunda-feira, a juíza Smith observou que a decisão de 2000 não está sendo anulada, mas alterada neste momento apenas para atender à “oportunidade única” de remover do Titanic artefatos associados ao telégrafo de Marconi. Além disso, qualquer tentativa de acesso ao Titanic e retirada do telégrafo estará condicionada à aprovação judicial de um plano de financiamento para garantir que a RMST não apenas tenha recursos para remover os artefatos, mas também para conservá-los e documentá-los.

    A RMST está planejando uma expedição ao Titanic neste semestre para recuperar o telégrafo de Marconi.

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