Árvore-do-céu é uma terrível espécie invasora. Um fungo poderia solucionar o problema?

A árvore de crescimento rápido, nativa da China, também serve como um “hotel” para insetos não nativos prejudiciais, como as moscas da espécie Lycorma delicatula.

Por Troy Farah
Publicado 12 de mar. de 2021, 07:00 BRT

Árvore-do-céu (Ailanthus altissima), ou ailanto, florescendo.

Foto de Universal Images Group North America LLC, De Agostini, Alamy

Muitas árvores gostariam de ser tão bonitas quanto a Ailanthus altissima, também conhecida como ailanto e árvore-do-céu, uma árvore decídua com folhas em forma de pena, casca cinza-claro e sementes vermelhas e amarelas que se assemelham a um pôr do sol.

Mas fora da China, onde é nativa, a planta também ganhou o apelido de “árvore do inferno” devido à sua natureza invasora: ela pode crescer quase um metro por ano, clonando a si mesma através de “sugadores” subterrâneos, ou por meio das milhares de sementes que cada árvore produz todos os anos.

A notória planta dizima espécies nativas com sua folhagem densa e as toxinas que excreta no solo. Ela também exala um cheiro ruim de suas flores, não possui predadores naturais e serve de santuário para insetos invasores destrutivos, como a mosca Lycorma delicatula.

Desde sua introdução por horticultores entusiasmados nos Estados Unidos há quase 240 anos como uma árvore de sombra e um espécime botânico, o ailanto se espalhou para todos os estados do país, exceto seis, e conquistou uma posição em todos os continentes, exceto na Antártica

Mas pode haver uma nova arma para lutar contra uma das maiores espécies invasoras do continente.

Cientistas recentemente isolaram um fungo capaz de matar a árvore: um organismo microscópico chamado Verticillium nonalfalfae, que provavelmente é nativo da Pensilvânia, Virgínia e Ohio.

“Antes de descobrirmos esse fungo, a árvore realmente não tinha nenhum ponto fraco”, afirma Joanne Rebbeck, fisiologista vegetal aposentada do Serviço Florestal do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês) que estudou os efeitos do fungo no ailanto.

Cientistas estão agora experimentando usar o fungo para matar a árvore-do-céu, fazendo cortes no tronco e injetando o patógeno diretamente na planta. 

Os resultados de um estudo, publicado em setembro de 2020 na revista científica Biological Control, constataram que o fungo é “altamente eficaz” no controle do ailanto.

Seria um sonho realizado para os ecologistas que querem preservar os ecossistemas nativos e a diversidade de insetos, mas os cientistas devem primeiro garantir que a introdução de fungos não acabe criando um problema ainda maior.

De sapos-cururu na Austrália a gorgulhos eurasianos no oeste dos Estados Unidos, subestimar os riscos ecológicos do controle biológico — usar um organismo vivo para suprimir outro — tem um longo histórico de ocasiões em que deu errado.

Hotel para insetos

O ailanto é uma praga em todas as florestas norte-americanas, tomando o lugar de plantas nativas, como o carvalho-vermelho, enquanto danifica infraestruturas e terras agrícolas destruindo esgotos, pavimentos e alicerces de construções.

A árvore prospera em áreas danificadas pelo fogo ou com movimentação humana, incluindo ao longo das rodovias, e uma vez que se enraíza, é quase impossível removê-la. O ailanto cresce mais de dois metros em seu primeiro ano, clonando-se através de raízes subterrâneas chamadas “sugadores”, ou através de milhares de sementes que o vento carrega a partir de uma única árvore. A árvore, que pode viver um século, atinge aproximadamente 20 metros de altura.

A espécie também é alelopática, o que significa que ela afeta o crescimento de outras plantas através da liberação de substâncias químicas que podem impedir que outras plantas cresçam perto dela.

As únicas estratégias que os agricultores e os donos de terras têm contra o ailanto atualmente são aplicar herbicidas poderosos ou cortar as árvores periodicamente. 

Mas “dentro de um ano, elas simplesmente voltam mais densas e agressivas”, conta Rachel Brooks, doutoranda da Faculdade de Ciências Ambientais e Vegetais do Instituto Politécnico e Universidade Estadual da Virginia (Virginia Tech) e coautora do estudo de 2020. “Então essas medidas acabam se tornando muito caras e exigindo muita mão-de-obra.”

O ailanto se espalhou por seis continentes e 44 estados dos Estados Unidos.

Foto de STUDIO75, Alamy

Para piorar, o ailanto serve como um hotel para outras espécies invasoras, como o percevejo-marrom-marmorizado e uma espécie de broca asiática, dois insetos que danificaram as florestas norte-americanas, especialmente aquelas que abrigam espécies de bordo, para não mencionar diversas culturas comerciais, como maçãs e pêssegos.

Mas ninguém é atraído por ela como a mosca Lycorma delicatula, um dos insetos invasores mais prolíficos e prejudiciais da América do Norte. Esses coloridos insetos infestam as árvores aos milhares e bebem sua seiva antes de se espalharem para outras plantas agrícolas.

“Ambos invasores vieram da China, então eles estão se reconectando com suas espécies nativas”, explica Kristen Wickert, outra coautora do estudo de 2020 e entomologista e fitopatologista do Departamento de Agricultura da Virgínia Ocidental, que também atua como coordenadora estadual da Lycorma delicatula.

Resultados promissores

Em 2002, um cientista do centro-sul da Pensilvânia notou que uma árvore-do-céu estava morrendo misteriosamente, suas folhas murchando e ficando marrons. Em 2008, mais de oito mil árvores haviam morrido na Floresta Estadual de Tuscarora. Ao estudar essas árvores mortas, cientistas conseguiram isolar o fungo V. nonalfalfae como a causa da morte.

O fungo mata o ailanto infectando-o com a doença da murcha vascular, essencialmente obstruindo o sistema vascular da planta e deixando-a sem água. A planta começa a murchar lentamente, deixando cair esporos do fungo no solo onde o ciclo do V. nonalfalfae começa novamente.

“Ele não mata apenas uma única árvore, ele mata o sistema radicular e as árvores [de ailanto] próximas, e realmente era possível ver esses bolsões de doença se espalhando”, relata Brooks.

Para testar se o V. nonalfalfae prejudica outras plantas além do ailanto, em maio de 2017, Brooks, Wickert e outros pesquisadores marcaram 12 sítios florestais dominados pela planta em toda a Virgínia e Pensilvânia. Em seguida, escolheram aleatoriamente 656 árvores para inocular o fungo, fazendo cortes nos troncos e esguichando esporos dentro deles. Eles voltavam para checar as árvores em intervalos de poucos meses para fotografá-las e medir o grau de degradação.

Eles descobriram que o fungo matava os ailantos, mas não se espalhava para outras árvores, levando os pesquisadores a teorizar que as plantas locais desenvolveram defesas para o V. nonalfalfae que o ailanto não tinha.

 

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    Segurança em primeiro lugar

    Antes de iniciar uma estratégia com esse fungo, os especialistas querem ter certeza de que ele é seguro para outras plantas, animais selvagens e plantações em outros estados onde ele pode não ser nativo.

    Raghavan Charudattan, um fitopatologista aposentado e fundador da empresa de biotecnologia BioProdex, passou cinco décadas estudando maneiras de controlar ervas daninhas usando fungos e outras formas de controle biológico. Charudattan recentemente recebeu financiamento do Serviço Florestal dos Estados Unidos e do USDA para estudar o uso de V. nonalfalfae contra o ailanto.

    De acordo com ele: “meu trabalho, em particular, é testar um monte de espécies agrícolas, que são conhecidas por serem suscetíveis a outras espécies de Verticillium”, o que pode incluir milho, rabanete e batata. Ele estima que pode levar até três anos para superar os obstáculos regulatórios antes que o fungo esteja disponível nas lojas como um produto comercial.

    Existe um precedente para tal produto: o DutchTrig, que combate a grafiose, ou doença do olmo holandês, uma infecção de plantas devastadora encontrada em toda a Europa e América do Norte e causada por diversos fungos da família Ophiostomataceae. Pesquisadores descobriram que injetar V. albo-atrum, um fungo do mesmo gênero que o V. nonalfalfae, funcionou como uma espécie de vacina para os olmos, aumentando seus mecanismos de defesa natural e protegendo-os contra outros patógenos fúngicos. O produto está disponível em pelo menos sete países.

    Scott Salom, entomologista florestal da Virginia Tech que trabalhou com Brooks e Wickert, adverte que a descoberta de um matador natural de árvores é apenas o primeiro passo para restaurar ecossistemas prejudicados.

    Além de eliminar esses invasores, cientistas e governos também devem trabalhar em conjunto para restaurar as paisagens nativas, afirma ele, o que por sua vez permitirá que a biodiversidade de insetos e mamíferos nativos prospere.

    “Não podemos simplesmente tratar as árvores e vê-las morrer, temos que nos certificar de que sejam as plantas nativas que tomem o lugar delas”, declara Salom.

    “De uma perspectiva ecológica, é muito importante enxergar todo o processo.”

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