Plantio de árvores combate mudanças climáticas – mas é preciso bilhões de mudas a mais

Os Estados Unidos precisam mais do que dobrar a produção de mudas para atender às metas de reflorestamento, afirmam pesquisadores.

Por Kyla Mandel
Publicado 25 de mar. de 2021, 13:00 BRT
Funcionário do Serviço de Parques dos Estados Unidos segura uma muda de pinheiro-de-casca-branca no Parque Nacional ...

Funcionário do Serviço de Parques dos Estados Unidos segura uma muda de pinheiro-de-casca-branca no Parque Nacional Glacier, em Montana. Uma quantidade muito maior desses pinheiros precisará ser plantada para atingir as metas de reflorestamento dos Estados Unidos, segundo especialistas.

Foto de Chip Somodevilla, Getty Images

O plantio de árvores surgiu rapidamente como uma maneira um tanto simples de contrabalancear emissões de carbono. Não há quem não goste da ideia: ambientalistas, políticos e corporações estão pressionando por uma rápida expansão dos esforços de reflorestamento para ajudar no cumprimento das metas climáticas.

Isso significa plantar árvores — e muitas delas — com a expectativa de que capturem e armazenem dióxido de carbono e ajudem a evitar que a substância aqueça o planeta para além da meta do Acordo de Paris, 2 graus Celsius acima das temperaturas registradas no período pré-industrial.

Mas de acordo com um estudo recente publicado no periódico Frontiers in Forests and Global Change, não há mudas de árvores suficientes sendo cultivadas hoje, pelo menos não nos Estados Unidos, para atingir esses objetivos. Se os esforços de reflorestamento ajudarem a combater as mudanças climáticas, conclui o estudo, os viveiros de árvores dos Estados Unidos precisarão aumentar sua produção para pelo menos três bilhões de mudas por ano — mais do que o dobro dos números atuais. 

“Mais cedo ou mais tarde” isso precisa acontecer, relatou o autor principal do estudo, Joe Fargione, diretor de ciências da Região da América do Norte da organização ambiental The Nature Conservancy. “Não há como plantar uma árvore antes de cultivá-la. Tampouco não se consegue cultivá-las em viveiros até que se tenha as sementes.”

Para entender melhor como aumentar os níveis de produção nacional de árvores, Fargione e diversos outros pesquisadores analisaram 181 viveiros e silvicultores federais, estaduais e privados no ano passado, representando pelo menos metade de toda a produção de mudas nos Estados Unidos.

Os resultados, divulgados no mês passado, mostram que os viveiros do país produzem atualmente 1,3 bilhão de mudas por ano, que vão substituir as árvores colhidas por empresas de extração de madeira ou perdidas em incêndios florestais. Para expandir as florestas do país em mais de 25 milhões de hectares, identificados pelo estudo como maduros para fins de reflorestamento — e armazenamento de carbono — seriam necessários 1,7 bilhão de mudas adicionais por ano. Esse número eleva o total necessário de viveiros para três bilhões por ano, um aumento de mais de 130%.  

Aumentar a produção de mudas dessa forma significativa e garantir que cresçam por tempo o suficiente para capturarem as emissões de carbono necessárias terá um custo de bilhões de dólares, de acordo com o estudo. Será necessário treinar coletores de sementes especializados e obter investimento em nova infraestrutura, assim como reforçar o monitoramento em longo prazo para garantir que as florestas sobrevivam diante de pragas, doenças, secas e incêndios florestais — ameaças que têm se intensificado devido às mudanças climáticas.

Aumentando a escala de produção

A pressão para reflorestar e proteger as florestas está mais forte do que nunca. Em agosto passado, mais de 25 governos locais, empresas e organizações sem fins lucrativos dos Estados Unidos se comprometeram com a iniciativa do Fórum Econômico Mundial de plantar um trilhão de árvores até 2030 em todo o mundo. Em outubro passado, o então presidente Donald Trump assinou um decreto em que os Estados Unidos se comprometia com o mesmo objetivo. Com apoio de republicanos e democratas, algumas organizações ambientais sem fins lucrativos alimentam esperanças de que o governo Biden irá enveredar esforços em favor dessa iniciativa.

Além das metas empresariais, individuais ou locais, o cultivo de árvores pode ter sua parcela de contribuição nas metas climáticas nacionais. O setor ambiental — que inclui todos os aspectos, passando pelo plantio de árvores, prevenção do desmatamento até o aumento da quantidade de carbono armazenado nos solos — foi responsável por uma pequena parcela do compromisso da era Obama de reduzir as emissões em até 28%, como parte do Acordo de Paris. Segundo uma estimativa, se todos os mais de 25 milhões de hectares identificados no estudo fossem reflorestados, isso representaria cerca de 7,5% das reduções nas emissões de carbono necessárias para honrar o compromisso ratificado pelos Estados Unidos no Acordo de Paris.

A taxa atual de reflorestamento, no entanto, não consegue nem acompanhar a dimensão de terras queimadas por incêndios devastadores em todo o oeste norte-americano nos últimos anos. As perspectivas indicam que as mudanças climáticas apenas tornem os incêndios florestais mais intensos, o que intensificará esse problema crescente.

“Apenas agora estamos reconhecendo o acúmulo crescente de áreas que precisam ser reflorestadas, mas que ainda não estão sendo exploradas”, alegou a ecologista de sementes e coautora do estudo Olga Kildisheva, gerente de programa da The Nature Conservancy.

Plantar mais árvores para compensar as emissões de carbono aumentará ainda mais a demanda por mudas. A boa notícia, segundo Fargione, é que apenas um terço dos viveiros públicos e privados analisados está operando em plena capacidade, o que significa que há uma grande oportunidade de expansão.

A produção de mudas atingiu seu pico há mais de 30 anos. No fim da década de 1980, mais de 2,6 bilhões de mudas eram produzidas por ano nos Estados Unidos. Após a recessão de 2008 ter forçado o encerramento das operações de muitos viveiros em todo o país, esse número caiu para menos de um bilhão. “Imagine perder 75% de sua capacidade de operação”, lamentou Dan Rider, diretor associado do Serviço Florestal de Maryland, com relação ao impacto que a recessão e outros fatores causaram no viveiro de árvores florestais John S. Ayton do estado. “Nosso caso não é o único.”

Aumentar os níveis de cultivo novamente será trabalhoso, constatou Eric Sprague, vice-presidente de reflorestamento da American Forests, uma organização de conservação sem fins lucrativos que foi uma das responsáveis pelo estudo recente, além de fazer parte da iniciativa ‘trilhões de árvores’. Porém, acrescenta ele, “será significativo” para os Estados Unidos atingir ou não suas metas de reflorestamento.

“Não se trata apenas de expandir e melhorar os viveiros existentes”, complementou Sprague, “mas também criar novos viveiros para cumprir essa meta”.

Se todos os viveiros, públicos e privados, operassem em sua capacidade máxima, o estudo estima que mais 400 milhões de mudas poderiam ser cultivadas todos os anos. Os pesquisadores também esperam que 1,1 bilhão de mudas adicionais possam ser produzidas anualmente se a maioria dos viveiros expandir suas operações para além de sua capacidade atual, o que a maioria dos entrevistados do estudo afirmou estar disposta a fazer. Somando tudo isso a 1,3 bilhão de mudas que estão sendo cultivadas no momento, a produção alcançaria o mínimo de três bilhões por ano, quantidade recomendada pelo estudo.

Mais investimento no processo

Aumentar a produção de mudas e, em seguida, plantá-las significa aumentar o apoio à meta estabelecida e o investimento durante todo o processo. Como o estudo observou, ocorre um “subinvestimento crônico” em mão de obra especializada, infraestrutura e treinamento. “Os desafios da força de trabalho”, comentou Sprague, “são a barreira número um da expansão”.

Os coletores de sementes precisam entender cada etapa, desde estimar em que época certas espécies liberam suas sementes — passíveis de coleta — até como higienizá-las de forma segura. A equipe então precisa ser treinada para saber como testar a qualidade das sementes e de que forma as armazenar para que permaneçam viáveis ao longo dos anos. “Trata-se de um produto perecível que precisa ser manejado com cuidado”, explicou o coautor do estudo, Greg Edge, ecologista florestal da Divisão Florestal do Departamento de Recursos Naturais de Wisconsin. No entanto, o número de pessoas especializadas nesse trabalho continua diminuindo.

Os viveiros, por sua vez, contam com um seleto número de funcionários durante todo o ano; o restante, são trabalhadores sazonais que ajudam na semeadura, colheita, seleção e acondicionamento das mudas. Talvez seja difícil atrair esses trabalhadores especializados devido à localização remota de muitos viveiros, assim como à concorrência com outros empregos agrícolas. As políticas de imigração também podem afetar o número de trabalhadores disponíveis, observou o estudo.

Não apenas as sementes e a mão de obra são escassas, mas a infraestrutura é antiga, complementou Charles Eckman, horticultor do viveiro federal JW Toumey, em Michigan. Segundo ele, embora criar estufas ou melhorar aquelas já existentes possa ser uma ótima maneira de expandir a capacidade e cultivar mudas mais rapidamente do que no campo, isso deve ser planejado anos antes de ser necessário. 

O custo financeiro inicial para os viveiros pode ser um grande risco. “No momento atual, temos que tentar prever ‘como estará o mercado daqui a dois anos”, pontuou Rider, de Maryland. “No ramo de viveiros, investe-se todo capital hoje, para preparar o local, comprar fertilizantes e tudo mais que é utilizado no solo... e não se recebe esse dinheiro de volta por dois anos.”

Planejando a sobrevivência dos negócios

Uma campanha de plantio de árvores com financiamento estável e de longo prazo — federal ou privado — poderia fornecer aos viveiros a certeza de que precisam para aumentar sua produção, concordam especialistas.

O estudo da Frontier parte do pressuposto de que o plantio de árvores é a principal forma de cumprir os objetivos de reflorestamento, ressaltou Karen Holl, professora de estudos ambientais da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, que não participou do estudo. Proteger as florestas existentes, além de estimular a regeneração natural, não devem ser medidas deixadas de lado, reiterou ela.

E mesmo uma campanha de plantio de árvores pode ser malsucedida devido à uma “ênfase equivocada em quantas árvores são plantadas em vez de quantas sobrevivem após o plantio”, alertou o estudo. Faz-se necessário desenvolver diretrizes sobre quais sementes irão prosperar em diferentes ambientes, especialmente porque as mudanças climáticas mudam as espécies de plantas para novas regiões.

“Não basta plantar uma árvore. Tudo precisa ser feito com cuidado e planejamento. Não podemos simplesmente plantar uma muda no solo, esperar 100 anos e achar que teremos uma floresta crescida”, alertou Edge. É preciso investir grandes quantias de capital, trabalho e paciência para transformar uma semente em uma muda. “Não queremos perder nosso tempo plantando uma muda que vai morrer.”

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