Morcego ouve serenatas estridentes de rãs para encontrar seu jantar

Nova análise das inúmeras estratégias de caça dos morcegos revela como são talentosos — e ainda pouco conhecidos — esses voadores noturnos.

Por Jake Buehler
Publicado 9 de out. de 2019, 12:11 BRT, Atualizado 5 de nov. de 2020, 03:22 BRT
O morcego da espécie Trachops cirrhosus devora uma rã-túngara na Ilha Barro Colorado, no Panamá.
O morcego da espécie Trachops cirrhosus devora uma rã-túngara na Ilha Barro Colorado, no Panamá.
Foto de Christian Ziegler, Nat Geo Image Collection

Por serem criaturas da noite, os morcegos enfrentam um desafio único: localizar e caçar presas na escuridão total.

Os mamíferos voadores desenvolveram uma solução excelente: a ecolocalização, pela qual emitem ondas sonoras que são refletidas nas presas e identificam seu paradeiro. Mas esse superpoder inato é apenas um dos incríveis e sofisticados mecanismos empregados pelos morcegos para obter alimento.

Agora, cientistas analisaram estudos anteriores e compilaram uma lista geral desses talentos sombrios, publicada no periódico Functional Ecology.

Embora muitos estudos tenham se concentrado especificamente nas ferramentas e comportamentos utilizados pelos morcegos para encontrar presas, faltou uma análise mais completa de como os predadores utilizam seus vários sentidos para caçar, afirma Rachel Page, líder do estudo, cientista da equipe permanente do Instituto Smithsoniano de Pesquisas Tropicais no Panamá.

“Apesar das décadas de pesquisas, ainda conhecemos muito pouco sobre a ecologia sensorial e cognitiva subjacente da maioria das espécies de morcegos”, que somam no mínimo 1,3 mil, explica Page. “Como os morcegos são animais voadores noturnos e, portanto, difíceis de observar sem equipamentos especializados, seu estudo foi intensificado há relativamente pouco tempo.”

As habilidades sensoriais dos morcegos, conforme verificado pelos estudos, variam desde morcegos vampiros que detectam padrões de respiração de um único animal até o morcego-de-franja, que é atraído pelo som da cópula de moscas-domésticas.

De forma geral, as pesquisas sugerem que os morcegos são mais talentosos — e menos compreendidos — do que presumiam os cientistas, afirma ela.

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Os pesquisadores aprofundaram-se em estudos que se concentravam em como morcegos insetívoros e carnívoros utilizam informações de presas ou de outros morcegos para encontrar alimento. A equipe então avaliou as adaptações sensoriais que confirmam essas técnicas de caça específicas e examinou as vantagens e desvantagens de cada abordagem

Quando a ecolocalização não funciona bem — por exemplo, em espaços pequenos e fechados, como em arbustos ao pé das árvores onde é difícil localizar as presas — os morcegos silenciosamente se concentram em sons sutis.

morcego-vampiro, por exemplo, que se alimenta exclusivamente de sangue de mamíferos sugado durante o sono sem que estes percebam, possui neurônios que são ativados apenas em resposta ao som da respiração de um animal e é dessa forma que localiza suas presas. Esses morcegos, encontrados na América Central e América do Sul, são capazes de reconhecer até padrões de respiração de um hospedeiro específico e voltar ao mesmo animal, como uma vaca, noite após noite, para se alimentar.

“Os morcegos-vampiros geralmente são bem pequenos se comparados aos seus hospedeiros — existe o risco de ser pisado ou esmagado ou ainda de o hospedeiro acordar durante o processo e se defender”, afirma Page. “É possível que, após encontrar um hospedeiro do qual consigam se alimentar, a estratégia mais segura seja voltar ao mesmo hospedeiro.”

O morcego da espécie Mystacina tuberculata talvez seja o maior mestre da caça em meio a ruídos. Esses morcegos “que andam” passam 40% do tempo em que procuram alimento no chão — mais do que qualquer outro morcego — ouvindo atentamente o som de insetos andando pela cobertura de folhas e utilizando as narinas tubulares para farejar sua localização.

Intrometidos

Alguns morcegos exploram os sons noturnos e barulhentos de suas presas, escutando escondidos os chamados de acasalamento, como alguém que escuta outras pessoas se comunicando por radioamador.

Os morcegos da espécie Trachops cirrhosus da América Central e América do Sul, por exemplo, encontram e apanham rãs-túngara prestando atenção no canto estridente dos machos, que se reúnem em lagoas. Atentos aos chamados de acasalamento, os morcegos Trachops cirrhosus conseguem localizar onde as rãs estão reunidas — e abocanham um farto jantar.

Os morcegos-de-franja, nativos da Europa e do Oriente Médio, são verdadeiros estraga-prazeres e são atraídos pelos diferentes zumbidos da cópula de moscas-domésticas — uma estratégia que lhes rende uma refeição maior.

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    Já outros morcegos prestam atenção em seus colegas voadores para conseguir pistas de onde está o alimento, seguindo a direção do som dos pulsos de ecolocalização dos demais morcegos.

    O morcego-buldogue da América Central e América do Sul fica atento aos “zunidos de alimentação” de outros morcegos-buldogues — sons de ecolocalização de alta intensidade que os morcegos produzem ao avançar sobre insetos. Isso resulta em um banquete temporário de insetos aglomerados sobre um corpo d’água — e poupa os morcegos-buldogues do esforço de procurar alimento.

    “O mais interessante, é que os morcegos também prestam atenção aos chamados de ecolocalização de outras espécies de morcego”, observa Page.

    A ponta do iceberg

    Yossi Yovel, zoólogo da Universidade de Tel Aviv, que não participou do estudo, destaca que é uma “análise muito boa e abrangente da área”.

    Yovel ficou impressionado ainda com a divisão, feita pelos cientistas, das estratégias de caça em três grupos principais: aqueles que escutam os movimentos das presas, aqueles que exploram as comunicações entre as presas e aqueles que conseguem pistas com outros morcegos que caçam por perto.

    Page destacou que sua pesquisa é apenas uma etapa inicial. “Os morcegos são animais extraordinários, lindamente diversos, altamente sociáveis e cognitivamente versáteis”, afirma ela.

    “Estamos apenas começando a entender os padrões por trás de suas diversas estratégias de buscar alimento e obter informações para encontrar presas.”

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