Jovens ativistas fazem greve para salvar o planeta das mudanças climáticas

Na sexta-feira, estudantes do mundo inteiro farão uma greve para chamar atenção para as mudanças climáticas. Nos EUA um grupo de adolescentes (e uma pré-adolescente) são as lideranças.

Por Alejandra Borunda
Publicado 14 de mar. de 2019, 19:30 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Alexandria Villasenor, 13, mata aula toda sexta-feira para fazer greve em nome das mudanças climáticas. Toda ...
Alexandria Villasenor, 13, mata aula toda sexta-feira para fazer greve em nome das mudanças climáticas. Toda semana, faça chuva ou sol, ela senta em um banco na frente das Nações Unidas, em Nova York, com suas placas que chamam atenção para a questão das mudanças climáticas. Villasenor e outros jovens ativistas de todo o mundo estão organizando uma greve escolar global pelo clima em 15 de março.
Foto de Sarah Blesener, The Washington Post, Getty

Em uma sexta-feira de setembro, a adolescente sueca Greta Thunberg parou na frente do Parlamento da Suécia com cartazes escritos à mão e uma mensagem: as mudanças climáticas estão aqui, são uma ameaça para o futuro e os adultos no poder não estão levando isso a sério. Então, eu, Greta, vou entrar em greve pelo clima. Alguém tinha que fazer alguma coisa a respeito, disse ela aos repórteres mais tarde, então por que não ela?  

"Um homem passou de carro gritando, sozinho, janelas fechadas, apontando para mim, mas também recebi muitas buzinadas de apoio! Se você não consegue se juntar a nós na greve, seja como os motoristas que buzinam, encontre uma maneira de apoiar."

Desde então, sua iniciativa correu o mundo. Da Polônia à Colômbia e à Austrália, diversos jovens passam suas sextas-feiras em greve em nome das mudanças climáticas, promovendo o ativismo com cartazes e a hashtag #FridaysforFuture (#SextasPeloFuturo). Alguns deixam a escola por apenas alguns minutos; outros se reúnem, realizando manifestações pelas ruas aos milhares. Mas todos buscam a mesma coisa: ações pertinentes para combater o fantasma das mudanças climáticas que os assombra constantemente.

Nos EUA, a greve a favor do clima tem lentamente ganhado força nos últimos meses. Agora, jovens ativistas estão prontos para uma grande estreia nacional em público: na sexta-feira, 15 de março, jovens em todo o mundo se reunirão em mais de 1.700 e 112 países, demonstrando que estão comprometidos em chamar atenção para o que consideram uma crise climática global.

No Brasil, 19 cidades devem aderir à campanha global. Em São Paulo, a concentração é no vão do MASP às 12h00.

A organização da greve nos EUA está a cargo de três jovens: Alexandria Villasenor, 13 anos, de Nova York, Haven Coleman, 12 anos, de Denver, e Isra Hirsi, 16 anos, de Minneapolis. Em apenas alguns meses, elas entraram de cabeça no mundo do ativismo pelo clima e ajudaram a colocar as mudanças climáticas entre as pautas nacionais mais importantes.

"minha vida consistiu de escola, telefonemas e entrevistas nas últimas três semanas. pra que uma vida social quando você pode ajudar a salvar o mundo!"

Tudo começou com um banco

O Banco de Alexandria, como os geotaggers do Twitter e Google Maps o chamaram, está localizado no extremo leste de Manhattan, próximo à entrada das Nações Unidas. Ventos frios e úmidos sopram do East River, flamulando as bandeiras dos estados-membro das Nações Unidas, acima desse banco. Os países representados pelas bandeiras fazem parte do Acordo de Paris, tratado sobre o clima assinado em 2015 com o objetivo de impedir que as temperaturas globais aumentem mais do que 2ºC. Apenas uma nação, os EUA, decidiu sair do acordo internacional.

Alexandria Villasenor, 13 anos, ocupou pela primeira vez o banco que posteriormente se tornaria "seu" em uma escura e chuvosa sexta-feira de dezembro de 2018, agasalhada por algumas camadas de roupa e segurando dois cartazes escritos à mão ("COP24 NOS DECEPCIONOU" e "GREVE ESCOLAR PELO CLIMA" em tinta preta). Ela soube das greves semanais de Greta na Suécia e decidiu se juntar ao movimento também.

Naquela sexta-feira e nas próximas, ela ocupou o banco de forma estoica, pelo tempo que conseguiu suportar o frio. Às vezes, escrevia mensagens no Twitter com a hashtag #FridaysforFuture ou sobre fatos climáticos que havia tomado conhecimento. Outras vezes, as pessoas olhavam para seus cartazes e, então, olhavam novamente para confirmarem o que tinham visto. "Você deveria estar na escola", foi o que ouviu muitas vezes. "Estude para se tornar uma cientista climática se você se importa tanto." Em alguns dias, os adultos iam lhe dar sermão. Raramente alguém conversava com ela.

Ela sabia que o frio e as críticas seriam desconfortáveis, mas, de certa forma, eles faziam parte do objetivo da greve. Ela estava ali pelas mudanças climáticas, independente de quanto isso iria lhe custar.

E Alexandria sempre foi muito focada, disciplinada e objetiva ao expressar o que realmente queria. Quando tinha 10 anos e sua família morava em Davis, na Califórnia, ela apresentou aos pais um plano detalhado para uma viagem de férias a baía Half Moon, próximo dali, considerado por ela seu lugar favorito em todo o mundo. Ela pensou em tudo: recomendações de hotéis, lugares para comer, até mesmo um possível itinerário (andar a cavalo já estava confirmado). Ela adorava a praia e toda a sua vastidão e beleza. Ela também sabia como convencer as pessoas.

Porém, no último outono, quando voltou à Califórnia para uma visita, presenciou o estado que tanto amava ser consumido pelas chamas conforme o Camp Fire, queimada que matou pelo menos 85 pessoas, se alastrava pelo norte da Califórnia. A fumaça das queimadas lhe causou asma, até mesmo alguns minutos ao ar livre faziam seus pulmões doerem. E ela não conseguia um voo para voltar para casa, em Nova York.

"advinha quem anunciou o novo acordo verde no estado?! nós anunciamos!"

Quando finalmente voltou, ficou sabendo que o clima diferente e cada vez mais seco da Califórnia havia contribuído para intensificar as chamas. Ela começou a participar como ouvinte das aulas de sua mãe, Kristin Hogue, na Universidade de Columbia. Hogue havia se matriculado em um curso que abordava a ligação entre mudanças climáticas e a ação do homem. Alexandria ouvia apresentações sobre tudo, da física das correntes de jato a planos para criar programas de captação da água da chuva na Costa Rica. As duas faziam as tarefas de casa juntas e Alexandria fazia mais e mais perguntas.

Alexandria nunca conheceu um clima que não tivesse sido afetado pela atividade humana; é possível que ninguém que esteja vivo hoje conheça. Mas nos treze anos de vida da garota, o planeta testemunhou cinco dos anos mais quentes já registrados. Ao mesmo tempo em que Alexandria planejava suas férias dos sonhos para baía Half Moon, as concentrações de dióxido de carbono na atmosfera ultrapassavam 400 partes por milhão, uma concentração que não havia sido excedida pelo menos nos últimos três milhões de anos.

E as previsões para o futuro? Ainda mais sombrias. Até o fim do século, intensas ondas de calor podem deixar algumas partes da Ásia sazonalmente inabitáveis. O aumento do nível do mar e tempestades mais poderosas podem eliminar alguns países insulares em áreas mais baixas no Pacífico Sul. Nos EUA, os impactos das mudanças climáticas já estão sendo sentidos, das queimadas testemunhadas por Alexandria aos furações Maria, Harvey e Florence, intensificados pelas mudanças.

Perceber quão devastador o aquecimento global pode ser para o planeta, e para o seu futuro, mudou a sua vida. "Muitas pessoas não gostam de ouvir os resultados que a ciência tem divulgado", diz Alexandria. "Quando comecei a aprender mais sobre o tema, quase comecei a chorar porque isso ainda não é ensinado ao público em geral. Há esse medo de que temos tanto conhecimento, mas ainda não estamos fazendo nada a respeito."

Então, quando Alexandria fazia seu solitário e frio protesto, sexta após sexta, ela disse a si mesma que realmente não fazia diferença se alguém estava prestando atenção ou não. Ela estava confrontando um enorme problema global que afeta a todos, em todos os lugares, e que já impacta o mundo que ela conhece. Um pouco de desconforto parecia ser um preço justo.

"Hey Nova York e Nações Unidas! Eu tenho companhia! Ty, Maria, Cleo, Kate & Aya do Instituto por Educação Colaborativa se juntaram a mim hoje! Mais a chegar na próxima semana!"

O grupo se une

 

Porém, algumas pessoas estavam prestando atenção, como Haven Coleman, de 12 anos, que, de sua casa em Denver, Colorado, viu as publicações de Alexandria no Twitter e Instagram.

Haven conhecia bem o ativismo pelo clima. Ela já defendia a luta contra as mudanças climáticas há dois anos, desde que uma professora de estudos sociais do ensino fundamental contou aos alunos sobre a destruição do meio ambiente.

"Eu simplesmente amo, amo bichos-preguiça", contou Haven eufórica. "Amo! E fiquei tão triste quando soube que eles podem morrer por nossa causa", após ter aprendido como o desmatamento na Amazônia ameaça a população de bichos-preguiça. Foi aí que ela entrou na toca do coelho, em termos de pesquisa. Para salvar os bichos-preguiça, o desmatamento tinha que acabar. E acabar com o desmatamento também seria bom para um outro grande problema que estava estudando: as mudanças climáticas. Assim que começou a estudar como o clima poderia virar o planeta de cabeça para baixo, foi como se ela não tivesse escolha, conta ela. O ativismo se mostrou uma necessidade.

Desde então, Haven trabalha com o Climate Reality Project, do grupo de defesa do clima de Al Gore, para divulgar o real significado das mudanças climáticas para jovens como ela. Ela realiza sessões educativas em escolas para falar da questão a outros alunos do ensino fundamental. Em 2017, em uma câmara municipal, ela confrontou um congressista do Colorado que negava os impactos do clima.

Então, o que aconteceu quando ela viu Alexandria, Greta e outros jovens fazendo greve pelo clima? O próximo passo parecia bastante claro. Logo depois, ela começou a fazer suas próprias greves às sextas-feiras, ocupando os degraus da escada do Denver Capitol Building e estudando a ideia de uma grande greve nacional.

Em pouco tempo, Haven encontrou Isra Hirsi, 16 anos, de Minneapolis, Minnesota. Isra era uma organizadora experiente, envolvida com ativismo político desde sua infância. Seu pai trabalha como formulador de políticas no governo local. Sua mãe, Ilhan Omar, havia sido recentemente eleita deputada (e atraído a atenção da mídia para seus controversos comentários sobre Israel). Por anos, Isra participou de protestos com grupos de jovens locais como o iMatter. Até 2018, ela já havia trabalhado com mais de cem alunos locais para protestar contra a violência por arma de fogo nos EUA.

"Hoje @havenruthie. @israhirsi e eu tivemos uma chamada com nossos parceiros do @climatestrikeUS @emilyrsouthard @Ryschlee @luckytran @ariellemcohen @mozuckerman @LarryKraft1 e mais! Estamos muito gratas por toda ajuda que recebemos com a nossa greve global em 15 de março.

Ao mesmo tempo, começou a se interessar por questões de justiça socioambiental. Ela passou a fazer parte do grupo de reciclagem da escola e, com a experiência adquirida, começou a aprender mais sobre o meio ambiente. Ela também lia sobre a contaminação por chumbo na água que abastece Flint, Michigan, e a briga envolvendo o oleoduto Dakota Access. Isra percebeu que as questões ambientais, como as mudanças climáticas, e a justiça social se interligavam de um milhão de formas diferentes. Antes de saber disso, Isra já trabalhava com o iMatter e outro grupo de jovens, o Minnesota Can't Wait, com uma proposta para que o estado alcance uma economia neutra em carbono até 2030.

Isra ficou muito animada em se juntar à equipe, que poderia aproveitar sua experiência em organização e planejamento. "Não foram os nossos pais, não foi nenhum adulto: tudo isso é liderado por alunos do ensino fundamental, médio e superior", conta ela. "Estamos fazendo isso por iniciativa própria. Literalmente, somos apenas nós, trabalhando bastante, porque compreendemos os impactos das mudanças climáticas e realmente temos que fazer algo a respeito".

Algumas semanas depois, Haven e Alexandria se conectaram e começaram a conversar. Alexandria também estava planejando algo maior do que as greves frias e solitárias que fazia: ela queria organizar um evento nacional direcionado a chamar a atenção dos adultos e dar aos jovens algo para eles lutarem. Conforme conversavam, perceberam que fazia total sentido unir forças.

A greve se aproxima

Com a equipe montada, as líderes trocavam ideias constantemente: mensagens de texto, Instagram, e-mail e videoconferências. Elas fizeram acordos com os diretores de suas escolas para poderem olhar o celular durante o intervalo e chamaram seus pais para ajudarem a gerenciar o fluxo de textos e e-mails em seus celulares.

A cada dia, o projeto ficava maior e se expandia a uma velocidade alucinante. Um colaborador desenvolveu um site para elas. Os jovens começaram a se voluntariar para organizar greves em suas cidades, em quase todos os estados dos EUA. Organizações como Sierra Club e 350.org ofereceram apoio. "A cada três dias, o mundo muda, algo grandioso no planejamento se altera. É tudo muito veloz", diz Hogue, mãe de Alexandria.

Elas foram responsáveis por grande parte da organização. Foi difícil, mas também foi um movimento caracterizado por uma certa euforia. Alexandria e Haven, cujos alguns amigos não haviam participado com elas dos protestos, encontraram espaço entre os que haviam participado. Enquanto isso, Isra pedia ajuda à sua rede de jovens ativistas, incluindo Maddy Fernands, de 16 anos, agora diretora para assuntos de imprensa da Youth Climate Strike. De repente, elas se viram cercadas por jovens capazes e poderosos que se importavam com a crise climática assim como elas. Isso foi maravilhoso. Trouxe motivação.

"Organizar uma greve nacional é como organizar uma marcha local, mas com mais textos de opinião, e-mails, decisões, teleconferências do que eu imaginava ser humanamente possível. Se ser adulto é isso, eu não estou contente em crescer!"

A equipe que não parava de crescer logo divulgou uma série de pedidos, envolvendo diferentes aspectos das mudanças climáticas. Elas queriam que fossem tomadas medidas sobre um Novo Acordo Verde, políticas governamentais sobre mudanças climáticas e justiça climática; elas queriam previsões obrigatórias e cientificamente precisas das mudanças climáticas nas decisões do governo; e mais. De modo crucial, todas as três líderes reconheceram que, quando existente, a educação sobre o clima é muito superficial nas escolas. E um ponto importante para muitos dos jovens que conhecem era que eles simplesmente não tinham conhecimento sobre as mudanças climáticas. Assim, elas também pediram que o currículo escolar, do jardim da infância até o nono ano, incluísse discussões sobre as mudanças climáticas e seus impactos.

"Passamos boa parte das aulas de ciência aprendendo sobre estruturas atômicas, mas o conhecimento que a escola oferece sobre mudanças climáticas é muito rudimentar", diz Maddy. "Realmente não é suficiente falarmos sobre isso apenas por alguns minutos, comparado à magnitude do impacto das mudanças climáticas no mundo de hoje".

Os adultos poderiam ter resolvido essa questão, dizem as organizadoras. Mas em vez disso, estão deixando o problema para as gerações futuras. E não iam nem mesmo nos ensinar sobre o assunto? Para as jovens ativistas, isso foi um insulto, somado a todos os danos causados ao planeta.

Mais e mais voluntários se juntaram à equipe, oferecendo-se para liderar greves de costa a costa e em outros territórios. Ao mesmo tempo, cresceu a atenção direcionada à manifestação. Alexandria apareceu na televisão para falar sobre a greve e muitas portas se abriram. Duas semanas antes das greves previstas para 15 de março, mais de 110 pessoas participaram de uma reunião virtual de planejamento, contribuindo com perguntas e formando equipes.

O que devo fazer se não conseguir sair para ir a uma greve, perguntou um participante. "Pendure um cartaz na classe!", disse Haven, e certifique-se de que as pessoas saibam do que se trata!

"Isso vai ser épico", disse Haven ao grupo, conforme mostrava na tela o mapa das greves planejadas. "Você acredita nisso? Olhe esse mapa, é incrível! Não seremos ignorados!"

Nesse momento, os cartazes estão confeccionados; os estados organizados; os palestrantes agendados. O que mais? As próprias manifestações. Na sexta-feira, as líderes esperam que milhares de alunos façam o que puderem para chamar atenção às demandas da greve pelo clima. Elas não estarão sozinhas: greves semelhantes estão planejadas em todo o mundo.

Mas para as líderes, e para os jovens ao redor do mundo, esse único dia de greves é apenas o começo. Eles estão aprendendo a interagir com outros grupos, planejar mais greves e alcançar públicos ainda maiores. "Quando aprendi sobre as mudanças climáticas, fiquei sem esperança", disse Alexandria durante a reunião virtual de planejamento. "Agora, sinto-me muito mais poderosa".

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