Maior roedor do mundo luta de forma surpreendente contra o câncer

Análise genética da capivara revela como o ícone sul-americano se tornou um gigante gentil e tem se esquivado do risco da doença.

Por Carrie Arnold
Publicado 2 de out. de 2018, 11:55 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
Uma mãe capivara e seu filhote vistos no Pantanal, Brasil.
Uma mãe capivara e seu filhote vistos no Pantanal, Brasil.
Foto de Frans Lanting

Em um planeta cheio de animais estranhos, capivaras se destacam.

Sessenta vezes mais pesadas do que seu parente mais próximo, os maiores roedores do mundo são mais ou menos do tamanho de pequenos humanos adultos. Elas passam seus dias comendo grama perto dos rios do Brasil e da América do Sul e são tranquilas o bastante para servirem de cadeiras para outros animais.

Mas o que permitiu que capivaras se tornassem gigantes gentis era um grande mistério – até agora.

Em um novo estudo publicado no serviço de pré-impressão bioRxiv, um time de cientistas da Colômbia, Suécia e dos Estados Unidos sequenciaram o DNA de uma capivara e encontraram pistas de um sistema de crescimento acelerado. Seu trabalho também encontrou a assinatura genética de um mecanismo anticâncer que pode um dia inspirar novos tratamentos.

Autor principal do estudo, Santiago Herrera-Álvarez começou a estudar capivaras enquanto fazia seu mestrado na Universidad de los Andes, em Bogotá. Uma seca severa em 2014-15 secou muitos dos rios da Colômbia, deixando os campos secos. Com pouca vegetação para comer, o número de capivaras diminuiu.

Os interesses de Herrera-Álvares, no entanto, não eram nos efeitos imediatos da seca. Ao invés disso, esse evento aumentou sua curiosidade sobre como essa mistura ridiculamente fofa de hamster e hipopótamo evoluiu, para começo de conversa.

“A capivara é um animal icônico da América do Sul”, diz ele.

Construindo um gigante

Os ancestrais da capivara evoluíram na África cerca de 80 milhões de anos atrás e chegaram na América do Sul 40 milhões de anos depois. Seus parentes são roedores de tamanho normal; por exemplo, o mocó, que vive no cerrado do Brasil, pesa apenas 900 gramas.

Roedores tendem a ser pequenos porque animais menores podem se esconder melhor e predadores muito maiores podem considerar que não valham o esforço, explica a bióloga evolucionista da Duke University, V. Louise Roth. Mas, na época em que as capivaras chegaram na América do Sul, a região era quase completamente livre de predadores, o que pode ter permitido que seus ancestrais ficassem maiores.

“Sem predadores, as pressões que mantêm roedores pequenos diminuem”, explica Roth.

De acordo com a nova pesquisa, o segredo sobre como a capivara pode crescer mais do que uma ordem de magnitude estava há muito tempo escondido em seu DNA. Caviomorfos – o subgrupo de roedores que contém as capivaras – todos têm uma forma única de insulina.

Além de regular o açúcar no sangue, a insulina também manda a célula se dividir. Herrera-Álvarez e seus colegas descobriram que capivaras não tinham mais insulina. Ao invés disso, milhões de anos de seleção natural aumentaram a habilidade de sua insulina mandar as células se dividirem, aumentando seu crescimento e dando origem ao animal peludo de mais de 45 quilos.

Gestão de risco

Ficar tão grande tem suas desvantagens. Além de precisar de mais comida para suportar um corpo maior, a capivara teve que lidar com um risco maior de câncer, conforme aumentava em tamanho.

Se cada célula tem uma probabilidade fixa de se tornar maligna, então, animais com mais células deverão ter mais chances de desenvolver câncer. Mas não é isso que acontece. Por exemplo, apesar de ser milhares de vezes maior do que um rato, elefantes não têm mais chances de desenvolver câncer. É conhecido como o Paradoxo de Peto e biólogos descobriram vários mecanismos que animais maiores desenvolveram para parar o câncer antes que ele comece.

Cientistas descobriram que elefantes asiáticos e africanos, por exemplo, são melhores em conservar intacto o próprio DNA quando as células se dividem, o que reduz o número de mutações causadoras de câncer. Baleias-da-Groenlândia, por outro lado, desenvolveram mecanismos melhores para impedir que células se dividam sem controle.

O time de Herrera-Álvarez descobriu que capivaras parecem ter desenvolvido uma tática completamente nova. Seu genoma mostrou sinais de que seu sistema imunológico é muito melhor em detectar e destruir células que estão se dividindo rápido demais. Em outras palavras, capivaras desenvolveram sua própria forma de imunoterapia contra o câncer.

“Eu fiquei muito surpreso. Não estava esperando que o sistema imunológico estivesse envolvido”, diz ele.

“O que descobriram parece ser muito diferente do que acontece em outros animais”, diz Vincent Lynch, um biólogo evolutivo do câncer da University of Chicago. “Talvez não seja tão difícil quanto pensamos evoluir esses caminhos anticâncer.”

Lynch e Roth elogiaram o trabalho, dizendo que é minucioso e criativo, apesar de ressaltarem que os resultados são apenas preliminares e precisam ser acompanhados de mais experimentos no laboratório.

E se as capivaras podem oficialmente ser chamadas de gigantes entre os roedores, o júri ainda não decidiu.

“Não há uma definição de ‘gigante’ entre biólogos”, diz Roth. “No final, acho que o que importa é o quanto eles são impressionantes.”

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