Pequeno esôfago humano é desenvolvido em laboratório – veja como
Versões em miniatura do órgão que guia o alimento para o estômago podem ajudar os cientistas a tratarem uma variedade de problemas de saúde.
Eis algo para você digerir: cientistas em Cincinnati, nos EUA, criaram versões em miniatura de um esôfago, o órgão responsável por guiar sua comida até seu estômago. E, pela primeira vez, eles fizeram tudo utilizando células-tronco humanas.
Chamados organoides, essas pequenas bolas de tecido cultivadas em laboratório assemelham-se a um esôfago humano de verdade, relataram os pesquisadores no periódico Cell Stem Cell. Anteriormente, cientistas haviam obtido sucesso em cultivar diversos tipos de organoides, como estômagos, rins, cérebros, e até mesmo um esôfago a partir de tecido maduro de um paciente como matéria-prima.
Esses pequenos órgãos ajudam os cientistas a estudar como os órgãos se desenvolvem normalmente, e são utilizados para descobrir como essas partes do corpo falham, dando origem a cânceres e outras doenças.
“Modelos tridimensionais de laboratório de um esôfago humano são extremamente necessários, principalmente porque a anatomia dos camundongos é muito diferente da humana”, diz Rebecca Fitzgerald, pesquisadora especialista em câncer do esôfago da Universidade de Cambridge, que não participou do estudo.
E, como organoides agem como um substituto para os órgãos verdadeiros, eles também podem ser utilizados para testar medicamentos e melhor prever como os pacientes responderão a diferentes tratamentos.
“Como são cultivados em uma placa de Petri, podemos espetá-los e cutucá-los o quanto quisermos”, diz James Wells, principal autor do novo estudo e Diretor-Executivo Científico do Centro Infantil de Células-Tronco e Medicina Organoide de Cincinnati.
Siga a receita
Wells e seus colegas começaram com células-tronco pluripotentes induzidas, um tipo de célula “mestre” que tem a habilidade de se transformar em qualquer outra célula do corpo. Para fazer com que elas se transformem em células especializadas do esôfago, investigadores adicionaram uma mistura de substâncias químicas e proteínas às células-tronco.
“Elas agem como pistas ou sinais que ajudam a guiar as células-tronco pluripotentes para se tornarem tecido específico do esôfago” diz Wells. “É como seguir uma receita”.
Um passo essencial dessa receita foi o gene Sox2 e sua respectiva proteína, que já foram ligados a doenças do esôfago. A equipe constatou que esse gene tem um papel central em auxiliar o desenvolvimento do esôfago no embrião humano. Foram precisos dois meses para cultivar as pequenas massas em laboratório, cada uma com aproximadamente um milímetro de comprimento.
Wells e sua equipe de Cincinnati já estão cultivando alguns organoides para auxiliar a diagnosticar pacientes com condições de saúde que afetem o esôfago, como malformações congênitas. Isso faz parte de um esforço maior do hospital em criar mini órgãos personalizados a partir de pacientes pediátricos com distúrbios gastrointestinais.
“Digamos que, em consultório, tudo tenha sido feito para descobrir o que há de errado com o paciente através de todos os testes clínicos padrão” explica Wells.
O paciente é então colocado em equipamento customizado de ressonância magnética, que fornecerá uma imagem em 3D dos órgãos da criança. Essa imagem é enviada para uma equipe de cirurgiões que tentarão descobrir se os órgãos podem ser recuperados cirurgicamente. Enquanto isso, médicos extraem uma pequena porção de tecido do paciente e a envia para o laboratório do Wells, que criará células-tronco a partir da amostra de tecido e cultivará os organoides. Ser capaz de examinar esses mini órgãos de perto, fora do paciente, pode levar a um diagnóstico.
Abrindo possibilidades
No futuro, Wells espera poder cultivar organoides que possam ser transplantados de volta aos pacientes nascidos com tecido esofágico doente ou inexistente. Ele diz que isso também poderia funcionar com adultos que tiveram partes de seus esôfagos removidos devido ao câncer.
“A longo prazo, queremos cultivar tecidos que auxiliem os cirurgiões na reconstrução de esôfagos em casos em que não haja tecido suficiente para uma correção cirúrgica” diz Wells. Mas isso ainda deve demorar muitos anos.
Utilizar células-tronco como matéria-prima “pode ser uma grande vantagem, uma vez que alguns pacientes podem não ter tecido esofágico saudável suficiente para a concepção de um novo esôfago” diz Paul Knoepfler, biólogo especialista em células-tronco da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia, em Davis.
Também é possível que organoides esofágicos criados a partir de células-tronco, em vez do tecido do paciente, possam ficar maiores ou produzir mais tipos de células que ocorrem naturalmente no esôfago, ele diz. Algo que faltava do esôfago de laboratório, por exemplo: o espaço aberto por onde passam o alimento e os líquidos, chamado lúmen.