O lugar mais frio da Terra foi encontrado – veja como

“É um lugar onde o planeta está tão próximo de seu limite que é quase como outro mundo”, diz o líder do estudo.

Por Alejandra Borunda
Publicado 3 de jul. de 2018, 11:46 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Pequenos lagos pontilham a superfície do Glaciar Langhovde, na Antártica Oriental.
Pequenos lagos pontilham a superfície do Glaciar Langhovde, na Antártica Oriental.
Foto de Photograph via DigitalGlobe via Getty Images

Quão frio pode ficar na superfície da Terra? Cerca de – 98ºC, de acordo com medições de satélite feitas recentemente no lugar mais frio que se conhece no planeta.

Os cientistas registraram essa temperatura extrema na camada gelada, bem no meio da Antártida, durante o longo e escuro inverno polar. Conforme relatos recentes na Geophysical Research Letters, a equipe acha que isso é o mais frio a que se pode chegar em nosso canto do sistema solar.

“É um lugar onde a Terra está tão próxima de seu limite que é quase como outro planeta”, diz o líder do estudo, Ted Scambos, pesquisador do Centro Nacional de Dados em Neve e Gelo da Universidade do Colorado, em Boulder.

A medição deixa para trás o recorde anterior de temperatura do ar mais fria conhecida no mundo natural: gélidos – 89°C, em 1983, na estação russa de Vostok, não muito longe do polo sul. Os seres humanos não podem inalar um ar tão gelado assim por mais que algumas respirações – pois provocaria hemorragias nos pulmões. Cientistas russos, protegendo-se para verificar a estação meteorológica, usam máscaras que aquecem o ar antes de respirá-lo.

Cavidades mortais

Embora a camada gelada da Antártida Oriental pareça plana na superfície, ela forma uma leve redoma, do centro para as bordas, como uma casca de tartaruga grande e gelada. Vostok está empoleirada próxima ao topo da redoma, sobre cerca de 3,5 km de gelo, mas não está ainda totalmente no cume. A equipe de Scambos suspeitava que pudesse ficar ainda mais frio nas partes mais altas da camada gelada.

Não há estações meteorológicas empoleiradas no pico da camada gelada, e não há ninguém lá para verificar no auge do inverno antártico. Mas os satélites podem registrar a temperatura na superfície do gelo à medida que passam por cima dela. Dessa forma, Scambos e seus colegas analisaram vários anos de dados de satélite, mapeando quando e onde as temperaturas baixavam.

E, de fato, encontraram cerca de cem bolsões de frio excepcional espalhados pelas partes mais altas da camada gelada. Os pontos mais frios estavam em depressões rasas no gelo, pequenas cavidades onde a superfície não é perfeitamente lisa. Isso, provavelmente, porque o ar frio afunda nessas depressões como se afunda em um vale de rio ou em um cânion, diz John Turner, um cientista polar da British Antarctic Survey, que não esteve envolvido no estudo.

“Tratam-se de depressões tão rasas que você provavelmente sequer as veria com os próprios olhos”, ele diz.

O ar se aquece alguns graus logo acima da superfície, que foi onde os cientistas de Vostok haviam registrado a antiga temperatura mais baixa. Ao comparar as medições dos satélites com os dados das estações meteorológicas mais próximas, Scambos e sua equipe descobriram que as temperaturas do ar nessa região seriam um pouco mais quentes próximo à altura da cabeça humana, cerca de – 94°C. Mas bem na superfície, onde seus pés tocariam a neve, eles viram as temperaturas chegar a – 98°C.

“Mas você espera que seus pés nunca toquem a neve aí”, diz Scambos. “Não seria nada divertido”.

Escurecendo a visão

Apenas condições muito especiais levam a um frio tão intenso. Primeiro, tem que ser no meio do inverno, muito depois do sol da meia-noite se pôr para não voltar até a próxima estação. Além disso, o ar precisa estar parado por alguns dias, e o céu precisa estar perfeitamente claro, sem um risco de nuvem ou o cintilar de poeira brilhante sobre a camada gelada.

Por mais frio que esteja, o gelo irradia uma pequena quantidade de calor. Normalmente, a maior parte desse calor é capturada pelo vapor de água na atmosfera e é transferida de volta para a superfície da Terra, prendendo o calor na baixa atmosfera.

Mas durante períodos de seca na Antártida, quando a maior parte do vapor de água foi sugado da atmosfera, “ele começa a abrir uma porta que normalmente não se abre em nenhum outro lugar da Terra”, diz Scambos. Então, o calor fraco emitido pela camada gelada pode escapulir até o espaço, deixando a superfície de gelo ainda mais fria.

As condições extremamente claras que permitem esses eventos frios também são ideais para se olhar para o espaço, e é por isso que os cientistas colocaram um telescópio a poucos quilômetros dos pontos frios que a equipe da Scambos localizou.

“O vapor da água é nosso inimigo”, diz Craig Kulesa, astrônomo da Universidade do Arizona que comanda o Telescópio Terahertz Antártico de Alta Elevação, ou, uma brincadeira com a sigla, HEAT (que significa ‘calor’ em inglês e vem de High Elevation Antartic Terahertz Telescope). “Posicionamos nosso telescópio neste local extraordinariamente seco, mas se o colocássemos a 16 km dali, será que seria melhor?”.

Pode ser uma questão a se considerar, já que o clima muda em todo o mundo – muito embora não exista nenhum outro lugar neste planeta onde as condições sejam melhores. As concentrações de vapor de água na atmosfera estão aumentando, o que por sua vez significa que maiores quantidades do calor emitido pelo gelo ficam presas próximas à superfície – mantendo-a mais quente. Assim, as condições perfeitamente claras que são ideais para se olhar para o espaço se tornarão menos frequentes – e qualquer cientista que espere quebrar o recorde de frio extremo registrado na Terra pode estar correndo contra o relógio.

“À medida que observamos aumentos nas concentrações de gases de efeito estufa e vapores de água, esperamos um aquecimento na Antártida de cerca de 3 a 4°C”, diz Turner. “Verificar quaisquer baixas de temperatura será cada vez mais improvável. As chances só estão diminuindo.”

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